"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

Textos


 

Resumo: A miserabilidade em França contrastava e revoltava o povo, principalmente, pelo ponto de vista dos mais pobres que viam as despesas e gastos do Imperador Napoleão III, com a política externa, exprimindo exagero a que apenas visava sua promoção pessoal diante da comunidade internacional. Victor Hugo descreveu minuciosamente o personagem Jean Valjean e, sua vida repleta de delitos famélicos[1]. Lembremos que a fome transforma pessoas em verdadeiros animais ferozes. O que nos remete a cogitar sobre a Justiça Social e todo aparato estatal no ordenamento brasileiro contemporâneo destinado à defesa e primazia do princípio da preservação da dignidade humana.

Palavras- Chave: Direitos Fundamentais. Justiça Social. Estado Democrático de Direito. Princípio da preservação da dignidade humana. Constituição Federal brasileira de 1988.

 

Os Miseráveis (no original Les Misérables) é um romance que narra a situação política e social da França no século XIX. Foi escrito pelo francês Victor Hugo[2] sendo publicada pela primeira vez em 1862. Logo após primeiras vinte e quatro horas, após a primeira publicação em Paris foram vendidas todas as sete mil cópias, o que a tornou num best-seller na época.

É considerada uma obra clássica do romantismo francês, juntamente com outra obra "O Corcunda de Notre Dame[3]". Seu autor começou escrever por volta de 1846, porém, devido a Revolução de Fevereiro de 1848, o autor  foi forçado a realizar uma pausa. E, somente retornou em 1851 e, finalizou-a em 1861.  Descreveu a vida precária de pessoas muito pobres de Paris durante o período da Insurreição Democrática.

Por meio do protagonista, Jean Valjean, o romance faz críticas a sociedade francesa da época, desde a desigualdade social aos dilemas morais individuais das pessoas.

“Os Miseráveis” é dividido em cinco volumes: Volume 1 – Fantine: volume que faz a conexão entre o destino de Fantine e de Jean Valjean; Volume 2 – Cosette: volume voltado para vida de clausura e dedicado a perseguição a Jean Valjean; Volume 3 – Marius: volume focado na narrativa do personagem Marius, um moleque de Paris, a alma da cidade; Volume 4 – Idílio da Rua Plumet e epopeia na Rua de S. Diniz: é o volume que contextualiza com o acontecimento que estavam ocorrendo em Paris, em 1832; Volume 5 – Jean Valjean: é o volume com a finalização do romance, com o desfecho da narrativa de Jean Valjean.

O protagonista, Jean Valjean, é um homem comum que se vê obrigado a alimentar a sua família faminta e, para tanto, rouba um pão da vitrine de uma padaria. O jovem é condenado a cinco anos de prisão por furto e arrombamento.

O passado do rapaz era trágico, pois, Jean ficou órfão de pai e de mãe quando ainda era criança, tendo sido criado por uma irmã mais velha que já tinha sete filhos. Assim que a irmã fica viúva, o irmão torna-se o arrimo da família.

Como tenta inúmeras vezes fugir da prisão e tem um notável histórico de mau comportamento, Valjean é condenado a trabalhos forçados por dezenove anos.

Ao deixar a prisão, é rejeitado por onde passa pois todos o temem devido ao seu passado violento. Jean é expulso de hospedarias e rejeitado em casas particulares quando toca a campainha. Por fim, é abrigado por um bispo, um homem generoso que o acolhe.

Valjean, porém, decepciona aquele que o acolheu após roubar castiçais e talheres. Quando é capturado pela polícia, no entanto, recebe o perdão do bispo, que mente para as autoridades ao afirmar que havia dado os objetos de presente para o antigo prisioneiro. A partir desse momento, Valjean resolve mudar de vida, passando a ser um homem honesto e de bem.

O antigo delinquente muda de identidade e torna-se dono de uma fábrica na Alemanha, onde ninguém conhece o seu passado obscuro. Apesar de ter conseguido construir um novo destino, Valjean vive assombrado pela possibilidade de ser reconhecido.

O inspetor Javert, um sujeito aficcionado pela justiça, anda a sua procura durante diversos anos. Na fábrica, Valjean conhece a pobre Fantine, uma moça que engravidou de um estudante e foi abandonada.

A jovem resolve dar à luz a Cosette, mas precisa deixá-la sob os cuidados dos Thenadièrs. Com o salário que recebia na fábrica enviava mensalmente uma mesada para a menina, sem saber que os responsáveis por cuidar dela a agrediam.

Quando o supervisor da fábrica descobre o passado de Fantine, demite a moça. Diante de tal cenário, a jovem vê-se obrigada a vender os próprios cabelos,

os dentes, e chega a se prostituir. Valjean, quando fica a par da história, decide adotar a menina Cosette e criá-la como filha.

Cosette cresce e casa-se com o jovem idealista Marius. Quando Valjean morre, a filha adotiva manda gravar em seu túmulo a seguinte homenagem: “Dorme. Viveu na terra em luta contra a sorte

                       Mal seu anjo voou, pediu refúgio à morte

                       O caso aconteceu por essa lei sombria

                       Que faz que a noite chegue, apenas foge o dia!”

O protagonista utópico Jean Valjean, que se transforma e evolui ao longo da história de maneira tão esplêndida, faz o nosso coração apertar.

A todo momento aprendemos com ele que escolher o caminho mais fácil e mais confortável nem sempre é a melhor solução. Existe um algo a mais em tudo que fazemos, mas muitas vezes é difícil de compreender. A consciência é o caminho que percorre nosso ilustre Valjean e o amor é a luz que o guia.

Victor Hugo apresenta a história do povo, dos menos favorecidos, sempre costurando a ficção com fatos históricos. Em “Fantine”, conhecemos o Senhor Myriel, Bispo  de Digne que vivia com suas duas fiéis irmãs, Bapstitine  e Magloire.

Um homem que vivia e agia por sua fé, altruísta, sempre preocupado em cuidar das pessoas e difundir seus pensamentos levando o bem e o melhor de sua religião.

“Nunca temamos nem os ladrões nem os assassinos. Estes são perigos externos, pequenos perigos. Temamos a nós mesmos. Os preconceitos, esses são os ladrões; os vícios,  esses são os assassinos. Os grandes perigos estão dentro de nós. Que importa o que ameaça nossa vida ou nossas bolsas? Preocupemo-nos apenas com o que ameaça nossa alma.”

