"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

Textos


A saga de Victor Hugo e sua literatura.

 

 

Resumo: Foi filho do romantismo clássico e pai do romantismo social. Foi um dos mais profícuos literatos século XIX. Seus textos trafegam entre o romantismo clássico e estereotipado de sua época, e que aos poucos, para abrir-se aos problemas sociais que afligiam toda Europa, em particular, a França do século XIX. Tais problemas causados pelos efeitos da Revolução Francesa e da Revolução Industrial em toda Europa. Nesse contexto escreveu Les Misérables que tocou áreas como o Direito, Sociologia e Filosofia.

Palavras-chave: Literatura. Victor Hugo. Pena de morte. França. Positivismo.

 

Para uma escorreita avaliação da obra de Victor Hugo, bem como das situações fáticas, observou-se que o sistema judiciário continua com os mesmos problemas seja na aplicação da lei, quanto pela falta de proporcionalidade e razoabilidade em se aplicar a norma, que prevê uma situação abstrata, em um caso concreto, uma situação real que muitas vezes não é abrangida pela norma de modo equânime.

 

De fato, Victor ao relatar em seu romance, partiu da visão dos excluídos, retratando dessa forma tanto as misérias concretas como as psicológicas que atingem o ser humana. A construção dos conflitos reais com suas particularidades, firmando uma crítica sobre a preconceituosa sociedade francesa da época.

 

,Hans Kelsen depois de um século da publicação da obra de Victor Hugo trouxe conceito e defendeu a aplicação da lei, puramente, sem qualquer valoração racional, o que fora muito criticado na obra "Os Miseráveis", e que no decorrer da história mostrou-se injustificável, quando a exemplo do regime nazista, onde suas leis protegia suas atrocidades contra toda a humanidade.

 

Miguel Reale[1] concebeu a crítica de Victor Hugo e elaborou o conceito que o direito não deve ser estudado isoladamente, mas em conjunto com a realidade vivenciada, a análise processual não pode ser feita como ato lógico, mas através de uma concepção axiológica nas três correntes por ele defendido, a saber: fato, norma e valor.

 

É imprescindível haver uma análise sensata, razoável e proporcional pelo operador do Direito, a humanizar o sistema jurídico, deixando de aplicar simplesmente a lei de forma positiva e reta, e passar a analisar os processos como uma vida, buscando construir juristas críticos que se abeberam da arte com o fito de aperfeiçoar a sensibilidade social e humana para apreciar de forma razoável e proporcional os conflitos jurídicos existentes.

 

"Os Miseráveis" é um romance histórico que firmou sincera crítica ao sistema jurídico positivista e acaba por gerar injustiças e ainda por sacrificar as garantias individuais e os mínimos direitos fundamentais.

 

Victor Marie Hugo nasceu a 26 de fevereiro de 1802 em Besançon, na região da Borgonha francesa. Terceiro filho do general Joseph Léopold e de Sophie Trébuchet, cresceu nesta zona oriental francesa, acompanhando a intensa turbulência que se foi sucedendo no país com o olhar e a sensibilidade de uma criança.

 

No entanto, a mãe separou-se do pai temporariamente, muito pelo nomadismo do marido e também pelas crenças pouco católicas que este tinha. Assim, foi ela a responsável por grande parte da educação e do crescimento de Victor, que exprimia as devoções pelo rei e pela fé na sua poesia e ficção inaugurais.

 

Até 1848, ano da revolução que viria a implantar a República em França, Hugo seguiria as pisadas da mãe, mas essa mudança de regime fá-lo-ia respirar os ares republicanos, associados ao livre pensamento.

 

Até lá, apaixonar-se-ia precocemente e casar-se-ia, com somente vinte anos, com a sua amiga de infância Adèle Foucher. Este matrimónio só se consumou após a sua mãe morrer, pois esta era contra o enlace entre ambos. Seriam cinco os filhos, sendo eles Léopold (morreu ainda criança), Léopoldine, Charles, François-Victor e Adèle.

