O primeiro orvalho
A primeira vez que vi o orvalho, era criança ainda, e pensei que fosse uma gota de lágrima... A friagem condensando, e, talvez, algum anjo triste chorando por causa do frio.
Minha avó sempre tinha uma explicação poética para tudo... chegou a dizer que a gotinha era uma reserva, para o dia que depois se mostrará quente e árido...
Ao contemplar os espinhos dos cactos, ela falava que era para ser uma beleza intocável... Poderíamos admirá-lo, mas sempre a distância...
E, então a estética em plena solitude explicava a essência natural das coisas... a perenidade que levamos na alma... que veste o espírito e, ainda, nos dá a sensação de que as lembranças nos confortarão... para os dias de tempestades ou, simplesmente, para os abismos sem Minotauro, mas exigindo resistência, inteligência e, destreza.
A primeira vez que vi um adulto chorar compulsivamente, confesso que fiquei estarrecida... Só conhecia a tristeza em crianças..., mas, jamais em adultos jovens, nem idosos... Talvez suas lágrimas fossem invisíveis.
Minha avó era a alegria em pessoa. Risonha sempre, fazendo piadas e gracejos e, transformando qualquer situação embaraçosa em um motivo de rir e, de angariar algum aprendizado...
Hoje caminhando no Centro do Rio de Janeiro, muitas lembranças me açodaram... lugares, pessoas, odores e sentimentos... Como me sentia importante em trabalhar e, principalmente, por estudar... Aprender a aprender, aprender ensinando e, com afeto... que adoça a vida.
Deu tanta saudade do quadro negro, o giz branco e o colorido... os alunos com seus olhinhos aflitos na primeira aula... O sinal soando e avisando sobre o término da aula, e começo do intervalo...
O derradeiro sinal soava melancólico... O dia de aula acabara... e as crianças arrumavam seu material para retornarem para suas casas...
Infelizmente, alguns retornavam apenas para casa, mas não conheciam um lar, nem se nutriam do afeto necessário...
A primeira gota de orvalho no silêncio da manhã, em cima de uma pétala de rosa que altaneira superava as dificuldades e, desabrochava, mesmo que o jardim não fosse favorável e, ainda, diante de uma primavera improvável.
A lágrima preciosa confortava os corações que sofriam intempéries, mas sobreviviam mais fortes e, principalmente, mais resistentes.