A trajetória dos personagens carrega uma forte crítica político-social. Repare no modo singular (principalmente, naquela época) com que o Bispo de Digne tratava  alguns temas:

“Os erros das mulheres, dos filhos, dos criados, dos fracos, dos indigentes e dos ignorantes são os erros dos maridos, dos pais, dos amos, dos fortes, dos ricos e dos sábios”.

“Aos ignorantes, ensinem o máximo de coisas que puderem; a sociedade é culpada por não ministrar a instrução gratuita; ela é responsável pelas trevas que produz. Uma alma cheia de sombras, é onde o pecado acontece. A culpa não é de quem pecou, mas de quem fez a sombra”.

O encontro do protagonista Jean Valjean, abandonado pela vida, com o Bispo de Digne, também conhecido como Bispo Bienvenu (Bem-vindo), é um divisor de águas.

A partir daí, acompanhamos um amadurecimento e uma reviravolta incrível do personagem. Paralela a história de Jean Valjean, temos a trajetória extremamente delicada da linda Fantine, mãe solteira e sem condições de cuidar de sua filhinha Cosette,  se vê obrigada a deixá-la com uma família, os Thénardier.

A nova família de Cosette passa a maltratá-la e exigir cada vez mais dinheiro de Fantine para sustentar a criança. É sofrido acompanhar toda alegria, beleza e vivacidade de Fantine ser sugada da maneira mais cruel possível.

A narração onisciente dessa primeira parte, permite uma conversa com o leitor, provocando uma grande reflexão. Em algumas partes, nos sentimos, de certa forma, responsáveis. Surgem questões como: Quantas Fantines e Cosettes deixamos abandonadas por aí? Como parte da sociedade, somos todos responsáveis. Que o Bispo Bienvenu toque o coração de cada leitor, assim como ele fez com Jean Valjean!

Essa parte do livro descreve o destino de Cosette ao lado de Jean Valjean. Sentimos na pele o sofrimento e maus tratos que a pequena garota vivia todos os dias. A crueldade do Sr. e Sra. Thénardier, assim como das filhas - Éponine e Azelma -  é de dar nos nervos.

Ver Cosette bem era bem desejável tanto que torci e vibrei muito por cada pequena alegria da criança! Mesmo depois de tantos anos de torturas e falta de carinhos, ela manteve sua inocência e sua pureza no coração, deixando desabrochar o amor que nem sabia que podia sentir.

As referências à maternidade nessa parte são bem fortes. “Uma menina sem boneca é quase tão infeliz e tão completamente impossível quanto uma mulher sem filhos.”.

Uma alusão ao tema, também aparece quando Jean Valjean consegue cumprir sua promessa a Fantine. Ele resgata Cosette das garras dos Thénardier após 9 (nove) meses do falecimento de sua mãe. O sentimento de amor, carinho e cuidado que Jean Valjean tem para com a criança instantaneamente é como o de uma mãe ao ver seu filho pela primeira vez.

“Aproximava-se da cama em que ela dormia e tremia de alegria; experimentava espasmos dolorosos como uma mãe, mas não sabia o que era; pois é uma coisa bem obscura e bem terna esse grande e estranho movimento de um coração que se põe a amar.”

É notável a maneira que o autor conta a história e retoma personagens que já foram mencionados. Personagens que pareciam sem muita importância na primeira parte, ganham grande destaque agora. Como exemplo, temos Pai Falchelevent que se torna indispensável na vida de Jean Valjean e da pequena Cosette.

Esse método adotado por Victor Hugo de retomar os personagens e aprofundar suas histórias ao longo da obra, deixa o leitor mais íntimo dos fatos, dos protagonistas e cada pedacinho que une e liga os elementos, proporcionando um mergulho vívido no romance.

“No momento misterioso em que suas mãos se tocaram, uniram-se. Quando essas duas almas se avistaram, reconheceram-se como necessárias uma à outra e abraçaram-se estreitamente.”

Em várias partes do livro, Victor Hugo explicita seus valores e crenças. Faz apontamentos sobre a fé, sobre os ateus, sobre instituições religiosas, etecetera… “O homem ainda vive mais de afirmação do que de pão.”.

Esse método adotado por Victor Hugo de retomar os personagens e aprofundar suas histórias ao longo da obra, deixa o leitor mais íntimo dos fatos, dos protagonistas e cada pedacinho que une e liga os elementos, proporcionando um mergulho vívido no romance.

“No momento misterioso em que suas mãos se tocaram, uniram-se. Quando essas duas almas se avistaram, reconheceram-se como necessárias uma à outra e abraçaram-se estreitamente.”

Em várias partes do livro, Victor Hugo explicita seus valores e crenças. Faz apontamentos sobre a fé, sobre os ateus, sobre instituições religiosas, etecetera… “O homem ainda vive mais de afirmação do que de pão.”.

Marius" é a melhor parte da obra. Os livros são mais curtos e os personagens que apareceram nas partes anteriores se encontram de maneiras extraordinárias nesse momento. A impressão que eu tive ao ler, foi que o Victor Hugo segurou um funil na história e fez todos os fatos se encontrarem. Os ganchos de um livro para outro não me deixavam largar a leitura.

O jeito que o escritor retoma os personagens é hilário. Ele acha que me engana só por não citar nomes.  Marius é o protagonista dessa parte, na qual conhecemos sua história desde seu nascimento. Teve uma infância sofrida. Órfão de mãe e afastado de seu pai por seu avô, cresceu sem carinho e sem amor.

No início de sua vida adulta conheceu a verdadeira história de seu pai, que nos foi apresentada na segunda parte. O pai de Marius foi coronel na Batalha de Waterloo e teve sua vida salva por Thérnadier.

Marius passou muitos anos procurando o salvador de seu pai para lhe honrar, mas sua procura foi em vão. Nunca achou nenhum rastro!

Lembram-se de nossa pequena Cosette? Claro que ela aparece também, sempre acompanhada de seu “pai”. Cosette agora tem 15 anos e é dona de uma beleza exuberante que arrebata o coração de Marius. Um sentimento totalmente inovador para Marius e é divertido acompanhar suas descobertas.

O destino é a palavra que melhor resume essa terceira parte da obra. E que destino! Ocorrem muitos acontecimentos intensos e reveladores.