 

O seu pai era um fiel seguidor de Napoleão Bonaparte, que considerava um herói, e assumia-se como um republicano de livre pensamento. Por sua vez, a mãe possuía uma educação católica e sustentada nos valores da realeza, sendo defensora da monarquia. A infância de Victor Hugo decorreu num confronto constante entre os valores dos seus progenitores, que assumiam os dois lados[2] dos tumultos que desequilibravam a sociedade francesa.

 

Entretanto, com a queda de Napoleão, a monarquia foi restaurada e o nome do seu pai não se tornaria contemplado no Arco do Triunfo, por ter falhado com a sua missão em Espanha, onde representava as mais altas patentes do exército.

 

Léopoldine também morreria cedo, com apenas 19 anos, em 1843, pouco tempo depois de se casar, ao lado do seu marido, após se afogarem no rio Sena, depois de serem derrubados por um barco. Seria um incidente que o abalaria muito, tendo tomado conhecimento do ocorrido num jornal que lia num café. Seria um tema sobre o qual dedicaria vários poemas, sobre uma mágoa que nunca chegou a superar na totalidade.

 

Oito anos depois, com o golpe de Estado perpetrado por Napoleão III, exilou-se em Bruxelas e, pouco depois, nas Ilhas do Canal, onde esteve até 1870, na sua Hauteville House, em plena queda definitiva do autoproclamado imperador. Mesmo com uma anistia geral concedida pelo líder do governo, assistiu à distância à Guerra Franco-Prussiana e ao Cerco de Paris, já após a derrota no conflito, regressando somente em definitivo no ano de 1871.

 

A sua literatura seria contaminada por todas estas circunstâncias, redigindo o primeiro romance em 1823, “Han d’Islande”, e algumas edições de poesia, entre as quais se destacam “Les Orientales” (1829, inspirada na Guerra da Independência Grega, num hino à liberdade política e artística), “Les Voix Intérieures” (1837) e “Les Rayons et les Ombres” (1840, uma coletânea de poesia escrita imediatamente antes do exílio).

 

Antes, já tinha publicado “Odes et poésies diverses” (1822) e “Odes et Ballades” (1826), aclamadas pelo seu fervor, pela eloquência, pela criatividade e pela fluência, predicados que o levaram a usufruir de uma pensão real do monarca Luís XVIII quando tinha somente vinte anos. Esta poesia tornou-se saudada cada vez mais com o tempo, numa reputação que alcançou as menções de um dos melhores produtores de elegias e de composições líricas do seu tempo.

 

A tradição romântica que trouxe para as suas obras bebeu muito de François-René de Chateaubriand, que encabeçou a literatura redigida nos primeiros anos do século XIX.

 

Devido ao crescimento da sua consciência social, os romances adotaram uma dimensão crítica da realidade e resultaram em obras como Le Dernier jour d'un condamné (1829) e Les Misérables (1862).

 

Enfim, a condenação à morte por guilhotina, levou até reflexões existenciais e sociais, principalmente, no afã de abolir a pena de morte[3].  Enfim, todo o romance teve como antecedentes a rebelião de junho de 1832 que explodiu em Paris e contestava a monarquia.

 

Aliás, a história francesa é desconstruída e Paris é uma cidade fustigada entre intrigas políticas, ideológicas, sociais, filosóficas, jurídicas morais e até conjugais. E, por isso o romance foi mal visto, especialmente, pelos seus contemporâneos tais como Gustave Flaubert e Charles Baudelaire.

 

Literalmente, Victor Hugo explanou que a consciência é o caos das quimeras, das ambições e das tentativas, o cadinho dos sonhos, o antro das ideias vergonhosas, é pandemônio dos sofismas, é o campo de batalha das paixões.

