Este artigo tem como objetivo prover uma discussão sobre a comédia e, adentrar aos seus tipos e conceito, em alguns momentos da história da humanidade. A comédia assim como a tragédia contribuíram para compreensão do universo dramático e produziram uma reflexão sobre a própria natureza humana. Se a tragédia era mais apreciada pelos nobres, a comédia era prestigiada pelos plebeus.
Palavras-Chave: Comédia. Tragédia. Teatro Grego. Literatura. Sociologia.
A origem da comédia é a mesma da tragédia, ou seja, as festas em homenagem ao Deus Dionisio ou Baco[1]. A palavra comédia vem do grego komoidia, sendo que komos significa procissão. Na Grécia Antiga havia dois tipos de procissão que eram denominadas komoi, quando os jovens saiam às ruas, fantasiados de animais, batendo de porta em porta pedindo prendas e brincando com os habitantes da cidade.
O segundo tipo de procissão era para celebrar a fertilidade da natureza.
Não obstante ser representada nas festas dionisíacas, a comédia era considerada gênero literário menor, menos importante. É que o júri que apreciava tragédia era composto de nobres, enquanto que a comédia era aferida por pessoas da plateia, em sua grande maioria, reles plebeus. De certa forma a temática servia para diferenciar os dois gêneros literários, pois a tragédia contava a história de deuses e heróis. Enquanto a comédia comentava e narrava a história de homens comuns.
A comédia nasceu como um gênero relacionado à democracia e, sua encenação era dividida em duas etapas, com um intervalo. Na primeira etapa que era chamada agón, e prevalecia um duelo verbal afiado entre o protagonista e o coro. No intervalo, o coro retirava as máscaras e passava a falar diretamente com a plateia para definir uma conclusão para a primeira etapa.
Logo em seguida, vinha a segunda etapa da comédia e seu objetivo era esclarecer os problemas que surgiram justamente no agón.
A comédia antiga fazia alusões irônicas e jocosas aos mortos, além de satirizar personalidades célebres e vivas e, até mesmo, os deuses, teve sempre sua existência muito ligada à democracia. Quando ocorreu a rendição de Atenas na Guerra de Peloponeso[2], por volta de 404 antes de Cristo, levou consigo a democracia, o que pôs fim a comédia antiga.
Aristófanes[3] é considerado o maior autor da comédia antiga e, escreveu mais de quarenta peças, dos quais só conhecemos onze apenas, entre estas estão: “Lisístrata”, “As Vespas”, “As Nuvens” e “Assembleia de Mulheres”.
Depois da capitulação de Atenas em face de Esparta, surgiu a chamada comédia nova, que se notabilizou no fim do século IV antes de Cristo e durou até o começo do século III antes de Cristo. Essa última fase da dramaturgia grega exerceu profunda influência nos autores romanos, especialmente, em Plauto e Terêncio.
As diferenças entre a comédia nova e a comédia antiga possuem muitas diferenças. E, na primeira o coro já não era atuante e sua participação fica resumida à coreografia dos momentos de pausa da ação, a política quase não é discutida. Sua temática dirige-se às relações humanas, principalmente, intrigas amorosas.
Deixa de existir as sátiras violentas. Já a comédia nova é mais realista e procura utilizar linguagem bem comportada, estudar as emoções do ser humano.
Foi Menandro é principal comediógrafo dessa comédia nova, mais de cem peças suas chegaram recentemente até nós. Conhecemos apenas por título ou por fragmentos citados por outros autores antigos, com exceção de "O Misantropo", uma de suas oito peças teatrais premiadas, cujo texto completo foi preservado em papiro egípcio e, encontrado e publicado em 1958.
A comédia que se desenvolveu em Atenas está dividida em três períodos, a saber: a comédia antiga (500 a 400 a.C.) durante o período da democracia ateniense, sendo seu principal representante Aristófanes, com suas sátiras políticas e sociais.
A comédia intermediária (400 a 330 a.C.) também chamada de mediana, apresentava curta duração e seu principal representante foi Antífanes; e a comédia nova (330 a 150 a.C.) surge com a queda da democracia ateniense, extinguindo-se o coro da comédia, sendo seu principal representante Menandro.
Atualmente, a comédia encontra vasto espaço e relevância sendo uma forma de manifestação crítica em qualquer esfera: política, social e econômica. Encontra forte apoio de populares sendo muito apreciada por grande parte do público da indústria de entretenimento. Não grande distinção entre a importância artística da tragédia ou da comédia.
Em prol do gênero, o crítico Rubens Ewald Filho[4] lembrou ditado: "Morrer é fácil, difícil e fazer comédia". Para fazer rir é necessário um ritmo, conhecido como timing, especialmente porque não é mesmo dominado por muitos.
Existem vários tipos de comédia: Comédia Romântica, Comédia Stand-up, Sketches[5], Cartoons e Comédia Costumes. A comédia romântica é subgênero cinematográfico, é basicamente o encontro de duas pessoas que se apaixonam, mas que não podem ficar juntas. Essa relação dá origem a várias cenas cômicas e, no fim, acabam sempre por esse casal se juntar e viver as fatídico “felizes para sempre”.