Comenta-se muito sobre política. Característica marcante do Victor Hugo, não poderia faltar os relatos históricos, como por exemplo: discussão sobre Monarquia e República[4],  conflitos de Bonapartistas contra burgueses e a crise de 1830 que gerou muitos bandidos e malfeitores. As dúvidas e as divagações de Marius ajudam o leitor a entender a situação política de vários aspectos. É muito interessante!

Essa parte é mais dedicada ao personagem Gavroche, um menino que cresceu sem amor, sem carinho, rejeitado por seus pais. Vive nas ruas e se vira como pode. Muito esperto e inteligente, ele sempre está em muitos lugares e ajuda a todos. Apesar da fome e de todas as adversidades da vida, Gavroche segue alegre e otimista.

A trajetória de Gavroche cruza com outros personagens importantes da história, o que deixa a trama mais interessante. A família dos Thérnadier ganha mais um espaço e descobrimos um pouco mais sobre eles e seus filhos.

Éponine se destaca e minha desconfiança a seu respeito fica mais aguçada.  Encontramos aqui uma detalhada explicação sobre revoltas e insurreições. Com maestria, Victor Hugo também elucida aos seus leitores a respeito da Revolução de 1830 e o movimento de junho de 1832.

Toda obra foi dedicada a explicações sobre gírias francesas. Provavelmente, é um desabafo crítico do autor devido às críticas da época com respeito ao uso da linguagem popular nas obras literárias. O preconceito era grande. A classe mais humilde era totalmente rejeitada e esquecida pela maioria.

A revolta de Victor Hugo sobre a desigualdade é tão nítida em várias partes da obra que chegamos a nos identificar demais, até porque são críticas atemporais. Infelizmente, podemos entender muitos dos seus desapontamentos nos dias atuais.

“A parte inferior da civilização, sendo mais profunda e mais sombria, acaso é menos importante que a parte superior? Conhece-se bem a montanha quando não se conhece a caverna?”

Aqui também vemos o amor de Marius e Cosette dar mais um passo. A forma que Victor Hugo escreve sobre o romance o torna muito gostoso de ler. “O amor verdadeiro é luminoso como a aurora e silencioso como o sepulcro.”.

A exaltação da mulher é grande na obra inteira, e isso não é diferente nessa parte. “A mulher sente e fala com o suave instinto do coração, essa infalibilidade. Ninguém sabe, como uma mulher, dizer coisas ao mesmo tempo doces e profundas. Doçura e profundidade, eis tudo o que é a mulher; eis tudo o que é o céu.”

Além de cogitar sobre a mulher, a sensibilidade que o autor tem a respeito das crianças e dos idosos também é outro ponto muito relevante.

“A miséria de uma criança interessa a uma mãe, a miséria de um rapaz interessa a uma jovem, a miséria de um velho não interessa a ninguém.”

Continuando o Motim de junho de 1832, essa quinta parte encerra a obra de forma magnífica. Cada personagem que trilha a história é retomado, emocionando o leitor profundamente.

Essa parte abordou a determinação, a entrega, a fé, a resiliência, a solidão, o perdão, e, acima de tudo, o amor em sua forma mais pura.

Mais uma vez, o autor francês enalteceu a mulher. "Todos os nossos heroísmos provêm de nossas mulheres. Um homem sem mulher é como uma pistola sem gatilho; é a mulher que faz o homem disparar."

Também percebemos um grande respeito quanto a intimidade sexual quando Victor Hugo nos diz o seguinte: "A rigor, podemos introduzir o leitor em um quarto nupcial, mas não em um quarto virginal. O verso apenas o ousaria, a prosa não deve fazê-lo." 

"Amar ou ter amado é o bastante. Não peçam mais nada depois. Não há outra pérola que se possa encontrar nas dobras obscuras da vida. O amor é uma realização."

"Quando se ouve a voz de quem se ama, não é preciso entender as palavras que dizem."

Um personagem que reaparece nessa parte e ganha simpatias foi o avô de Marius, Sr. Gillenormand. Sim, aquele mesmo que maltratava o neto! A forma que o autor coloca as falas e os pensamentos do Sr. Gillenormand é genial. Ele é a verdadeira prova de que nem todos conseguem demonstrar seu verdadeiro sentimento. 

O bloqueio que o  Sr. Gillenormand tinha para dizer ao neto como sentia sua falta e como o amava era gigante. Perceber isso em  suas falas e seus pensamentos antagônicos traduzem uma mistura enorme de sensações.

"Os filósofos dizem: "Moderem seus prazeres". E eu digo: "Soltem as rédeas de suas alegrias. Apaixonem-se como dois diabinhos. Sejam impetuosos". Os filósofos dizem disparates. Eu gostaria de fazer sua filosofia voltar-lhes goela abaixo." [Gillenormand - Os Miseráveis]

Ao se deparar com a solidão e a falta de amor, o Sr. Gillenormand, já com mais de noventa anos,  se transformou em uma nova pessoa. Amoroso, radiante, feliz e de bem com a vida, ele se tornou um dos meus personagens favoritos... depois do Bispo Bienvenu e do Jean, é claro!

"Morrer não é nada; horrível é não viver."

Marius se recupera e vai se casar com Cosette. Valjean transfere toda sua fortuna para a moça. Todos estão felizes agora, pois não estamos falando de apenas um bem material: ela seria transformada em Baronesa. Valjean pede para se afastar de Cosette que, segundo suas avaliações, este afastamento não precisaria acontecer. Cosette não entende o motivo, mas procura atender ao pedido.

Esta obra é uma poderosa denúncia a todos os tipos de injustiça humana. Narra a emocionante história de Jean Valjean, isto é, o homem que, por ter roubado um pão, é condenado a dezenove anos de prisão. Os miseráveis é um livro inquietantemente religioso e político.

A justiça social brasileira surge no ordenamento jurídico nacional como norma regente dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e visa a garantir a todos existência digna, sob a égide dos princípios constitucionais e normas programáticas das ordens econômica e social.

Justiça social como termo jurídico expresso aparece textualmente na Constituição Federal do Brasil de 1988 nos artigos 170 e 193 que tratam respectivamente da Ordem Econômica e da Ordem Social, dessa forma fica latente que o Poder Constituinte Originário inseriu a justiça social como objetivo programado permanente para o Estado Brasileiro, os exercentes dos poderes legislativo, executivo e judiciário inclusive, que devem implementar políticas públicas efetivas e eficientes para implementá-la.

Espera-se que o ordenamento jurídico de um Estado Democrático de Direito que se estruture os princípios e ordens essenciais que objetivem a organização estatal e a estabilidade e harmonia sociais.