 

No século XV, no governo do rei Luís XI, a cigana Esmeralda e o corcunda Quasímodo encabeçam a intriga que faz saltar a Catedral de Notre Dame para a ribalta do lustre parisiense. Ingerindo os contextos e pretextos da arquitetura gótica, acaba por motivar muitas ações de preservação dos edifícios pré-renascentistas que se proliferam por toda a França. “Les Traveilleurs de Mer (1866)” é o próximo grande êxito da sua literatura, já para lá de “Les Misérables”, que dedica à ilha de Guernsey, onde se passa a ação e onde esteve exilado durante quinze anos.

 

A história segue as tribulações físicas e jurídicas dos habitantes da ilha, que se deparam com um naufrágio em que os tripulantes correm perigo de vida. A missão de salvamento é protagonizada por um pescador que procura recuperar a aprovação do seu pai, um marinheiro, perante a figurativa representação do poder industrial na forma de um polvo gigante.

 

A metaforização de um século XIX de progresso, de criatividade e de empenho perante o mal da dimensão material do mundo é um tema que nunca deixa de ser o centro das atenções em Victor Hugo. ativamente na política dos seus dias, e que o conduziu ao sucessivo exílio.

 

Conclui-se que todo o romance teve como antecedentes a rebelião de junho de 1832 que explodiu em Paris e contestava a monarquia. Aliás, a história francesa é abalada e Paris vivenciou muitas intrigas políticas, ideológicas, sociais, filosóficas, jurídicas morais e até conjugais. E, por essa razão, reprise-se que o romance foi mal visto, especialmente, pelos seus contemporâneos tais como Gustave Flaubert e Charles Baudelaire.

 

Literalmente, Victor Hugo explanou que a consciência é o caos das quimeras, das ambições e das tentativas, o cadinho dos sonhos, o antro das ideias vergonhosas, é pandemônio dos sofismas, é o campo de batalha das paixões.

 

É uma defesa empenhada da condição humana, prosseguindo em “L’Homme Qui Rit” (O homem que ri) (1869), levando o enredo para o século XVII, no qual uma criança sem-abrigo é a representação de uma ligação proibida com a aristocracia e com a família real, na forma de uma menina.

 

O sucesso deste trabalho foi tímido e autores, como Flaubert ou Émile Zola, foram-no ultrapassando em reconhecimento e em prestígio. Victor Hugo aceitou o fim do seu momento e finalizou a sua carreira com “Quatre-vingt-treize” (1874), escrito pouco tempo após a experiência fugaz da Comuna de Paris[4], remontando ao reino do Terror durante a Revolução Francesa, nomeadamente às revoltas de Vendée e de Chouannerie.

 

São três as histórias que se envolvem neste contexto muito específico, em turbulências diversas que enaltecem o heroísmo dos mais carenciados e lutadores. Acabaria por ser das obras mais aclamadas já após a sua morte, que prolongou a aura de herói com que foi recebido após o exílio, em 1870. Dois anos antes, tinha perdido a sua esposa, Adèle.

 

O desejo empenhado de um progresso humano sem fim foi depositado nas expectativas que tinha para o século seguinte, em que acreditava no fim dos dogmas, das guerras e das fronteiras. No entanto, a vida tornar-se-ia madrasta para si, que tinha sofrido um derrame em 1878.

 

Com a morte de dois dos seus filhos e a hospitalização da filha Adèle num hospício, tudo tornou-se ainda mais crítico com a morte da atriz Juliette Drouet, a sua grande e verdadeira companheira de vida, dois anos antes da sua própria morte, em 22 de maio de 1885, depois de contrair uma pneumonia. Pouco tempo antes, fizeram uma marcha em homenagem ao autor, pouco depois do derrame que o havia abalado, muito dela inspirada na obra “Les Misérables”.

 

Paris passou a ter uma avenida com o nome do autor que viu morrer no seu berço, um berço que se fez acarinhar pela liberdade, fraternidade e igualdade que estabeleceram as suas bases republicanas. A cerimónia fúnebre recebeu honras de estado e foi acompanhada por mais de dois milhões de pessoas, que o viram ser sepultado no panteão nacional, o Panthéon.

