Em 1600, William Shakespeare escreveu: "Há mais coisas entre o céu e a terra, Horácio, do que sonha a nossa vã filosofia". A assertiva que revela o espanto diante do fantasma do pai, que ressurge do reino dos mortos para pedir uma ajuda ao filho no mundo dos vivos. Nove em cada dez citações de Shakespeare vêm da peça Hamlet. E, na maioria das vezes, por questões de eufonia ou mesmo estilísticas, as traduções não foram realizadas fielmente. Geralmente, as traduções não alteraram o sentido original da frase. Mas, há um problema com frase que citei inicialmente, pois denota uma deturpação do texto original. A assertiva acontece quando Hamlet, após ver o fantasma do pai, tenta esconder de Horário e Marcelo o que efetivamente se deu. Depois de muita insistência, eles conseguem fazer que Hamlet revele o que aconteceu. Mas, o faz sob uma condição: - a de nunca revelarem a ninguém, o que ali se passou. Enquanto Hamlet impõe o juramento, o fantasma do pai de Hamlet os rodeia urrando: - Jurem! Quando então Horário exclama: - Ó dia e noirte, mas isso é formidavelmente estranho. Quando então, Hamlet replica: - E, portanto, sendo estranho, dê-lhe as boas-vindas. E, conclui:- "Há mais coisas no céu e terra, Horacio. Do que foram sonhadas na sua filosofia". Trata-se de mais uma ironia de Hamlet. Pois, Horácio é estudante (colega de escola) e representa a racionalidade enquanto que Hamlet é passional. Refere-se mais especificamente, ao conflito entre cumprir ou não a promessa de vingar seu pai, matando seu tio. Conclui-se que em nenhum momento Hamlet classifica a filosofia ou a racionalidade como vãs ou fúteis. Seu propósito é outro, de apontar que são mesmo essenciais para o ser humano, mas estas, não respondem a tudo. Por essa razão, é absolutamente temerário legar todas as soluções da existência humana ao nosso limitado cérebro. Por que será?