Os ideais objetivados no texto constitucional, extraídos destarte em seu preâmbulo para a sociedade brasileira são a fraternidade, o pluralismo, a inexistência de preconceitos, o fundamento da harmonia social e o comprometimento, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

A palavra “ordem”, como ato de indicar com autoridade de que modo se devem fazer ou dispor as coisas, aparece pela primeira, de dezenas de vezes na senda gramatical da Lei Maior, justamente no preâmbulo, indicando que o comprometimento da sociedade brasileira, buscado pelo Poder Constituinte

Originário, deve ser com a ordem interna e internacional, como nação responsável também pela normalidade mundial.

O Estado Democrático de Direito do nosso país possui fundamentos como a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político.

A República Federativa do Brasil, isto é, a organização política governamental, tem como objetivos fundamentais, que devem ser buscados sistemática e programaticamente, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, garantia do desenvolvimento nacional, erradicação da pobreza e da marginalização, redução das desigualdades sociais e regionais, e promoção do bem de todos, sem preconceitos e discriminação (art. 3º da Constituição Federal de 1988).

A ordem econômica nacional é fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa e tem a finalidade de assegurar a todos existência digna (art. 170 da Constituição Federal brasileira de 1988). E, a ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais (art. 193 da Constituição Federal brasileira de 1988). Tanto a ordem econômica quanto a social têm como finalidades precípuas a justiça social.

As ordens social e econômica de aparência frágil diante de reformas legislativas que se propõem a solucionar os problemas sociais e econômicos, mas que as recentes experiências têm apontado para o contrário. Pois, não resolvem de fato e, ainda, criam ou potencializam outros problemas emblemáticos.

Foi assim que ocorreu com a recente reforma trabalhista[5] implementada em 2017 e, também com a recente reforma da previdência social de 2019 que também segue o mesmo destino por faltar coerência teórica, científica e conhecimentos basilares mínimos[6].

Na medida que as ordens econômica e social são na verdade uma só, ou seja, são interdependentes, formando a ordem socioeconômica, é preponderante entender que se houver intervenção estatal negativa na Ordem Econômica, os efeitos negativos sentidos pela Sociedade serão econômicos e sociais, assim como se houver intervenção estatal negativa na Ordem Social, os efeitos negativos sentidos pela Sociedade serão econômicos e sociais. E, o que ocorre de positivo uma favorece a outra e ambas têm proveitos.

E, por isso, a Ordem Jurídica do Estado Democrático de Direito pondera as demais ordens nacionais para se evitar desequilíbrio sistêmico e para se preservar a sociedade de danos socioeconômicos, o que inviabilizaria a justiça social e afetaria a dignidade das pessoas de prejuízos evitáveis ou preveníveis, cabendo ao legislador cautelas, zelos e análises acertadas e assertivas nas alterações legislativas que afetarem as ordens econômica e social.

A justiça social é sinônimo de justiça distributiva ou justiça equitativa. Busca-se materializar a máxima aristotélica de "tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais, na medida de suas desigualdades” absorvida elo princípio jurídico da igualdade ou isonomia onde aplicam-se a igualdade e proporcionalidade para estabelecer-se a justiça distributiva, observando universalidade e peculiaridades consonantemente.

O termo "justiça social" consta expressamente na Constituição brasileira de 1988 em duas incidências, no caput do artigo 170 que trata dos princípios gerais da atividade econômica e no artigo 193 que trata das disposições gerais da ordem social.

São os ditames da justiça social[7] que devem conformar a existência digna de todos objetivada pela ordem econômica, a valorização do trabalho e da livre iniciativa. A mesma justiça social determina direitos sociais que visem a garantia da melhoria contínua da condição social de trabalhadores urbanos e rurais. (art. 7º Constituição Federal).

Portanto, presente no primado do trabalho no vasto elenco de benefícios sociais, a justiça social também performa a seguridade social. É o primado do trabalho a base da ordem social que objetiva para a Sociedade o bem-estar e justiça social.

A concretização de direitos sociais é correspondente a justiça distributiva fomentada pelo implemento de políticas públicas.

O Estado brasileiro busca então estruturar socialmente, por meio de políticas públicas inclusivas e programas contributivos ou não, a justiça social para que todos os indivíduos tenham amparo e, a sociedade tenha o equilíbrio socioeconômico alcançado pela distribuição ou gestão de recursos auferidos pela tributação ou contribuição, promovendo assistências, atendimentos e prestações de benefícios e serviços, nas formas universal, securitária ou seletiva.

As políticas públicas[8] são medidas criadas pelos governos para garantir direitos, assistência ou prestações de serviços à população. O objetivo é assegurar que a população tenha acesso aos direitos garantidos pela lei.

Essas medidas são uma parte importante da administração pública, já que representam planejamentos dos governos e são criadas para melhorar a sociedade e atender necessidades dos cidadãos.

As políticas públicas também são uma forma de ajudar a diminuir desigualdades sociais que existam em um país e podem ser usadas como uma ferramenta de inclusão social.

As políticas públicas são divididas em quatro tipos, de acordo com os objetivos e a área de influência das medidas. Esta é a classificação mais utilizada para as políticas públicas. Foi criada pelo cientista político Theodore Lowi (1931-2017), que fez importantes pesquisas sobre o tema.

As políticas redistributivas possuem um caráter social, são voltadas à garantia do bem-estar social. Em geral, são aplicadas a grupos maiores de pessoas, com o objetivo de trazer benefícios e mais igualdade ao seu público-alvo.

São políticas utilizadas para organizar o funcionamento do Estado e podem envolver regras relativas a processos burocráticos ou normas de comportamento dos cidadãos. São mais abrangentes, pois podem ser direcionadas a muitas pessoas. Isto é, ao contrário das anteriores, não são relativas somente a determinados grupos de pessoas.

Políticas Constitutivas

Essas medidas são diferentes das demais pois, regulamentam os procedimentos e as regras relativas às próprias políticas públicas em aspectos como: forma correta de elaboração das políticas públicas e a determinação de quem são os responsáveis pela elaboração das medidas.

A forma da assistência estatal em matéria de saúde é universal, em matéria previdenciária assume forma securitária do Seguro Social de trabalhadores e na assistência social, assume a forma seletiva ao buscar atender aos mais pobres e necessitados, impossibilitados de trabalhar por deficiências ou por falta de aproveitamento de oportunidades laborativas por inexistência ou desqualificação.