 

In litteris:

     “A beleza basta ser bela para fazer bem. Há criatura que tem consigo a magia de fascinar tudo quanto a rodeia; às vezes nem ela mesmo o sabe, e é quando o prestígio é mais poderoso; a sua presença ilumina, o seu contato aquece; se ela passa, ficas contente; se pára, és feliz; contemplá-la é viver; é a aurora com figura humana; não faz nada, nada que não seja estar presente, e é quanto basta para edenizar o lar doméstico; de todos os poros sai-lhe um paraíso; é um êxtase que ela distribui aos outros, sem mais trabalho que o de respirar ao pé deles. Ter um sorriso que – ninguém sabe a razão – diminui o peso da cadeia enorme arrastada em comum por todos os viventes, que queres que te diga? É divino”. Les Traveilleurs de Mer (1866);

 

Victor Hugo foi eleito para a Académie française, ocupando um lugar de prestígio nas figuras célebres das humanidades do país. Muitos foram aqueles que tentaram obstar a esta eleição, tentando opor-se ao romantismo que se pronunciava de novo.

 

No entanto, a sua identidade permaneceu incólume, até mesmo quando se fez membro da câmara alta da monarquia do rei Luís Filipe I, dando voz à abolição da pena capital, à denúncia das injustiças e mostrando-se a favor de um governo autónomo e nacional, para além de se fazer valer pela liberdade de expressão.

 

Quando era membro da Assembleia Nacional, como conservador, em 1849, discursou a favor do fim da miséria e da pobreza, para além da educação livre para todas as crianças.

 

Na chegada de Napoleão III, em 1851, opôs-se veementemente à constituição antiparlamentar imposta e publicou panfletos de oposição a este em “Napoléon le Petit” (1852, que contém o adágio “2+2=5” que se celebrizaria na obra de George Orwell “1984”, num caso de negação da verdade pela autoridade) e “Histoire d’un crime” (1877).

 

Também se exprimiu através da poesia em “Les Châtiments” (1853, num traçado por várias figuras corruptas que assumiram lugares de poder pela história, para além de referências a animais e a sua comparação a Napoleão III[5]), “Les Contemplations” (1856, uma homenagem à sua filha falecia Léopoldine) e “La Légende des siècles” (1859, uma representação histórica e da evolução da humanidade de forma épica, num desenho cronológico, entre sátiras e lirismos que encarnam e simbolizam as várias eras vividas).

 

Acreditava-se que o a civilização distava do barbarismo através do Mar Mediterrâneo, o que exprimia o preconceito de  boa parte da Europa em relação aos aborígenes e africanos. Pelo fim da pena morte lutou e, de fato, ocorreu em Gênova, Portugal e Colômbia. E, mesmo que está além do Oceano Atlântico, chegando até redigir cartas ao governo norte-americano para evitar que  a pena capital fosse aplicada.

 

Com o cerco da armada prussiana em França, em Paris, Victor Hugo mencionou o fato de ter sido obrigado a comer animais do jardim zoológico da cidade, para além do que, com a escassez, acabou por comer.

 

No período da Comuna, logo em seguida, foi um crítico acérrimo das atrocidades cometidas pelos dois lados, tanto dos revolucionários, como dos governamentais. No entanto, foi criticado e ameaçado de morte por apontar o dedo à recusa de garantir asilo político aos communards, responsáveis pela experiência governativa comunista em Paris, visados em penas que se estendiam até a de morte.

 

Entusiasta com a criação dos Estados Unidos da Europa, advogando ideais humanos e sociais para todos, fez também parte da Association Littéraire et Artistique Internationale, na defesa dos direitos dos artistas e dos autores, conduzindo à Convenção de Berna, destinada à Proteção dos Trabalhos Literários e Artísticos. Apesar disso, apresentava os usufruidores como coautores, que consagravam os sentimentos gerados e transmitidos por uma obra de arte.

