Ao entardecer. BVIW
Trago guardado no peito muitas emoções silentes. Ou, talvez silenciadas. Afetos que brindam com a chuva a natureza da humanidade que é a eternidade do amor e a efemeridade das paixões. Trago guardado no peito as experiências vivenciadas, marcadas no tempo e no espaço. Na identidade incoerente dos paradoxos. Nas escolhas que fiz ou fizeram por mim. No peito dormem sentimentos desconhecidos que rangem ao abrir alçapão. Que surgem daquele olhar ou daquela lágrima. Talvez uma mágoa esquecida, ou um perdão que jamais consegui dar. Essa bagagem emocional é pesada e imensa. Precisamos carregá-la ao longo da existência, e ainda, ter a leveza de sobreviver, transmutar, transcender, superar as trincheiras contemporâneas. Há tanto ódio solto lá fora. Há tanta indiferença reverberando pela geometria global. Assim, era Pedro. Um poeta cheio de romantismo e tristeza. Seus amores que já passaram. Suas tentativas vãs de ser feliz falharam. Mas, era um aprendiz incansável. Não abandonava a escola. Não esquecia de fazer a lição. Sentava, todos os dias, na escrivaninha e, desenrolava os papiros, os livros e punha-se a escrever, como se fosse, buscar oxigênio. Pedro estava doente. Foi ao médico, mas os medicamentos não remediavam sua hipertensão, sua alergia absurda que insistia estar em crise... Espirrava compulsivamente, até o nariz sangrar... Os olhos ardiam, a boca secava que buscava beber cada vez mais água, mas, não conseguia matar a sede. Tinha sede de vida. Sede de tanta coisa que talvez nem mais existisse... Pedro, um herói cotidiano, misturado em meio a um cenário caótico e bipolar. Tudo em ano de eleição gera confusão, até conversa de bar... é pior que torcida de futebol. De um lado,um autoritário patológico, doutro lado, um pseudolibertário que seduz com promessas vermelhas que comparecem justamente ao entardecer. Mas, Pedro era resiliente. Resistia bravamente as intempéries contemporâneas. Ao politicamente correto. Amava desbragadamente. Não tinha vergonha de seus fracassos, nem de seus poucos êxitos. Persistia no palco, ora na comédia pungente. Ora, na tragédia trivial e contundente. Curava suas feridas e rancores com generosos tragos de alegria líquida e gelada. Pedro descobriu com felicidade que quando ajudava os outros, também se ajudava. Edificava uma nova saída para as agruras do caminho. Amar a rosa com espinhos. Amar o amanhecer tímido. O sol a pino do meio-dia. E, até os temporais e vendavais que lavam tudo, até a alma. Sem afogar a gana de continuar sobrevivendo.