"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

Textos


Comecei fazer psicanálise ainda na adolescência. Fui uma criança um tanto estranha, gostava de brincar sozinha, aprendia rápido tudo, mas, era notório que não gostava de interação social. Ainda na escola, escolhia aquela carteira que ficava colada na parede, sozinha, sem haver o par composto pelas cadeiras do centro da sala. Mesmo com professores, só falava o necessário.
Uma professora chegou a chamar minha mãe. A pobre coitada, veio toda preocupada achando que tinha feito algo de errado. Nesse momento, a professora elogiou meu desempenho, mas começou a informar que eu não gostava do recreio e nem de interagir com as demais crianças. Adorava a biblioteca, mas, era notório, não tinha apreço pelas pessoas.  Minha mãe, coitada, perguntou o que poderia fazer, para melhorar a situação... e a mestra, atalhou leva ao psicólogo.

Na semana seguinte fui ao psicólogo, um sujeito magro, alto e meio calvo. Tinha um ar engraçado e, olhos esbugalhados. Como se quisesse ver toda a realidade de uma só vez. Tolice. Pediu para desenhar. Para descrever minha rotina. Enfim, fazer um relato da minha vida. De minha parte, de forma desanimada, dei todas as informações.
E, assim, o psicólogo disse-me, que eu não era igual as outras crianças. Cocei a cabeça, olhei para os lados, e afirmei com ar blasée: - eu sei, mas vamos fingir que é segredo! Ele riu. Chamou minha mãe, e a tranquilizou: - Olha ela é uma criança normal. Só tem uma índole antissocial. Mas, com tempo, isso melhora...
Aliviada minha mãe, pegou minha mão e, me inquiriu: - por que você não gosta do recreio?  Respondi de cabeça baixa:- o pátio estava todo limpinho e cheiroso. Com o recreio, vira um lixo e fedido. Depois tem umas brincadeiras que não gosto... pique-esconde, pula corda e, a pior de todas: corrida... Odeio correr.... Prefiro na hora do recreio, logo depois de engolir a merenda, ir à biblioteca. Lugar silencioso e limpinho e cheio de livro bom para folhear... ninguém grita, ninguém empurra e, melhor de tudo: ninguém pergunta nada.  Minha mãe generosamente olhou para mim, e se recordou que no seu tempo de escola sentia a mesma coisa... Então, conclui: -é genético. Mas, fiquei calada.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 24/09/2021
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