 

As crenças religiosas de Victor Hugo foram-se alterando e ajustando à sua ocasião de vida, ao seu estado de desenvolvimento pessoal. Crescendo com a reverência às hierarquias e autoridades católicas, foi-se tornando não-praticante e teceu críticas duras ao catolicismo e ao clericalismo. Foi-se interessando pelo espiritismo, mas acabou por consolidar-se como um racionalista, com uma crença inabalável no pensamento livre, embora acreditando na existência de Deus. A visão da Igreja Católica que Victor Hugo tinha levava-o a acreditar que esta era indiferente à opressão da classe trabalhadora por parte da monarquia. Pelas críticas que foi fazendo, viu-se regularmente na lista de obras banidas pela Igreja.

 

 Crente na vida após a morte, rezava diariamente em prol de se encontrar em direção ao destino certo. Da poesia que redigiu, destaca-se “The Pope” (1878, de teor anticlerical), “Religions and Religion” (uma crítica à utilidade das igrejas) e “The End of Satan and God” (1886 e 1891, de louvor ao racionalismo).

 

Para além deste legado, chega a peça “Torquemada” (1869), em que apresenta o vulto de Tomás de Torquemada, frade dominicano, perante a Inquisição Espanhola, levando o autor a condenar o fanatismo religioso e o catolicismo exacerbado. A sua publicação no ano de 1882 apontou às perseguições aos judeus que se efetuavam na Rússia à data.

 

Victor Hugo, como apreciador profundo de boas composições musicais, abriu as portas para que nomes, como Hector Berlioz e Franz Liszt, se aproximassem do autor para, com ele, conviver e colaborar.

 

Entre apreços (Beethoven) e ódios de estimação (Richard Wagner), redigiu o libreto de “La Esmeralda[6] (ópera de 1836, da compositora Louise Bertin). O seu registo literário levou a que mais de uma centena de óperas se inspirasse no seu estilo, como “Lucrezia Borgia” (1833, da autoria de Gaetano Donizetti) e “Rigoletto” (1851, de Giuseppe Verdi). Foram vários os musicais que, postumamente, em adaptações várias, chegaram ao público, em especial “Les Misérables”, assim como melodias inspiradas no lirismo poético do francês.

 

Escrevendo em poesia e em prosa com o sentido significativo dos seus valores, foram estes que o eternizaram e que o fizeram ser o estandarte para as Repúblicas que, consequentemente, se foram estabelecendo por toda a Europa. A liberdade foi incorporada pelo autor francês como sendo uma causa máxima, a causa que une toda a humanidade, do mais abonado ao mais oprimido.

 

Foi o primeiro grande romance histórico escrito pelo escritor Victor Hugo (1802-1885) e já traz, em sua trama, a crítica social e política que amadureceria trinta anos depois na obra prima daquele autor, o romance “Os miseráveis” (1862).

 

Victor Hugo é considerado por muitos como o principal escritor francês. Publicou, entre romances, livros contos e poesia, cinquenta e três títulos, sem contar as obras póstumas. Ele foi um autor pioneiro ao aliar, em suja obra, o rigor artístico e literário com a militância libertária e republicana.

 

Politicamente, Victor Hugo foi deputado representando os republicanos de Paris e, depois, senador. Apoiou a revolução de 1848 e, mais tarde, foi um decidido oponente do golpe de Estado de Luiz Napoleão, em 2 de dezembro de 1851, descrito por Marx em 18 Brumário[7] de Luiz Bonaparte[8]: chegou a lutar nas barricadas em Paris e, quando Luiz Napoleão proclamou-se imperador, foi para o exílio; em 1852 escreveu uma obra que daria origem a um apelido depreciativo daquele dirigente francês: Napoléon le Petit (Napoleão o pequeno).

