É tarde.
Todas as badaladas já soaram
Em seguidilha. Impecáveis.
É tarde.
A infância passou...
A juventude passou...
A maturidade se torna senilidade.
Esqueçamos coisas óbvias.
Nomes, lugares e datas.
Só sentimentos e valores ficam no arquivo.
É tarde.
O carrilhão da sala revela solenemente.
A catedral com as luzes acesas
solicita orações, rezas e procissões.
É tarde para recuperar tanta coisa.
Entulhamos coisas, fatos, estórias nos bolsos.
Nas bolsas, nas malas e, na consciência.
Tem dias, que a consciência de tão repleta
Não consegue ordenar as sinapses.
Não consegue hierarquizar tudo.
Catalogar, inserir, etiquetar ou nomear.
Fica tudo tão improvável.
Tão reticente.
A deitar-se no horizonte infinito.
Dormindo com a finitude do dia e das manhãs.
É tarde.
Agora o relógio cronometra os
derradeiros momentos.
Essa enxaqueca a me dominar impávida.
O olho que tudo vê, mas não enxerga.
A mão que pode tocar, mas refuga.
Os pés que apalpam o caminho
a procura de vestígios, pistas ou
enigmas ainda por decifrar...
Pés que tropeçam no visgo.
Agora a gaveta range.
As cortinas dançam ao vento.
A cartomante decifra o tarot.
E a sorte já estava lançada
desde que nasci prematura.
Todos os dias
Ao final da tarde.
Diante dos últimos raios vermelhos
e no lilás das nuvens
A poesia colorida do entardecer
me enebria e embriaga...
E, apesar de reconhecer que é tarde.
Não desiste de ter esperanças.
De ter alegrias, aprendizados e
seguir junto para um destino
que traçamos com nossa vivência.