Lembremos que a Constituição Federal brasileira é a ordem jurídica fundamental e sobre essa ordem, ergue-se todo o ordenamento jurídico. E, também todas as ordens.  E, nesse sentido, as ordens econômica e social são ordenadas pela ordem jurídica. Elementar que em um Estado Democrático de Direito[9], tudo ou as essências gerais e fundamentos estatais estejam ordenados juridicamente para a comunidade ou sociedade tenha parâmetros.

A primazia da justiça social é o trabalho e a ordem pública, tanto a econômica quanto a social. Sem trabalho, não existirá a justiça social e nem tão pouco ordem. Ordens econômica e social sustentam-se com atividades laborativas de trabalhadores e atividades econômicas empresárias, tuteladas pela ordem estatal que permeia, entrelaça-se e complementa as lacuna em busca de distributividade e garantias de direitos fundamentais.

A finalidade da ordem econômica é assegurar a dignidade das pessoas e tem por fundamento a valorização do trabalho humano e da livre iniciativa empresarial, respectivamente direitos sociais e econômicos. (art. 170, Constituição Federal brasileira de 1988)

O primado do trabalho é a base da ordem social. Os objetivos da ordem social são o bem-estar social e a justiça social. Bem-estar social é a harmonia da sociedade, justiça social é a dignidade das pessoas na sociedade. (art. 193, Constituição Federal)

E quando as atividades empresárias e laborativas não são suficientes para garantia das ordens econômica e social? Quando não há pleno emprego? Quando não há igualdade de oportunidades? Quando existe pobreza ou quando as pessoas são acometidas por infortúnios sociais diante de tantos riscos existentes?

A seguridade social implementa e complementa o que o primado do trabalho não é suficiente para garantir por sua própria geração: a plenitude da ordem social.

Quando não é possível apenas pelas atividades laborativas e empresárias garantir-se a dignidade e demais condições sociais, o sistema securitário estatal deve preencher as lacunas, dos mais pobres e dos trabalhadores empregados ou autônomos, dentre tantos que possam precisar da segurança social dada pelo Estado. Se há um “Pacto Social”[10] em que todos são sócios desse Estado, para oferecer tributos e contributos, também devem ser sócios para ter direitos e garantias sociais.

Alude o art. 194 da Carta Magna vigente que um conjunto de ações integradas dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e de ações da Sociedade devem garantir direitos à saúde, à previdência e à assistência social, ou seja, o macrossistema é estatal, mas a Sociedade também está inserida como atora junto com os Poderes Públicos para o asseguramento da seguridade social.

A seguridade social é sustentada por três pilares: a Previdência Social, a Saúde Pública e a Assistência Social. Na seguridade social brasileira há direitos derivados e dependentes do trabalho, direitos de caráter universal do sistema único de Saúde e direitos seletivos da Assistência Social.

O primado do trabalho e Seguridade Social além de garantirem a ordem social auxiliam na sustentação da ordem econômica na medida que há um ciclo de renda ou ganhos, advindos do trabalho ou da seguridade social, alinhado com ciclo de consumo e fomento direto da economia, promovendo lucros econômicos e sociais para o Estado.

As normas programáticas[11] são aquelas que determinam os princípios que esquematizam a atuação executiva, legislativa e judiciária. Politicamente, consubstanciam a interatividade entre as forças políticas contrárias.

O Poder Constituinte, após período de exceção de três décadas sem eleições diretas para o cargo máximo do Poder Executivo (1964-1985) e de várias imposições de governos militares, exílios políticos, conflitos ideológicos e até armados, anistia aos excessos cometidos de todos os lados e muitos interesses em voga, a construção da Constituição Federal brasileira de 1988 não poderia ser diferente: conciliação de várias ideias e concepção de programas para construção de um país que erradicasse desigualdades e toda sorte de empecilhos para a construção da harmonia social.

No ordenamento jurídico brasileiro, as forças políticas nacionais construíram democraticamente a superação de conflitos ideológicos ou de interesses diversos por meio de normas programáticas surgidas como reflexos desses conflitos. (Souza, 2005, p. 24)

As normas programáticas são permanentemente vinculativas, impositivas, diretivas e limitadoras, censurando atos que as contrariem. As ações dos ocupantes e exercentes de órgãos e cargos dos poderes executivo, legislativo e judiciário devem seguir aos programas estatais definidos pelas normas programáticas. (CANOTILHO, 1994, p. 315.)

De acordo com José Afonso da Silva (1998) que define as normas constitucionais programáticas como princípios para serem cumpridos pelos Poderes Públicos:

Normas constitucionais programáticas são normas constitucionais através das quais o constituinte, em vez de regular, direta e imediatamente, determinados interesses, limitou-se a traçar-lhes os princípios para serem cumpridos pelos seus órgãos (legislativos, executivos, jurisdicionais e administrativos), como programas das respectivas atividades, visando à realização dos fins sociais do Estado. (SILVA, 1998, p. 138.)

O Ministro Barroso (2001), embora enfoque nessa obra no controle de preços, alude questões importantes, de forma didática, ao que tange à Ordem Econômica, à livre iniciativa e ao Mercado e seus pressupostos.

Pondera diversos princípios constitucionais e doutrinários, enfatiza especialmente os princípios da Ordem Econômica e os limites intervencionistas do Estado, onde a intervenção não é regra, mas exceção em situações extremas e anormais, por tempo limitado, se razoável, para restabelecimento da normalidade, do contrário seria ilegítimo.

As ordens econômica e social são normas programáticas interdependentes para que haja harmonia socioeconômica, com abrangências e limites específicos.

A idealização de ordem para desenvolvimento do país vem desde os primórdios do Brasil republicano, ideia que se aduz da análise iconográfica da bandeira nacional, atendo-se na expressão “Ordem e Progresso”, lema político positivista abreviado daquele cunhado notavelmente pelo filósofo francês Auguste Comte[12]: "O Amor por princípio e a Ordem por base; o Progresso por fim".

Se a ordem deve ser a base do progresso ou desenvolvimento, temos na ordem jurídica os programas ou previsões de outras ordens, como a ordem pública, a ordem constitucional, a ordem econômica e a ordem social.

