Resumo: O texto aborda a ordem de Rui Barbosa de queimar arquivos referentes a escravidão no Brasil.
Palavras-Chave: Rui Barbosa. Escravidão. Lei Áurea. República brasileira. Encilhamento.
Sem dúvida, é uma das maiores polêmicas da etapa republicana do país. Para responder o questionamento indigesto que é: Por que Rui Barbosa mandou queimar os arquivos comprometedores sobre a escravidão?
Indubitavelmente, o advogado, jurista e ex-ministro Rui Barbosa representa um dos mais relevantes homens da história brasileira. E, lutou pela abolição da escravatura. Foi Senador e representou o Brasil na Conferência de Paz de Haia. Era poderoso orador e, em verdade começou a treinar discursos ainda muito jovem, apoiado em caixotes de madeira. Em Haia[1], ficou célebre pela alcunha de "Águia" devido ao seu olhar apurado e certeiro.
Também foi ministro da Fazenda de Deodoro da Fonseca, bem na origem da república brasileira. Foi exatamente em 14 de dezembro de 1890 determinou que fossem queimados os livros de matrícula, de controle aduaneiro e de recolhimento de impostos incidentes sobre a escravidão. Houve vozes contrárias ao gesto, foi o caso do Deputado Francisco Coelho Duarte Badaró que considerou um grave atentado à memória nacional. Tal atitude gerou sérias dificuldades para se entender o passado dos escravos, sobre a composição de quilombos, e expressiva parte da composição da sociedade brasileira.
Essa reminiscência sinistra foi trazida a Nina Rodrigues[2] que responsabilizou Rui Barbosa pela queima dos documentos relativos à escravidão que estavam nas repartições públicas submetidas ao Ministério da Fazenda, logo após a proclamação da República.
Como ministro, Rui vivenciou a crise financeira do encilhamento[3], uma bolha inflacionária que tanto marcou o início a república. Tal ordem se materializou por despacho datado de 14.12.1890 e, cumprido por circular datada de 13 de maio de 1890. Na época, o executor da ordem fora o seu então sucessor no ministério da Fazenda[4], Tristão de Alencar Araripe.
No documento, o político e jurista chamava a escravidão de "instituição funestíssima que por tantos anos paralisou o desenvolvimento da sociedade e infeccionou-lhe a atmosfera moral ". E, dizia ainda, que a república era "obrigada a destruir esses vestígios por honra da pátria e em homenagem aos deveres de fraternidade e solidariedade para com a grande massa de cidadãos que a abolição do elemento servil entrara na comunhão brasileira."
Quem melhor analisou e pesquisou tal assunto foi Américo Jacobina Lacombe que aliás, argumentou em favor da memória de Rui Barbosa[5]. Consta também que Gilberto Freyre teria igualmente imputado a Rui Barbosa a responsabilidade pela destruição de tais documentos feita em total desprezo à memória brasileira.
Há bem mais em jogo nesse enigma da historiografia. Aliás, como ressaltou Lacombe, a queima dos arquivos da escravidão traz um pesado toque de escândalo em nossa história cultural.
Tais documentos eram comprovantes de natureza fiscal que poderiam ser usados pelos ex-senhores de escravos para pleitear a indenização junto ao governo republicado. Tanto que no grupo de escravocratas, já se auto-identificava como os indenezistas, pois pretendia receber da jovem república uma substanciosa indenização pela perda de escravos e das respectivas rendas, hipotecas e garantias, cuja a causa fora a abolição assinada pela Princesa Isabel.
Na época, Rui chegou a negar o pedido de indenização. E, narra-se que tal grupo de escravocratas indenezistas teria solicitado subvenção da república brasileira para um banco encarregado de indenizar ex-proprietários de escravos e seus sucessores dos prejuízos experimentados pela Lei Áurea, de 13 de maio de 1888.
E, Rui de forma seca e direta respondera, in litteris: "mais justo e melhor se consultaria o sentimento nacional se se pudesse descobrir meio de indenizar os ex-escravos não onerando o tesouro", tal resposta data de 11 de novembro de 1890 e, valeu-se, ainda Rui de um diploma emblemático oferecido pela Confederação Abolicionista que ainda funcionava[6].
