"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

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Novela: Ação Penal 1.044

Sim, trata-se de uma novela mexicana, impregnada de dramalhões engraçados e tristes simultaneamente. Enfim, a decisão judicial proferida no dia 30 de março de 2022 e referendada pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal fixou, entre outras medidas, a multa diária de quinze mil reais, em relação ao réu Daniel Lúcio Silveira, principalmente em face de descumprimento de quaisquer medidas cautelares decretadas anteriormente.

O julgamento em 20 de abril de corrente ano, o STF por maioria, julgou o mérito da referida ação penal e o condenou nas penas do artigo 18 da Lei 7.170/1983, por duas vezes na forma do artigo 71 do Código Penal brasileiro, em face da ultra-atividade da lei penal mais benéfica em relação ao artigo 359-L do CP e, ainda a pena de trinta e cinco dias-multa, atualizado até o efetivo pagamento. E, considerando todas as penas, totalizou-se oito anos e nove meses de reclusão, em regime inicial fechado e, 35 dias-multas, o valor do dia-multa equivalente a cinco salários-mínimos.

Após, o trânsito em julgado, ficam ainda suspensos os direitos políticos do condenado, enquanto durarem os efeitos da condenação, bem como a perda do mandato parlamentar, nos termos do artigo 55, inciso VI, e o §2º da CF/1988 e o artigo 92 do Código Penal brasileiro.

Há o fato notório que no dia 21.04.2022, o Presidente da República editou indulto individual ou graça em prol do indigitado réu. Apesar de existir pedido requerendo a declaração e inconstitucionalidade do referido decreto de indulto, cuja relatoria é da Ministra Rosa Weber, e apesar de o indulto ser ato discricionário e privativo do Chefe do Poder Executivo, a quem compete definir os requisitos e extensão da referida clemência, não constitui ato imune ao absoluto e pleno respeito à Constituição Federal. De modo que é passível de controle jurisdicional.

Entretanto, inerente ao controle de constitucionalidade (concentrado) e segundo os termos dos artigos 738 do CPP e art. 192 da Lei de Execuções Penais, há, necessidade da juntada aos autos de cópia do Decreto Presidencial de indulto, o que até o presente momento, não foi feito pela defesa do réu, para decisão de duas questões que são da competência privativa do Poder Judiciário.

Recorde-se que a majoritária doutrina defende que quanto ao cabimento de graça e do indulto somente após o trânsito em julgado da sentença condenatória (vide Damásio Evangelista de Jesus, Cezar Roberto Bittencourt, Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli, René Ariel Dotti, Cristiano Rodrigues, Norbert Avena, Luíz Regis Prado e Rodrigo Duque Estada Roig) todos citados pelo Ministro Alexandre de Moraes, portanto, muitas decisões corroboram que o próprio STF entendendo possível a concessão do indulto, desde que, após a publicação da sentença condenatória, haja somente recurso da defesa pendente, tendo ocorrido trânsito em julgado para a acusação.

O Ministro Relator frisou ser imprescindível a juntada imediata do referido Decreto Presidencial de indulto individual, para que, além da análise do decreto de extinção de punibilidade pelo poder Judiciário, igualmente, seja possível definir os respectivos reflexos da medida nos efeitos secundários da condenação, pois, o STF, no exercício de sua competência constitucional privativa, já definiu que a concessão do indulto extingue a pena, mas não o crime, de modo que não são afastados os efeitos secundários do acórdão condenatório, dentre os quais a interdição do exercício de função ou cargo públicos.

Portanto, não se apaga o ilícito nem suprime as suas consequências de ordem penal, principalmente os efeitos penais secundários da sentença condenatória. Eis que o STJ em sua Súmula 631 ratifica plenamente tal entendimento.

O que também é pacificado pelo Tribunal Superior Eleitoral que entende que o indulto presidencial não equivale à reabilitação para afastar a inelegibilidade decorrente da condenação criminal, o qual atinge somente os efeitos primários da condenação, ou seja, a pena, sendo mantidos integralmente os efeitos secundários.

O Ministro Relator menciona ser absolutamente necessário também definir o exato momento em que o indulto individual surtirá seus efeitos de extinção da punibilidade. E, enquanto isso não ocorre, a referida ação penal prosseguirá normalmente, inclusive no que se refere à observância de medidas cautelares impostas ao réu e devidamente referendada pelo Plenário do STF;

Apontou o Ministro Relator do STF diversas notícias sobre descumprimento de medidas cautelares seja quanto o monitoramento eletrônico, seja por participação do réu em evento político público realizado em 31.3.2022 no Palácio do Planalto bem como a concessão de entrevista coletiva no dia 30.3.2022 em seu gabinete na Câmara dos deputados. E, por essa razão, determinou a juntada do indulto individual aos autos, a intimação da defesa do réu para que em 48 horas se manifeste sobre o descumprimento de medidas cautelares e, após a manifestação da defesa, abra-se vista à Procuradoria-Geral da república, para manifestação em igual prazo.  Registrou-se ainda que o advogado Jean Cléber Garcia renunciou, o que requer retificação da autuação processual.

Padece o Decreto Presidencial de indulto individual de dupla inconstitucionalidade, uma de caráter procedimental, e outra de caráter material, que é mais grave e, poderá resultar na total ineficácia da graça concedida e na extinção de punibilidade, o que será em breve decidido pelo Plenário do STF, conforme já informou a Ministra Relatora Rosa Weber.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 17/07/2023
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