O Estado e a iniciativa privada são agentes da ordem econômica. A valorização do trabalho e a livre iniciativa estão vinculados à ordem econômica e aos seus agentes, conforme afirma Luís Roberto Barroso 2001:

        “A ordem econômica, em particular, e cada um de seus agentes - os da iniciativa privada e o próprio Estado - estão vinculados a esses dois bens: a valorização do trabalho [e, a fortiori, de quem trabalha,] e a livre iniciativa de todos - que, afinal, também abriga a ideia de trabalho -, espécie do gênero liberdade humana”. (BARROSO, 2011, pág. 3)

As ordens econômica e social equalizadas pelos ditames da justiça distributiva nas doses certas podem equilibrar os interesses do capitalismo e as necessidades sociais da população. A harmonização da pluralidade de interesses é compatibilizada pelo princípio da economicidade do Direito Econômico, estabelecendo vantagens e limites bidimensionais, ou seja, há vantagens e limites dos interesses do Capital e do Social, conforme afirma Marcelo Barroso Lima Brito de Campos (2011), ao cogitar de livre iniciativa e valorização do trabalho: A livre iniciativa e a valorização do trabalho humano é um exemplo de necessária harmonia de modo a impedir que haja sucumbência recíproca desses princípios ou prevalência de uma economia meramente de mercado ou um socialismo exacerbado de modo a sufocar a propriedade particular dos meios de produção. (CAMPOS, 2011, p. 267).

A justiça social brasileira construída pelo Ordenamento Jurídico foca nas ordens econômica e social como norma regente dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e visa a garantir a todos existência digna.

Atualmente as críticas e ações políticas neoliberais ameaçam estruturas jurídicas e legislativas construídas pelo diálogo democrático e embates de interesses diversos que deram lugar às normas programáticas que contemplam o ideal do Poder Constituinte Originário de construção de uma sociedade livre, justa e solidária e a diminuição das desigualdades sociais e regionais, dentre outros objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil.

Os esforços do legislador em determinar normas programáticas vinculativas e impositivas aos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário para controle da livre inciativa e base para o primado do trabalho, ambas objetivando a justiça social, não se restringe a ideologias, mais que isso, trata-se de inteligência política para se alcançar melhores resultados e estabelecer equilíbrio.

Ao estudar a Justiça Social em suas concepções pré-moderna e moderna, bem como as diferentes estratégias de positivação dos direitos fundamentais sociais, e, em linhas gerais, o direito ao desenvolvimento e a inclusão social[13], com intuito de configurar a Justiça Social nos nossos dias e no ordenamento jurídico brasileiro. Constatamos que o termo “Justiça Social”  está presente nos arts. 170 e 193 da Constituição Federal de 1988 e, alude às diferentes formas de positivação dos direitos sociais, no sentido de se condicionar o Estado à concretização do alcunhado mínimo vital que, à vista de oferecer uma inclusão social mínima - em matéria destes direitos sociais, tem por finalidade a observância do princípio da dignidade da pessoa humana, e, ademais, constitui base à igualdade e à liberdade reais entre os cidadãos, possibilitando o desenvolvimento pleno da sociedade brasileira.

Cumpre destacar que foi desenvolvida com extrema competência pelo Ministro do STF e Professor Dr. Luiz Edson Fachin, a Teoria do Estatuto Jurídico do Patrimônio Mínimo, que procura garantir um mínimo de patrimônio com base no ordenamento jurídico, ou seja, deve o indivíduo ter o mínimo existencial como forma de garantir-lhe a sua dignidade.

Esta teoria não tem o interesse de atacar a propriedade privada nem o direito creditício, mas afasta o caráter patrimonial das relações jurídicas privadas. O intuito é remodelar estes institutos e adequá-las às novas premissas do Direito Civil, determinando que os mesmos não se sobreponham à dignidade da pessoa humana[14].

Nas palavras de Fachin: “Em certa medida, a elevação protetiva conferida pela Constituição à propriedade privada pode, também, comportar tutela do patrimônio mínimo, vale dizer, sendo regra de base desse sistema a garantia ao direito de propriedade não é incoerente, pois, que nele se garanta um mínimo patrimonial.

Sob o estatuto da propriedade agasalha-se, também, a defesa dos bens indispensáveis à subsistência. Sendo a opção eleita assegurá-lo, a congruência sistemática não permite abolir os meios que, na titularidade, podem garantir a subsistência”. (FACHIN, 2001, pág. 232).

No que tange ao bem de família[15], a teoria do patrimônio mínimo é amparada pela Lei 8.009/90 (Lei da Impenhorabilidade do Bem de Família), sendo possível inferir-se que a proteção dos bens de família é a proteção do direito à moradia (art. 6º, da CFRB/88).(BRASIL, 1988).

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça, através da Súmula 364 consolidou entendimento de que o imóvel em que reside pessoa solteira, separada ou viúva constitui bem de família, sendo impenhorável. O STJ entende que, mesmo nos casos em que o imóvel pertence à pessoa jurídica, é possível conferir a ele a proteção como bem de família se ele é utilizado como residência pelos sócios.

Analisando a teoria do patrimônio mínimo e sua íntima relação com o princípio da preservação da pessoa humana e, com endosso de portentosa doutrina, os casos de aplicação concreta embasadas em jurisprudências e enunciados de súmulas dos tribunais superiores brasileiros, que indicam de forma definitiva e esclarecida como são tratados os cidadãos, principalmente, os lançados à miséria, o que revela uma afronta cruel aos direitos e garantias fundamentais previstas no atual e vigente texto constitucional brasileiro. “Os Miseráveis”, mais do que nunca, nos força refletir na relevância da atuação do Estado para torna digna a existência e sobrevivência de seu cidadão.

 

Referências

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BARBOSA, Jorge Luís; MAZIA, Marcos Vinícius Fiorin; LIMA, Vicente Beus Miranda. Uma Leitura Filosófico-Jurídica de "Os Miseráveis" de Victor Hugo. Disponível em: https://conccepar.grupointegrado.br/resumo/uma-leitura-filosoficojuridica-de-os-miseraveis-de-victor-hugo/480/787 Acesso em 06.11.2022.

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BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília. Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicaocompilado.htm Acesso em 06.11.2022.

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CAMPOS, Marcelo Barroso Lima Brito de. Os direitos previdenciários expectados dos servidores públicos titulares de cargos efetivos no paradigma do Estado Democrático de Direito Brasileiro. Belo Horizonte, 2011. 315 p.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. Coimbra: Coimbra Editora, 1994.

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. Volume 3. São Paulo: Saraiva, 1998.

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HUGO, Victor. Os Miseráveis. Série Reencontro. Adaptação de José Angeli. São Paulo: Scipione, 2005.