Nessa toada, a que fora justificada pela necessidade de apagarmos a nódoa horrível de nossa história e, também pela justificativa instrumental, privando de documentos necessários à instrução necessária de processos indenizatórios. Dessa forma, Rui procurou reservar o Tesouro, minar a litigância bem como obter elogios pela atitude que era na ocasião tachada de liberal e humanitária.
O simbolismo e os gestos libertários estavam na moda, tanto que justamente porque nossa inércia em resolver efetivamente o problema da escravidão proscrita, ou seja, protegendo e qualificando e libertando de fato e, somente, de direito, os beneficiários da Lei Áurea.
Sua ordem também é justificável pelo contexto que vivenciou, quando a grave ameaça reacionária era constante. E, parece esquecer que Rui em sua trajetória política e intelectual lutou bastante em prol do abolicionismo. Erradicar, para sempre, uma "mancha negra" da história do Brasil.
Este tem sido, durante anos, o clichê exaustivamente repetido para explicar a queima dos papéis de registro da escravidão ordenada por Rui Barbosa enquanto Ministro da Fazenda[7] e levada a cabo por seu sucessor na pasta. De tão propalada, esta versão tem contribuído para sedimentar uma série de incorreções, preconceitos e injustiças históricas.
É preciso lembrar que um intelectual como Rui Barbosa jamais seria ingênuo a ponto de acreditar que a destruição física de documentos depositados no Ministério da Fazenda fosse suficiente para apagar da memória nacional a infâmia de quatro séculos de escravidão.
A noção política de história oficial para o Brasil e para os diferentes grupos raciais tem sua origem em 1838 quando o Instituto Histórico e Geográfico brasileiro fora criado com o fito de oferecer ao Brasil independente um passado glorioso e de futuro promissor, com o que legitimaria o poder do Imperador.
Aliás, o naturalista Von Martius[8] escreveu e apresentou a monografia intitulada "Como se deve escrever a história do Brasil" e que definiu o paradigma de construção da história brasileira. Assim, a história teria que incorporar as três raças, dando predominância ao português, o conquistador e senhor que assegurou vasto território e ainda imprimiu as marcas morais ao país.
O país foi o último a abolir a escravidão. as, foi com a obra “Casa Grande e Senzala”, da década de 1930 por fixar a falsa ideia da existência de dois modelos explicativos ideais quanto à questão racial (fulcrado no conflito, o norte-americano e, outro, na integração, o brasileiro) e assim veio adquirir ares definitivos de cientificidade. (In: IANNI, Octávio. Escravidão e racismo. São Paulo: Hucitec, 1988 p;126-139).
Aliás, o mito da democracia racial apoiado na dupla mestiçagem biológica e cultural entre as três raças originárias, tem penetração profunda na sociedade brasileira; exalta a ideia de convivência harmoniosa entre os indivíduos de todas as classes sociais e grupos étnicos, permitindo às elites dominantes dissimular as desigualdades. Impedindo aos oprimidos que tomassem consciências dos inúmeros e sutis mecanismos de exclusão da qual são vítimas.
Com a ideia de pluralismo pretende-se pressupor e aceitar a aniquilação das diferenças e, ao mesmo tempo, encerra a diferença no âmbito social-natural e privado, afastando-o do plano político e jurídico. Desta forma, e mais uma vez, negros e indígenas são remetidos ao plano da natureza, totalmente alheio ao espaço da política.
Quanto ao polêmico caso da queima de arquivos da escravidão, esboça-se a tese de que a ignorância sobre o passado, constitui um dos elementos determinantes da cultura brasileira e, de que ela não foi natural, mas sim, induzida pelo cerceamento da liberdade de expressão.
Apesar da referida queima de arquivos, não se conseguiu apagar a mancha da escravidão feita a sangue, suor e lágrimas no Brasil, e subtraiu das gerações futuras a possibilidade de estudar a fundo a memória do país, o que as impediria, ipso facto, de estudar aprofundadamente a memória pátria, deixando emergir um forte e pesaroso legado: o da ignorância.
