Quixote é eterno. Tanto que não morreu. E, Cervantes e Quixote, criador e criatura se perdoam e se fundem. Pois de um lado, o Cavaleiro da Triste Figura que insiste em ser sonhador e, de outro lado Sancho, o fiel escudeiro, com sua visão realista. Num dia quente e árido de outubro de 1614 morreu Alonso Quijano, assistido por sua jovem sobrinha, pela fiel ama e, rodeado dos melhores amigos. No mesmo dia, à tarde, foi enterrado tendo como plateia todo o povoado. A preciosidade de Dom Quixote estava em suas fantasias e loucuras enquanto travava
batalhas contra os moinhos de vento e, também, contra o exército de ovelhas. “A liberdade, Sancho, é um dos mais preciosos dons que os homens receberam dos céus.
Com ela não podem igualar-se os tesouros que a terra encerra nem que o mar cobre; pela liberdade, assim como pela honra, se pode e deve aventurar a vida, e, pelo contrário, o cativeiro é o maior mal que pôde vir aos homens.”
A morte de Quixote significaria o fim da imaginação capaz de reiventar o mundo. Em seu leito de morte, eis que o Cavaleiro recobre a razão num lampejo e roga perdão à Dolores e Sancho por todas as coisaas que fez em meio aos delírios. Ao se tornar um cavaleiro andante, enfrentou muitos moinhos, e os tortos caminhos a endireitar, as injustiças a emendar e os abusos a reduzir e reprimir...
Mas, na sua alma estava latente toda a eternidade. Ao lutar contra os moinhos de vento, o Cavaleiro nos alerta sobre a errônea percepção do adversário e de um cenário... na substituição da mão humana pela mão das engenhocas. Não se trata de uma luta inútil. Afinal, do que vale a vida senão lutar e lutar até que a paz, finalmente, seja decretada pela morte. Quatrocentos e dezoito anos depois de publicada a obra de Miguel Cervantes, concluímos que a paixão é espécie de loucura permitida e graças a ela, nossos sentimentos conhecem o infinito e imantam o tempo.