A comédia stand-up é representada por um comediante que fica de pé e atua em público, conta piadas, histórias captadas no cotidiano e, mostra o quão a realidade é mesmo engraçada. A comédia de costumes que foi criada pelo francês Moilière, baseia-se em crítica social, trazendo a baile certo tipo de pessoa, comportamento, utilizam tom satírico e recorre também a ironia.
O objetivo que os antigos gregos desejavam, de acordo com Aristóteles, seguem em suas tragédias não pode classificar-se nem como superior nem como inferior ao simples objetivo de divertir. E, o teatro surgira das cerimônias do culto não é diferente do que afirmar que o surgiu precisamente por se ter desprendido de destas, não adotou a missão dos mistérios, adotou o prazer do exercício do culto, pura e simplesmente.
E, a catarse aristotélica, a purificação pelo terror e pela piedade, ou a purificação do terror e da piedade, não é uma ablução realizada de uma forma recreativa, é, sim, uma ablução que tem por objetivo o prazer.
Tanto o trágico como o cômico trazem em suas possibilidades como conceito a mesma situação: algumas máscaras não ocultam nossa identidade, em verdade, a revela. E, o fato de ser uma identidade um constante devir, fruto de ethos, igualmente, em constante devir, não constitui um real problema. Antes, cativa nossa busca por conceitos e definições e, ainda de espelhos para buscar nossa própria identidade. Em última instância, fugindo um pouco da mera idealização, perceberemos que tanto o trágico como o cômico promovem o encontra a nós mesmos.
Referências
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[1] Dionísio é considerado também o deus grego da natureza, da fecundidade, da alegria e do teatro. Inspirador da fertilidade, ele também é chamado de deus da libido e na mitologia romana, seu nome é Baco. Dioniso (em grego: Διόνυσος, transl.: Dionysos) ou Baco (do grego Bakkhos) – não confundir com Dionísio, nome de homem que significa «dedicado a Dioniso» – é na antiga religião grega o deus dos ciclos vitais, das festas, do vinho, da insânia, do teatro, dos ritos religiosos, mas, sobretudo, da intoxicação que funde o bebedor com a deidade. Foi o último deus aceito no Olimpo, filho de Zeus e da princesa Sêmele, também foi o único olimpiano filho de uma mortal, o que faz dele uma divindade grega atípica. Dioniso era representado nas cidades gregas como o protetor dos que não pertencem à sociedade convencional e, portanto, simboliza tudo o que é caótico, perigoso e inesperado, tudo que escapa da razão humana e que só pode ser atribuída à ação imprevisível dos deuses. Dioniso é descrito como de "áureos cabelos" por Hesíodo.
[2] A Guerra do Peloponeso foi um conflito entre as cidades-estados gregas Atenas e Esparta, no século V a.C., pela disputa do domínio da Grécia Antiga. As duas cidades encabeçavam as principais alianças militares da época: a Liga de Delos, liderada por Atenas, e a Liga do Peloponeso, comandada pelos espartanos. A guerra durou aproximadamente 30 anos e foi decisiva para o fim da Era Clássica grega. A guerra foi vencida por Esparta, mas seu domínio sobre a Grécia não durou muito tempo. Os espartanos não conseguiram impedir a invasão dos macedônicos, liderados por Filipe II.
[3] Escreveu mais de quarenta peças, das quais apenas onze são integralmente conhecidas. Conservador, revela certa hostilidade aos deuses, bem como às inovações sociopolíticas e aos homens responsáveis por elas. Seus heróis defendem o passado de Atenas, os valores democráticos tradicionais, as virtudes cívicas e a solidariedade social. Violentamente satírico, critica a pomposidade, a impostura, os desmandos e a corrupção na sociedade em que viveu. Seus alvos são as personalidades influentes: políticos, poetas, filósofos e cientistas, velhos ou jovens, ricos ou pobres. Comenta em diálogos mordazes e inteligentes todos os temas importantes da época — a Guerra do Peloponeso entre Atenas e Esparta, os métodos de educação, as discussões filosóficas, o papel da mulher na sociedade, o surgimento da classe média.
[4] Rubens Ewald Filho (1945 —2019) foi um jornalista, crítico de cinema, apresentador, ator, cineasta e diretor teatral brasileiro de origem diversa e multiétnica.
[5] Sketches: também conhecidos como “esquetes”, os sketches tratam-se de vídeos de humor com duração de, em média, 5 minutos. Esse tipo de comédia é feito por um grupo de comediantes que, na maioria das vezes, realiza as cenas através do improviso; A estrutura do sketch é a mais básica possível: encontre um personagem interessante, o coloque numa determinada situação e o deixe guiar o resto. Por exemplo, a pessimista mórbida viajando pra Disney. Sketch comedy sempre traz um comentário sobre a atualidade. Quem quer escrever sketch tem que acompanhar os debates políticos, ver os filmes, “ler jornal”, enfim, fazer parte das conversas. A graça é instintiva. O som de uma palavra, a pronúncia de um nome, um movimento repetitivo… dá pra fazer sketchs sobre coisas ridiculamente simples. O personagem não precisa ter um arco, ele não precisa mudar, ele não precisa ter um crescimento psicológico, não tem atos, não tem plot point.