O Brasil possui toda uma carga histórica de escravização dos negros e dos índios, bem como foram registrados os infelizes episódios nos quais se cultivara, especialmente por grupos discriminatórios da região sul, um ódio aos nordestinos, o que chegou até mesmo a dar ensejo a uma ridícula e absurda proposta separatista. (In: BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Crime de Racismo e Antissemitismo: um julgamento histórico no STF, habeas corpus n.º 82.424/RS. Brasília: STF, 2004. p.181).
Efetivamente, o que ocorreu o contrário, pois os senhores de escravos no Brasil, com sua adesão a uma política de adiamento do fim da escravidão: implementaram uma política de reorganização da definição de propriedade, com a Lei de Terras (1850) que impedia que novas forças sociais fossem capazes de enfrentar, no mercado, sua incompetência produtiva, o que lhes garantiu tranquilo mascaramento de propriedades territoriais subutilizados como sendo supostamente modernas e produtivas.
Conclui-se que houve a indenização aos escravocratas pela ingerência do Estado na perpetuação hereditária da propriedade que já tinha gênese estatal, pois resultava de doações feitas pelo Estado colonial e nacional.
Aliás, a prática de doar terras públicas, indígenas e quilombolas, se manteve ativa, até a Constituição Federal de 1988. Quando então, passou a integrar a estratégia de politização administrativa de regularização de terras dessas comunidades.
Portanto, as indenizações foram dadas através de privilégios políticos no gerenciamento e expropriação da propriedade privada, além de que se implementou a política fiscal-tributária de subsídios para garantir a lucratividade de suas propriedades.
Inaugurou-se, assim, uma extensa política fiscal de subsídios, favores, isenções, créditos e parcelamentos. Logo, os escravocratas foram indenizados pela indenização pela exploração de mão de obra livre que era escravizada legalmente.
A reiterada prática de expropriação da mão de obra tornou a exploração capitalista e mais perversa ideologicamente do que a escravidão, e passou a compor o marco jurídico de não atribuição e reconhecimento de direitos trabalhistas para os trabalhadores rurais e domésticos, ou até mesmo, de tratamento diferenciado, que sobreviveu até mesmo na Constituição brasileira de 1988.
A ideia de queima de arquivos, ao afirmar a finalidade de “impedir a indenização”, apaga a disputa política existente em torno das matrículas e das indenizações. O argumento da ilegalidade da escravidão e a dívida para com os escravos esteve na consciência política de parte do movimento abolicionista.
Joaquim Nabuco foi consciente de que a “escravidão era um Crime contra a Humanidade”, muito antes que o termo fosse utilizado para descrever os horrores da Segunda Guerra.
A afirmação de que apenas se intentava apagar os rastros deixados para indenização dos senhores oculta a disputa política e a estratégia de favorecimento dos senhores.
Apaga-se especialmente o conflito social que a exploração ilegal do trabalho humano o que provocava e, obviamente, a responsabilidade dos republicanos que fizerem previamente a opção por não indenizarem os escravos ilegais pelo seu trabalho.
Mas, é preciso pensar um pouco mais na palavra “arquivo”. Tal palavra remete a uma forma de organizar elementos, ou melhor, de constituir “algo” como elementos a partir de uma organização. O arquivo, portanto, não apenas recolhe e reconhece um dado elemento existente “na” história.
O arquivo materializa e confere operacionalidade a uma verdade. Ou seja, o arquivo constitui-se com base em uma dada concepção histórica sobre a História.
O episódio da queima das matrículas remete a um tipo de valorização do meio de prova: o documento com fé pública (peça móvel, escrita, reconhecida por um funcionário etc.). Logo, não haveria nenhuma verdade mais autêntica do que aquela que a burocracia legitima (muito embora se saiba que as declarações de propriedade eram falsas).
Paradoxalmente, apesar do apelo ao documento, a história oficial desde o Império e até a república esteve calcada no uso dos “relatos” (dos letrados, membros da burocracia, padres, viajantes) que, por sua condição, passavam a ser reconhecidos como fontes dos fatos. De modo paralelo, a retórica documental do passado, ao que parece, constitui apenas mais uma retórica dos alforriados e reescravizados do que dos senhores de escravos.
