"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

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Misoginia contemporânea

 

Recentemente, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública divulgou a pesquisa denominada "Visível e Invisível" que apontou crescimento de todas as formas de violência contra a mulher em 2022. Registrou-se o dado que aponta mais de 18,6 milhões de mulheres de 16 anos ou mais foram agredidas seja verbalmente ou fisicamente.

A mesma pesquisa apontou que cerca de 33,4% das mulheres brasileiras já foram vitimadas por violência física ou sexual provocada seja por um companheiro, ex-companheiro, marido, ex-marido, namorado ou noivo ao longa da vida, resultado muito superior à média mundial que é estimada 27% segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Nas redes sociais, mulheres famosas ou não são abertamente ameaçadas de morte. Maas, o que é motriz do crescimento da violência de gênero no país

Há um movimento chamado Redpill que se refere a uma cena do filme de ficção científica chamado Matrix, onde o protagonista tinha que escolher em tomar uma pílula azul e continuar vivendo em pura ilusão, ou então, tomar a pílula vermelha e descobrir a realidade. O movimento Redpill é o movimento masculinista, a realidade seria um mundo em que as mulheres são privilegiadas, interesseiras e aproveitadoras e, os redpills, os homens que se opõem a esse sistema que favorecia mulheres.

De acordo com a pesquisadora Michele Prado, autora da obra intitulada “Redpill- radicalização e extremismo, essa é uma metáfora utilizada pela extrema direta em todo mundo”. Redpill é mais um dos vários grupos masculinistas tais como o Incel (celibatário involuntários), MGTOW (homens seguindo seu próprio caminho) e PUAs (artistas da pegação), que supostamente lutam pelos "direitos dos homens", outros mencionam direitos dos machos, e para tanto se opõem às feministas e aos direitos das mulheres.

O movimento masculinista entoa como doutrina discursos de ódio e, estimulava haver a submissão feminina e o resgate da virilidade masculina, valorizando um ideal de comportamento violento e predador dos homens que teriam perdido a hegemonia e a posição de topo ou de líder na cadeia alimentar. O movimento masculinista trava uma autêntica guerra contra a igualdade de gênero e os direitos das mulheres o que é muito caracterizador para compreender a ação dos masculinistas, que se situam também na extrema direita no mundo.

O movimento alemão “Demo für alle” culpa o feminismo pela destruição da família e travou batalha contra o ensino de diversidade sexual no currículo escolar da Alemanha. Tais grupos, porém, não contam somente com homens.

O partido político polonês chamado “Lei e Justiça” (PiS) que, entre outros, se dedica ao combate de ideologia de gênero e aos direitos LGBTQIA+ teve grande liderança entre os anos de 2015 a 2017.

A ONG Safernet mostrou a expansão de grupos que propagam crimes de ódio pelas redes sociais e, entre 2021 a 2022 as denúncias de misoginia registraram um aumento de 184%, as de intolerância religiosa, de 522% e as de xenofobia na ordem de 821%.

Considerando os anos eleitorais, a central brasileira da organização denuncia o crescimento constante dos crimes de ódio desde 2018. Também nos últimos anos assistimos ao fortalecimento do movimento “Escola sem Partido”, que colocou o combate à igualdade de gênero como prioridade, resultando na intimidação a docentes e na proposição de projetos de lei que atacam a inclusão de questões relativas à igualdade de gênero, raça e sexualidade nos conteúdos escolares.

Infelizmente, em 8 de março de 2023 ainda noticiamos o crescimento acentuado de diferentes formas de violência física, moral e sexual contra mulheres. E, o indicador de desigualdade de gênero do Fórum Econômico Mundial, o Global Gender Gap Report colocou o Brasil em sua edição mais recente no 94º lugar em uma lista de cento e quarenta e seis países. 

Em 2013, estávamos em 62ª posição, o que revela o acentuado retrocesso em razão da busca pela igualdade de gênero tornou-se um problema para parcela da população e dos grupos políticos no poder.

Infelizmente, não se pode dissociar esse retrocesso no país da ascensão da extrema direita no Brasil contemporâneo. Mesmo que o movimento feminista logre conquistas fundamentais para os direitos e proteção das mulheres, tais como a Lei Maria da Penha, a reação dos movimentos ultraconservadores tem sido na direção de anular tais conquistas. E, tal reação não se dá apenas no mundo virtual. Tanto que na política brasileira registrou a criação do Ministério da Família que zerou os recursos orçamentários voltados para as políticas de enfrentamento à violência contra a mulher enquanto sujeito de direitos e passou a priorizar a família, ainda que esta fosse a principal fonte da violência reiteradamente perpetrada. 

Em cada dez feminicídios no Brasil, oito são praticados pelo parceiro íntimo da vítima e na convivência familiar. Com a pandemia de Covid-19 o crescimento exponencial da violência doméstica teve como cenário principal a casa das famílias.

Atualmente, vige a misoginia disfarçada de autoajuda e nos discursos de influenciadores de grupos masculinistas que trazem graves consequências nas vidas das mulheres, 7,4 milhões de mulheres foram agredidas fisicamente com tapas, socos, chutes somente em 2022. O que equivale apontar que ocorrem catorze agressões físicas por minuto no Brasil.

Já outras 3,4 milhões de mulheres foram espancadas ou sofreram tentativas de estrangulamento (homicídio), 3,3 milhões sofreram graves ameaças seja com faca ou arma de fogo. E, não se restringe à mulher, indo até atingir os filhos, basta lembrarmos da tragédia do Henry Borel que acarretará o julgamento dos réus (ex-padastro e mãe) pelo Tribunal do Júri, a criança morta continha mais de vinte e cinco lesões corporais segundo relatório oficial do IML.

É preciso advertir que não existe a liberdade de expressão quando se revela através de discursos de ódio às mulheres. É preciso haver conscientização de que todos (absolutamente todos) merecem o respeito à dignidade humana.

 

Referências

BUENO, Samira. Misoginia Disfarçada de Autoajuda. Revista Piauí. Disponível em: https://piaui.folha.uol.com.br/misoginia-disfarcada-de-autoajuda/   Acesso em 10.3.2023.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 17/07/2023
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