 

Advirta-se que seu radicalismo não o tornou socialista, mas, mesmo assim, apoiou a Comuna de Paris em 1871, embora criticamente. Seu significado, escreveu, " é imenso, ela poderia fazer grandes coisas, mas na verdade faz somente pequenas coisas”. Dizendo-se “um homem de revolução”, condenou a repressão sangrenta contra os communards: "Alguns bandidos mataram sessenta e quatro reféns. Replica-se matando seis mil prisioneiros!".

 

Foi publicado em 1829, “O último dia de um condenado” do romancista francês Victor Hugo narra as últimas horas de um homem condenado a morte. A obra escrita em primeira pessoa desloca a atenção dos leitores sobre a questão da pena capital dos discursos judiciais e legalistas para a visão subjetiva de quem é submetido a esta sentença. Do momento do veredicto até o momento da execução, vê-se como se dá o processo de desconstrução da natureza humana.

 

Há um considerável decaimento no que tange a dignidade do homem no exato instante pelo qual ele passa a ser adjetivado como condenado à morte, pois, a partir do espectro do condenado influenciado pelo tratamento que o sistema prisional lhe confere, se dá a partir do momento de sua condenação.

 

Portanto, a condenação de uma pessoa à morte supunha um processo anterior de desumanização completa, alienando-o de suas atividades que assim o define. E os meios e métodos eram vários: a privação de liberdade, o distanciamento familiar, o confinamento em calabouços, o mau trato à sua higiene pessoal, o descaso com sua alimentação pessoal e, por vezes, a tortura.

 

 

Referências

 

AMÂNCIO, Vitor. A pena de morte no Brasil e o ativismo de político de Victor Hugo. Disponível em: https://www.jusbrasil.com.br/artigos/a-pena-de-morte-no-brasil-e-o-ativismo-de-politico-de-victor-hugo/922499085Acesso em 11.5.2024.

BRANDÃO, Lucas. A vida e obra de Victor Hugo. Disponível em: https://comunidadeculturaearte.com/a-vida-e-obra-de-victor-hugo/ acesso em 11.5.2024.

HUGO, Victor. O último dia de um condenado. São Paulo: Estação liberdade, 2002,

LEMANSKI, Jorge L.; MAZIA, Marcos Vinícius F.; LIMA, Vicente Beur M.  Victor Hugo e sua literatura e os problemas sociais de sua época. Anais do VII CONCCEPAR: Congresso Científico Cultural do Estado do Paraná / Centro Universitário Integrado de Campo Mourão. - Campo Mourão, PR: Centro Universitário Integrado de Campo Mourão, 2016. Disponível em: https://conccepar.grupointegrado.br/resumo/victor-hugo-sua-literatura-e-os-problemas-sociais-de-sua-epoca/480/785 Acesso em 11.5.2024.

VOLTAIRE. Tratado sobre a tolerância. Porto Alegre: LP&M, 2011.

 

 


[1] Miguel Reale (1910 —2006) foi um integralista, jurista, filósofo, ensaísta, poeta, memorialista e professor universitário brasileiro. Conhecido principalmente por sua longa atuação na advocacia e na academia, foi reitor da Universidade de São Paulo (USP), nomeado pelos governos Ademar de Barros e Abreu Sodré, secretário da Justiça do mesmo estado, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e um dos membros-fundadores da Academia Brasileira de Filosofia. Destacou-se no campo da filosofia do direito como criador da teoria tridimensional do direito, que é particularmente difundida no Brasil e tem como objeto a integração da norma jurídica ao fato social e aos valores culturais, num processo histórico-dialético de implicação e complementaridade, compreendendo o Estado a partir de três ordens indissociáveis de apreciação: a sociológica, a filosófica e a jurídica (fato, valor e norma).

