Delicadeza
Suas mãos gesticulavam as palavras que ganhavam movimento e semântica. Seus olhos vívidos com sombrancelhas como acento circunflexo regiam a êxtase e a emoção. Em silêncio, prometíamos até a eternidade. Deitávamos sobre as reticências e, o futuro vinha numa cadência branda e suave. Lá fora, a chuva final orvalhava o cenário. Tacitamente, concordamos em contemplar a paisagem, aquele momento eterno dentro da ampulheta a derramar a areia em silêncio no deserto contemporâneo. Parecia que tudo era uma extensão espiritual dotada de nuances azuis sem nuvens ou estrelas... Possivelmente, navegávamos num mar desconhecido, por ondas súbitas, enfrentávamos ciclones, tempestades e, a dor de perder entes queridos, de romper vínculos afetivos e, de se sentir solitário num mundo sombrio. Sua delicadeza explícita expunha meu ser selvagem e banido. Que recusava-se a ter delicadezas. O medo de ser mal compreendido. O medo de sentimentos serem enviesados e no oblíquo perderem-se no abismo com minotauros. Tínhamos a delicadeza de somente chorar quando pudesse. Precisávamos amparar outras pessoas, dar-lhe algum alento e mostrar-se forte para amparar o baque da dor e do drama. Ainda deveríamos ter a delicadeza para enfrentar a ordem desastrosa e caótica da vida contemporânea, esse postulado sombrio e tão desesperador pois a realidade, por vezes, é simplesmente insuportável. Por vezes, a filosofia não traz a cura, mas elucida a peste... Talvez entendendo a doença, encontraremos alguma terapia. Haviam delicadezas explícitas e implícitas. Um olhar, uma mão, um dedo em riste apontar caminhos e atalhos e, a resistência necessária para sobreviver, com alguma dignidade. Com alguma delicadeza.