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TARTUCE, Flavio. Manual de Direito Civil: volume único. 7ª ed.  Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017.

 

 


[1] Entende-se por furto famélico, quem furta para saciar a necessidade atual, indispensável, grave e inevitável e, não apenas para alimentação, mas, igualmente, de saúde, higiene e, etc. As legislações abrandaram a punição ou excluíram a ilicitude de delitos como o furto famélico (quando a pessoa rouba "para comer"), como aconteceu no Brasil. No entanto, casos como o da mulher que ficou presa por cerca de 15(quinze) dias por furtar duas garrafas de refrigerante, dois pacotes de macarrão instantâneo e um pacote de suco em pó em um supermercado de São Paulo ainda acontecem.

 

[2] Victor-Marie Hugo, autor do livro Os Miseráveis, nasceu em 26 de fevereiro de 1802, em Ville de Besançon, ou Besanção ou ainda, Versanção, na região da Borgonha, noroeste da França, que tinha, em 2015, aproximadamente 116 mil habitantes. Sua morte ocorreu em 22 de maio de 1885, em Paris, capital do país. Além de Os Miseráveis, outra obra do autor ficou mundialmente conhecida: Notre Dame de Paris, mais popularmente conhecida como “O Corcunda de Notre Dame”.

[3] Originalmente sob o nome Notre Dame de Paris, o romance “O Corcunda de Notre Dame” foi teve sua primeira publicação em 1831, por Victor Hugo.  A obra é considerada o maior romance histórico do autor e se tornou popular no mundo todo, principalmente por conta de suas adaptações. Quasímodo cresceu em Paris, durante a época medieval. Ali, ele vive escondido como sineiro da catedral, uma vez que a sociedade o maltrata  e o rejeita. No contexto da trama, Paris estava tomada de cidadãos em situação precária e vivendo nas ruas. Apesar disso, entretanto,  não havia muita ação policial no local, apenas algumas patrulhas de guardas do Rei, acostumados a encarar os mais desfavorecidos com desconfiança.

[4] Na monarquia o chefe de Estado se mantém no poder durante toda a vida, ou até abdicar. Na república, o chefe de Estado é eleito democraticamente para um determinado período de tempo. Em uma monarquia, com exceção das monarquias eletivas, que não são tão comuns atualmente, a hereditariedade é um fator importante. No regime, os filhos dos monarcas são seus sucessores. Na república, novos chefes de Estado são eleitos pelo povo após um mandato que geralmente dura cerca de quatro ou cinco anos. Um monarca também recebe o título de rei ou rainha, príncipe ou princesa, grã-duque ou grã-duquesa, imperador ou imperatriz, entre outras denominações. Na república, o chefe de Estado é chamado de presidente da república. No caso da república presidencialista, o presidente ocupará a chefia do Estado e a do Governo. Entretanto, em uma república parlamentarista, o chefe de governo geralmente é chamado de primeiro-ministro. O presidente no parlamentarismo é visto como uma figura simbólica, de poderes limitados. Por isso, é um sistema bastante semelhante à monarquia constitucional, mas com troca de chefe de Estado após mandato de tempo definido.

[5] A Lei nº 13.467/2017 altera mais de uma centena de pontos da Consolidação das Leis do Trabalho e traz várias mudanças significativas que afetam as relações trabalhistas como um todo, além das relações sindicais e judiciais decorrentes de reclamatórias trabalhistas. A reforma garante aos trabalhadores terceirizados, quando os serviços forem executados nas dependências da empresa que contrata o serviço, as mesmas condições relativas. O texto exige que as tratativas sejam as mesmas, existindo uma corresponsabilidade. Terceirizar atividade-fim significa delegar a terceiros a execução de parte ou de toda a atividade principal da empresa, o que coloca em risco não só a qualidade dos serviços oferecidos, já que executados por trabalhadores que não são subordinados ao tomador, como também os direitos dos terceirizados, porque não terão os mesmos salários e benefícios dos empregados do tomador, mesmo quando exercerem as mesmas funções daquele.

[6] Ademais, a reforma trabalhista trouxe mudanças quanto à natureza salarial das verbas trabalhistas, acarretando o abatimento da arrecadação de natureza previdenciária. Apesar das reformas, há de se buscar formas de concepção de novos empregos dignos para conservar o sistema de seguridade social.

[7] "Essa ideia parte do princípio de que não é possível falar em desenvolvimento de uma sociedade considerando apenas o crescimento econômico. Nesse sentido, a noção de justiça social está atrelada à construção do que é chamado de Estado de Bem-Estar Social, isto é, um tipo de  organização política que prevê que o Estado de uma nação deve prover meios de garantir seguridade social a todos os indivíduos sob a sua tutela, o que significa que o acesso a direitos básicos e as ações de seguridade social devem ser estendidos a todos". "As cotas raciais, por exemplo, estão entre as ações mais recentes que buscam a justiça social. A ação fundamenta-se na constatação de que a grande maioria da população carente e em situação de pobreza é composta por negros e pardos. Em contrapartida, as escalas mais elevadas na hierarquia socioeconômica são majoritariamente compostas por pessoas que se identificam como brancas. Os dados do IBGE de 2010 mostraram que a taxa de analfabetismo entre as pessoas que se identificavam como brancas era de 5,9%, enquanto, entre a população de pessoas que se identificavam como negras, era de 14,4% e, entre os que se identificavam como pardos, de 13%. As ações que buscam facilitar a inserção da população em situação mais carente ou que possui o acesso à educação prejudicado são necessárias em virtude da desigualdade educacional e econômica que vitimiza o sujeito também em sua posição social, fato que torna cada vez mais rígida a escala social em que vivemos."

 

 

[8] No Brasil, as políticas são elaboradas pela análise das necessidades e pela participação dos cidadãos. Grande parte dos governos oferece a possibilidade de que as pessoas indiquem quais são as necessidades que consideram mais urgentes na sua região. A Lei Complementar nº 101/2000 determinou que, para garantir transparência na gestão, os governos devem incentivar os cidadãos a participar das audiências públicas que discutem as medidas. Os Estados e os municípios também fazem esse tipo de consulta. Para saber como participar, é preciso buscar informação junto aos governos regionais.