 

[2] Em 1804, depois de ter sido eleito cônsul vitalício em plebiscito, Napoleão foi coroado imperador dos franceses e instaurou um regime monárquico, embora inspirado nos princípios da revolução. "A política externa, porém, isolou a França na Europa, dominada então pela diplomacia do chanceler prussiano Otto von Bismarck. A rivalidade com a Prússia, cujo poder se expandia na Europa central, precipitou a deflagração da guerra de 1870, a propósito da sucessão espanhola. Depois das batalhas de Sedan e Metz, os exércitos franceses, cercados, foram obrigados a capitular. A França perdeu a Alsácia e a Lorena e comprometeu-se a pagar pesada indenização de guerra. Napoleão III foi capturado e instalou-se a terceira república. O novo período começou com prenúncios de instabilidade política, como a explosão revolucionária da Comuna de Paris, esmagada pelo primeiro governo da terceira república, e a tentativa de golpe do presidente Marie-Edme-Patrice-Maurice de Mac-Mahon em 1877. Uma vez consolidado, o regime optou por uma política colonialista."

 

[3] O filho de Jean Calas, protestante, recebeu exéquias pomposas como mártir, pois a população julgou que ele foi morto por desejar se tornar católico, como o irmão, Jean Calas foi condenado à roda (despedaçamento dos membros) e à fogueira. Este fato, ocorrido mais de seis décadas antes da publicação de O último dia de um condenado, foi objeto de estudo de Voltaire e que originou uma de suas obras mais conhecidas O tratado sobre a tolerância. “O assassinato de Calas, cometido em Toulouse pelo gládio da justiça, a 9 de março de 1762, é um dos eventos mais singulares que possam merecer a atenção de nossa época e da posteridade. Esquecemos facilmente essa multidão de mortos que pereceram em batalhas sem nome, não somente porque essa fatalidade é consequência inevitável da guerra, mas porque aqueles que morrem pela sorte das armas poderiam também ter dado morte a seus inimigos e não pereceram absolutamente sem se terem defendido. Onde o perigo e as vantagens são iguais, o espanto cessa e até mesmo a piedade se enfraquece; porém, se um pai de família inocente é entregue às mãos do erro, da paixão ou do fanatismo; se a única defesa do acusado é sua própria virtude; se o único risco que os árbitros de sua vida correm ao matá-lo é o de cometerem um engano; se eles podem matar impunemente mediante uma sentença, então o protesto público se eleva, já que cada um teme por si mesmo, percebe que ninguém pode julgar sua vida em segurança perante um tribunal instituído para velar pela vida dos cidadãos e todas as vozes se reúnem para exigir vingança.”

[4] A Comuna de Paris foi um movimento popular ocorrido na capital francesa em 1871 organizado por trabalhadores em resposta à crise socioeconômica vivida pela França. A Comuna de Paris de 1871 ficou marcada pela formação de barricadas nas ruas parisienses. A Comuna de Paris foi a primeira república proletária da história, quando os “communards”, revolucionários parisienses, tomaram o poder na cidade de Paris, em março de 1871. O levante popular teve uma natureza orgânica e espontânea, com vistas ao socialismo, influenciado pelo marxismo e outras correntes de esquerda. A Comuna de Paris foi a primeira república proletária da história, quando os “communards”, revolucionários parisienses, tomaram o poder na cidade de Paris, em março de 1871. O levante popular teve uma natureza orgânica e espontânea, com vistas ao socialismo, influenciado pelo marxismo e outras correntes de esquerda.

