A contemporânea crise da democracia não se restringe à crise de representação e, se as eleições têm menor capacidade representação por razões institucionais, culturais e sociológicas. Uma autêntica democracia requer cidadãos iguais em dignidade e reconhecimento. Do contrário, o déficit de representação provoca apenas oscilações entre a total passividade e o medo que em geral favorecem os oportunistas e os populistas da extremo direita.
Há um desencanto democrático, pois a história foi feita de promessas que jamais foram cumpridas e, por ideais flagrantemente traídos. Os mecanismos de revogação ou de impeachment para controlar os representantes eleitos mediante a interrupção de seus mandatos e novo chamado para eleições não restabelecem o salutar processo democrático.
Atualmente, adentramos em nova era de identidade, relacionada ao desenvolvimento de um individualismo de singularidade ímpar e, isso modifica as percepções da sociedade e as expectativas dos cidadãos. Trata-se de nova etapa da emancipação humana, com acesso a existência puramente pessoal e, tal evento está relacionado a forte complexidade e heterogeneidade do mundo social, bem como às mutações do capitalismo.
Porém, de forma mais profunda, o advento dessa "nova era" se vincula ao fato de que os indivíduos são doravante
determinados tanto por sua história pessoal quanto por sua condição social. O indivíduo-história, necessariamente
singular, sobrepôs-se assim ao indivíduo-condição, mais identificado de forma estável a um grupo, constituído em torno a uma característica central.
Representar situações sociais torna-se então necessário, enquanto que antes só se tratava de representar condições sociais. Não é tanto a designação de um representante o que se faz necessário neste caso, mas sim a consideração pública das experiências e situações vividas.
Mais do que nunca, a democracia deve interrogar-se, se deve continuar sendo uma experiência vívida e exigente,
não se encastelando num só modelo diante de uma realidade tão dinâmica como o buraco negro. Cada vez mais se requer conscientização da diversidade e das demandas sociais a que não se pode recusar a dignidade humana.