A ideia da queima de arquivos oculta que a maior barreira contra a garantia da memória sobre a escravidão foi o desprezo em relação ao relato dos negros que estavam vivos naquele momento.
De fato, não se encontra, efetivamente, nas fontes documentais construídas por um poder institucional racializado, uma percepção da escravidão em seu conjunto, pois o negro foi excluído como sujeito do conhecimento e, quando muito, foi transformado em objeto de estudo pela Antropologia nascente.
A ideia de queima de arquivos também se insere numa certa gestão do conhecimento sobre o passado em que as “vozes negras” são sempre consideradas inadequadas para a descrição das “vidas negras”, cabendo aos filhos da elite a elaboração de uma narrativa oficial da escravidão.
Resta a lembrança da escravidão no Brasil pousada num canto escuro da memória. Desta forma, o tabu se transformou em totem, mito de amor e de política.
E, o modelo mais presente ganhou uma versão mais complexa e ambivalente em Gilberto Freyre, nos anos 1930, que mostrou uma sociedade que se equilibrava entre a violência e passividade; substituindo candura e atos vis, inclusão e exclusão.
Compondo um equilíbrio de paradoxos que não significava cogitar na fusão ou sincretismo absoluto. Na equação nacional, a inclusão social fora definida pela afeição e pela cultura, entendida como traços compartilhados, seja nas artes, na religião e nos costumes partilhados. Enfim, nossa alma negra é encoberta pela pá de cal do esquecimento.
Referências:
DUARTE, Evandro Piza; SCOTTI, Guilherme; CARVALHO NETTO, Menelick de. Rui Barbosa e a queima dos arquivos: as lutas pela memória da escravidão e os discursos dos juristas. Disponível em: https://www.publicacoesacademicas.uniceub.br/jus/article/download/3553/2822 . Acesso e 27.9.2020.
HOLANDA, S. B. Raízes do Brasil. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.
IANNI, Octávio. A ideia de Brasil moderno. São Paulo: Brasiliense, 1994.
IANNI, Octávio. Escravidão e racismo. São Paulo: Hucitec, 1988.
FOUCAULT, Michel. A ordem do discurso. São Paulo: Loyola, 1996.FREYRE, Gilberto. Casa-grande e senzala: formação da família brasileira sob o regime patriarcal. São Paulo: Global, 2004.
LARA, S. H. Campos da violência: escravos e senhores da capital do Rio de Janeiro 1750 - 1808. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1988
SCHWARCZ, Lilia. O Som do silêncio: sobre interditos e não ditos nos arquivos quando o tema é escravidão ou escorre para o racismo. Disponível em: https://www.ifch.unicamp.br/ojs/index.php/ael/article/download/2597/2007/ . Acesso em 27.9.2020.
[1] O grande tema era a criação de uma corte permanente de justiça. Com seus longos discursos e atacando a classificação dos países pela sua força militar Rui Barbosa conquistou o respeito das nações. Sua volta ao Brasil foi uma festa. Já conhecido como a “Águia de Haia”, recebeu do presidente da República uma medalha de ouro.
[2] Raimundo Nina Rodrigues foi um médico brasileiro que no final do século XIX buscou, entre outras coisas, desvendar os mistérios da mente e do espírito dos negros brasileiros. Racista, eugenista, conservador, foi um intelectual rejeitado a partir da segunda metade do século XX por conta destas características que, se não eram, à época, exclusivas dele, tornaram-se malditas: hoje em dia seu nome quase não é citado, a não ser em revisões críticas da história dos estudos raciais. Sua produção não foi muito extensa temporalmente – cerca de vinte anos – mas foi intensa, no sentido de que escreveu muito sobre temas diversos, apesar de ter se mantido fiel aos chamados estudos do negro. Os selvagens – negros e índios – teriam, de acordo com Nina Rodrigues, um código de conduta próprio, estabelecido nos seus locais de origem e que difeririam muito dos códigos de conduta dos povos ditos civilizados. Os negros africanos são o que são: nem melhores nem piores que os brancos: simplesmente eles pertencem a uma outra fase do desenvolvimento intelectual e moral. Essas populações infantis não puderam chegar a uma mentalidade muito adiantada e para esta lentidão de evolução tem havido causas complexas. Entre essas causas, umas podem ser procuradas na organização mesma das raças negríticas, as outras podem sê-lo na natureza do habitat onde essas raças estão confinadas. Entretanto, o que se pode garantir com experiência adquirida, é que pretender impor a um povo negro a civilização europeia é uma pura aberração.