[5] Charles-Louis Napoléon Bonaparte (1808-1873) foi o primeiro presidente da segunda república francesa e, depois, Imperador dos Franceses do Segundo Império Francês. Era sobrinho e herdeiro de Napoleão Bonaparte. Foi o primeiro presidente francês eleito por voto direto. Porém, foi impedido de concorrer a um segundo mandato pela constituição e parlamento, organizado a um golpe em 1851 e assumindo o trono como imperador no fim do ano seguinte. Suas primeiras tentativas de golpe de Estado falharam, mas, na sequência da Revolução de 1848, conseguiu estabelecer-se na política, sendo eleito deputado e, em seguida, presidente da República. Finalmente, o bem-sucedido golpe de 1851 pôs fim à Segunda República e permitiu a restauração imperial em favor de Luís Napoleão. Seu reinado, inicialmente autoritário, evoluiu de forma gradativa após 1859 para o chamado "Império Liberal". Durante seu reinado, Napoleão III implementou a filosofia política publicada em seus ensaios Idées napoléoniennes e De l'extinction du paupérisme (1844) — mistura de romantismo e liberalismo autoritário. Admirador da modernidade britânica, o imperador foi responsável por um considerável desenvolvimento industrial, econômico e financeiro no país e, também, pela reforma urbana de Paris (em conjunto com o prefeito Georges-Eugène Haussmann). A intensa hostilidade do consagrado literato Victor Hugo contra o imperador — a quem ele apelidou de "Napoleão, o Pequeno" —, expressa em seus livros e em suas correspondências, os inúmeros panfletos, análises espantadas e as diversas críticas de outros autores (como Henri Rochefort, Maurice Joly, Karl Marx com seu O 18 de Brumário de Luís Bonaparte, entre outros) e os artigos de parte da imprensa política contemporânea (como Le Siècle e L'Opinion nationale participaram do desenvolvimento daquela que muitos historiadores[nota 2] descrevem como "lenda negra" sobre Napoleão III e o Segundo Império.

[6] A bela cigana Esmeralda, se oferece para casar-se com o poeta Pierre Gringoire para livrá-lo da sua condenação à morte. No entanto, há outro que deseja a cigana - o corrupto arquidiácono Claude Frollo, que confessa seu amor por ela. La Esmeralda é uma grande ópera em quatro atos composta por Louise Bertin. O libreto foi escrito por Victor Hugo, que o havia adaptado de seu romance de 1831 Notre-Dame de Paris (O Corcunda de Notre Dame).  A ópera estreou no Théâtre de l'Académie Royale de Musique em Paris em 14 de novembro de 1836 com Cornélie Falcon no papel-título. Apesar da produção luxuosa, a estreia foi um fracasso, e La Esmeralda provou ser a última ópera composta por Bertin, embora ela tenha vivido por mais quarenta anos.

[7] Foi uma manobra política para garantir a ascensão dos girondinos, a alta burguesia francesa, ao poder. Também serviu para conter os jacobinos, preservar as conquistas da Revolução Francesa e frear a guerra com os países contrários aos ideais revolucionários. O Golpe de 18 de Brumário do Ano VIII (de acordo com o Calendário Republicano Francês) foi um golpe de Estado ocorrido na Primeira República Francesa em 9 de novembro de 1799, que colocou fim ao regime do Diretório e à Revolução Francesa, dando início à Era Napoleônica. Após o Golpe de 18 de Brumário, uma nova Constituição foi redigida e os poderes da República se concentraram nas mãos de três cônsules: Napoleão Bonaparte, Roger Ducos e o próprio Sieyès, sendo os dois últimos substituídos logo em seguida por Jean-Jacques-Régis de Cambacérès e Charles-François Lebrun.

[8] Luís Napoleão Bonaparte (Ajaccio, 2 de Setembro de 1778 – Livorno, 25 de Julho de 1846) foi um príncipe francês e Rei da Holanda de 1806 a 1810. Era um dos irmãos de Napoleão Bonaparte e foi o pai de Napoleão III. Depois do seu regresso à França, esteve envolvido no plano de Napoleão para derrubar o Directório. Depois de se tornar primeiro cônsul, Napoleão arranjou um casamento entre Luís e Hortênsia de Beauharnais, a filha da Imperatriz Josefina e enteada de Napoleão. Hortênsia, que se opunha ao casamento, foi persuadida pela mãe a casar com Luís pelo bem da família.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 18/08/2024
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