[9] O Estado Democrático de Direito é diferente do Estado de Direito pela soberania do que chamamos de “vontade geral”, conceito que é trabalhado pelo teórico  Rousseau em seu livro “O contrato social”. Sendo assim, a vontade geral é o atendimento do interesse comum da sociedade, obtido por meio do consenso das partes. Contudo, cabe aqui uma diferenciação importante: a vontade geral não é sinônimo de vontade da maioria ou de todos. Isso porque a vontade da maioria é uma simples  soma numérica de vontades particulares que não reflete o uso da razão. Um exemplo que torna isso mais visível é o que aconteceu no holocausto: mesmo que a maior  parte dos alemães estivesse em comum acordo com Hitler, suas atitudes não atendiam à vontade geral, pois não eram esclarecidas pela razão. Dessa forma, o Estado Democrático de Direito é uma forma de Estado em que a soberania popular é fundamental. Além disso, é marcado pela separação dos poderes  estatais, a fim de que o legislativo, executivo e judiciário não se desarmonizem e comprometam a soberania popular. Outro ponto importante que caracteriza  essa forma de Estado é o respeito aos Direitos Humanos que são fundamentais e naturais a todos os cidadãos.

[10] O contrato social é fundamentado em um pacto convencional, por meio do qual os cidadãos, em condições justas, renunciam a seus direitos individuais e consentem com o poder de uma autoridade na qual depositam confiança. O Estado, resultante desse acordo tem o dever de proteger os cidadãos. Para Hobbes, os homens precisavam de um Estado forte, pois a ausência de um poder superior resultava na guerra. O ser humano, que é egoísta, se  submetia a um poder maior, somente para que pudesse viver em paz e também ter condição de prosperar. Não por acaso, Hobbes chama o "Estado" de Leviatã, um dos nomes que o diabo recebe na Bíblia, com o propósito de reforçar que é a natureza perversa  do homem que o faz buscar a união com outros homens. O Estado, por sua parte, terá o dever de evitar conflitos entre os seres humanos, velar pela segurança e preservar a propriedade privada. Segundo Locke, o homem vivia num estado natural onde não havia organização política, nem social. Isso restringia sua liberdade e impossibilitava o desenvolvimento de nenhuma ciência ou arte. O problema é que não existia um juiz, um poder acima dos demais que pudesse fiscalizar se todos estão gozando dos direitos naturais. Então, para solucionar este vazio de poder, os homens vão concordar, livremente, em se constituir numa sociedade política organizada. O homem poderá influir diretamente nas decisões políticas da sociedade civil seja através do exercício da democracia direta ou delegando a outra pessoa seu poder de decisão. Este é o caso da democracia representativa, na qual os cidadãos elegem seus representantes. Ao contrário de Hobbes e Locke, Rousseau vai defender que o homem, no seu estado natural, vivia em harmonia e se interessava pelos demais. Para Rousseau,  a vida numa sociedade em vias de industrialização não favoreceu os homens no seu aspecto moral. À medida que o desenvolvimento técnico foi ganhando espaço, o ser humano se tornou egoísta e mesquinho, sem compaixão pelo seu semelhante. Por sua vez, a sociedade tornou-se corrupta e corrompia o ser humano com suas exigências para suprir a vaidade e o aparentar daquela sociedade. Assim era preciso que surgisse o Estado a fim de garantir as liberdades civis e evitar o caos trazido pela propriedade privada. As ideias de Rousseau serão aproveitadas por vários participantes da Revolução Francesa e também, posteriormente, ao longo de todo século XIX pelos

teóricos do socialismo.

 

 

 

 

[11] As normas programáticas são "... aquelas em que o constituinte não regula diretamente os interesses ou direitos nela consagrados, limitando-se a traçar princípios a serem cumpridos pelos Poderes Públicos (Legislativo, Executivo e Judiciário) como programas das respectivas atividades, pretendendo unicamente à consecução dos fins sociais pelo Estado" (Maria Helena Diniz, Dicionário Jurídico, Saraiva, São Paulo, 1998, vol. 3, pág. 371).

[12] Isidore Auguste Marie François Xavier Comte (1798-1857) foi filósofo francês que formulou a doutrina do Positivismo. Sendo considerado o primeiro filósofo da ciência no sentido moderno do termo. E, também é visto como o fundador da disciplina acadêmica de Sociologia. Influenciado pelo socialista utópico Henri de Saint-Simon, trabalhou intensamente na criação de uma filosofia positiva como tentativa de remediar o mal-estar social da Revolução Francesa, criando uma doutrina social baseada nas ciências. Comte foi uma grande influência no pensamento do século XIX, influenciando o trabalho de intelectuais sociais como  Karl Marx, John Stuart Mill e George Eliot. Seu conceito de sociologia e evolucionismo social deu o tom para os  primeiros teóricos sociais e antropólogos, como Harriet Martineau e Herbert Spencer, evoluindo para a moderna  sociologia acadêmica apresentada por Émile Durkheim como pesquisa social prática e objetiva. As teorias sociais de Comte culminaram em sua "Religião da Humanidade", que pressagiava o desenvolvimento de organizações humanistas e humanistas religiosas não teístas no século XIX. Comte cunhou o significado da palavra altruísmo. As ideias de Comte influenciaram as palavras Ordem e Progresso, lema da República Federativa do Brasil.

 

[13] "Inclusão social é o ato de incluir na sociedade categorias de pessoas historicamente excluídas do processo de socialização, como negros, indígenas, pessoas com necessidades especiais, homossexuais, travestis e transgêneros, bem como aqueles em situação de vulnerabilidade socioeconômica, como moradores de rua e pessoas de baixa renda." "Historicamente, alguns grupos sociais ficaram à margem do processo de socialização, não tendo o devido acesso a direitos como educação, emprego digno, moradia, saúde e alimentação adequada. Para resolver esse problema, os governos passaram a criar, a partir do século XX, medidas de inclusão das camadas marginalizadas da população na sociedade."

 

[14] Interessante é observa a crítica de Victor Hugo, não podemos criar um direito penal do inimigo, voltado para punição daquele que delinque, como presente na obra onde personagem ex-presidiário, é considera um inimigo do estado, e por isso não lhe é garantido qualquer tipo de garantia. Nesse sentindo, analisando a obra com perspectivas atuais, verifica-se a eficácia das penas alternativas, na busca de uma punição proporcional e em uma ressocialização concreta.

[15] O bem de família pode ser conceituado como o imóvel utilizado como residência da entidade familiar, decorrente de casamento, união estável, entidade monoparental, ou entidade de outra origem, protegido por previsão legal específica.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 06/12/2022
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