[3] Nos primeiros anos após a proclamação da República brasileiro, Marechal Deodoro da Fonseca se deparava com um país possuidor de uma estrutura econômica arcaica, baseada no café; e um retrógrado sistema financeiro. Para mudar tal situação, o Ministro da Fazenda, Rui Barbosa, adotou uma política que visava estimular a industrialização e o desenvolvimento brasileiro, porém acabou desencadeando uma das mais graves crises econômicas vividas pelo Brasil. Baseado no sistema bancário norte-americano, Rui Barbosa estabeleceu uma política monetária focada na livre emissão de créditos monetários. Desta forma, para estimular a industrialização e o desenvolvimento de novos negócios, os bancos passariam a liberar empréstimos livremente às pessoas, sem mesmo saber de suas reais condições de pagamento. Esta política ficou conhecida como encilhamento.
[4] Para isso, permitiu a emissão livre de papel-moeda. No entanto, quanto mais dinheiro entrava em circulação, mais a especulação financeira disparava. A situação ganhou o nome de Encilhamento — palavra que comparava os investidores da bolsa de valores aos apostadores do jóquei, empolgados com seus cavalos. De fato, apostava-se alto, a fim de lucrar, e nas ruas a inflação galopava. Os preços subiam, e a dívida externa crescia a olhos vistos, o que levou à primeira grande crise econômica e financeira da República, resolvida parcialmente no governo de Campos Sales, terceiro presidente do país.
[5] Rui Barbosa permaneceu no cargo de Ministro da Fazenda por 14 meses, até 20 de janeiro de 1891. Os problemas econômicos causados em razão da política do encilhamento foram parcialmente resolvidos no governo Campo Sales, por meio do controle da emissão de moeda e do estímulo ao crescimento industrial do país.
[6] Legalista, é de Rui Barbosa a famosa frase: "Com a lei, pela lei e dentro da lei; porque fora da lei não há salvação." Rui Barbosa nasceu na Bahia, em 5 de novembro de 1849. Se vivo fosse, completaria 171 anos em novembro vindouro.
[7] Para tanto, permitiu a emissão livre de papel-moeda. No entanto, quanto mais dinheiro entrava em circulação, mais a especulação financeira disparava. A situação ganhou o nome de Encilhamento — palavra que comparava os investidores da bolsa de valores aos apostadores do jóquei, empolgados com seus cavalos. De fato, apostava-se alto, a fim de lucrar, e nas ruas a inflação galopava. Os preços subiam, e a dívida externa crescia a olhos vistos, o que levou à primeira grande crise econômica e financeira da República, resolvida parcialmente no governo de Campos Sales, terceiro presidente do país.
[8] Carl Friedrich Philipp von Martius (1784-1868) chegou ao Brasil em 1817 fazendo parte da comitiva da arquiduquesa austríaca Leopoldina, que viajava para o Brasil para casar-se com Dom Pedro I. Acompanhado do cientista Johann Baptist von Spix (1781-1826), recebera da Academia de Ciências da Baviera o encargo de pesquisar as províncias mais importantes do Brasil e formar coleções botânicas, zoológicas e mineralógicas, apesar da posição de outros naturalistas, que consideravam a viagem perigosa. "Von Martius foi decisivo para a botânica brasileira. Além da maior classificação da flora da nossa história, ele foi o responsável pela primeira organização fitogeográfica do país, que hoje chamamos de biomas e são utilizados, por exemplo, nos estudos do IBGE", explica o historiador Pablo Diener, que, junto com a também historiadora e esposa, Maria de Fátima Costa, lançaram recentemente o álbum Martius .