Há certeiras implicações dos heróis na formação psíquica dos leitores, além de ter influência no desenvolvimento das sociedades. Conclui-se que nessas histórias, encontram-se elementos que integram a formação psíquica tanto de
crianças e adultos, seja aliviando angústias, seja como fonte de desenvolvimento moral. O herói é a matéria-prima dos mitos, e sua primacial função é apontar os caminhos para o aperfeiçoamento da sociedade humana.1
Em sua concepção original o herói é mitologicamente o filho proveniente da união de um deus e uma deuses com ser humano; é um semideus. Também poderá ser um mortal mas que foi divinizado após sua morte.
É indivíduo notabilizado por seus grandes feitos, seja como guerreiros, sua coragem, tenacidade e, enfim, magnanimidade. Desde a Antiguidade Clássica, em todas as culturas e povos, havia a arte de narrar histórias e fora exercitada atraves dos mitos2 onde situa-se a figura do herói.
Assim, este pode ser encontrado tanto em lendas tribais, como o guerreiro que liderou certo povo em batalhas e desafiou os maus espíritos, e ensinou verdades do universo. A função primária da mitologia e dos ritos sempre representou o fornecimento de símbolos que levam o espírito humano a avançar, opondo-se aquelas outras fantasias humanas constantes que tendem a levá-la para trás.
Por lidarem com problemas humanos universais, tanto os contos de fadas conseguem se fazer entender por qualquer pessoa, independente de idade ou sexo, transmitindo simultaneamente significados relevantes manifestos e encobertos.
De fato, há mensagens recebidas pelo ouvinte ou leitor em todos os níveis de sua mente, seja consciente, pré-consciente e inconsciente, permitindo que uma pessoa atribua diferentes significados a uma história, conforme as diferentes épocas de sua vida.
As duas grandes guerras mundiais significou fator de grande importância para sua difusão, no qual os Estados Unidos emergiu como principal portência mundial. Em todos os tempos, a nação hegemônica sempre conseguiu se impor, além de sua economia, cultura ou educação em face das demais, em graus e sentidos diferentes.
Desta forma, o mundo começou a admirar heróis, artistas de Hollywood bem como música popular norte-americana e outros hábitos. Num período sombrio surgiu o Superman, um herói dotado de grande poder, o suficiente para consertar os problemas que tanto infligiam o mundo. E, se tornou rapidamente um enorme sucesso comercial, sendo a própria personficação da própria sociedade norte-americano3.
O famoso Homem de Aço revela-se invencível, e protetor dos mais fracos, dotado de altíssimos valores morais. Como um país construído por imigrantes, o Superman representava adequadamente esta origem, pois era vindo de outro planeto, adotando a nova terra, como seu lar e, se incumbido de ser seu principal protetor.
Outro herói importante da mesma época foi o Capitão América, tanto que, em seu primeiro número, a revista em quadrinhos trazia na capa o herói dando enorme soco em Hitler. Vestido com a bandeira norte-americana, tendo um escudo como arma, uma possível alegoria de que ataca para se defender.
Era supersoldado e se definia igualmente como nobre protetor dos valores norte-americanos, tendo por inimigo tudo aquilo que poderia se opor a tais valores. Seu papel de propaganda antinazista era tão pugente que com o fim do conflito mundial, saiu de circulaçaõ com a desculpa de que, para desviar um míssil, caíra com este no Ártico restando congelado por décadas.
O ponto de vista psicanalítico não deve enfocar apenas seu papel social, mais principalmente a figura do pai e da mãe que são encarados como funções na estruturação psíquica, e os papéis desempenhados nos processos de desenvolvimento não correspondem,, necessariamente, com os papéis desempenhados na estrutura familiar.
É o que ocorre no Complexo de Édipo que é a base da teoria freudiana, em que a família ocupa prosição central, na qual a funções paterna e materna nem sempre são desempenhadas pelos personagens que a respresentam socialmente.
É verdade que a questão familiar dos super-heróis é muito pouco trabalhada em suas histórias. Isso se deve ao fato que é no momento de sua individualidade que o personagem realiza as proezas que o torna herói, a individualidade é uma das características do modelo burguês.
Mas, afinal, essa sempre foi uma marca do herói de sua origem. Por isso, a maior parte dos super-heróis de Histórias em Quadrinhos não é casada e nem possui filhos. E, o outro motivo que pode ser enfatizado é a consciência que o herói possui de que seus familiares estariam em perigo, no caso de sua identidade fosse revelada ou descoberta.
Percebe-se então que a família deixa de ser pública e se tornava nitidamente privada. E, até meados do século XX, era bastante comum que muitas famílias morassem na mesma casa, ou então, uma família morar em residência de apenas um cômodo, onde pais e filhos dormiam juntos no mesmo lugar, muitas vezes, até mesmo na mesma cama.
Nessa sociedade, quando o grosso da população vivia principalmente nas áreas rurais, as pessoas não possuíam momentos de intmidade ou privacidade em seu lar, sua vida era de domínio público. E, por isso, a família numerosa possuía maior força no controle da subjetividade de seus membros.
Com a ascensão do capitalismo e, do modo de vida burguês, a estrutura das casas e também das famílias fora modificada. E, as casas se tornaram maiores, com seus integrantes possuindo quartos individuais, dando oportunidade a terem finalmente uma vida privada, sem que esta, se confundisse com a da família.4
Diante desse novo contexto houve a possibilidade de surgir novos arranjos familiares, além de pessoas começarem a morar sozinhas. Outra relevante contribuição dos quadrinhos é a evolução do papel feminino.5 Que antes era restrita aos papéis insignificantes, tida sempre como a mocinha do herói, na qual possui a única função de entrar em perigo para logo depois de ser salva com a emancipação da mulher na vida social nas histórias passou a ter importância.6
Segundo Bradford Wright, embora os comunistas dos quadrinhos da Marvel fosse vilões, em raras ocasiões se super-heróis se arriscaram em histórias passadas no Vietnam, onde ocorria a guerra que mais afetou a sociedaade norte-americana em função de seu profundo questionamento moral pelo movimento pacifista e pelo resultado desfavorável aos EUA.
Aliás, o Homem de Ferro em sua origem, surge como herói no países asiático e, seu primeiro feito foi destruir uma base militar vietcongue. E, ao mesmo tempo, em sua identidade secreta de Tony Stark, sendo ele um rico industrial fabricante de armas, que vende seus inventos para o governo norte-americano e sob a armadura de Homem de Ferro combate os super-vilões soviéticos, em simbólicas lutas da Guerra Fria de poder e vontade, independentemente da maneira que fosse.
Assim, surgira uma das primeiras grandes heroínas é a Mulher Maravilha que seria uma guerreira que veio à Terra para defender os direitos das mulheres.
O papel das mulheres foi ampliado, numa nítida influência do movimento feminista mais forte durante esse período. Surgiram inclusive versões femininas de personagens clássicos tais como a Mulher-Aranha e Mulher-Hulk, a BatGirl e Super Girl.
Outra heroína que merece destaque é Tempestade que é capaz de controlar o tempo sempre que quer. Apenas com a sua mente, consegue mudar o clima em questão de segundos. Essa mutante incrível é capaz de trazer grandes tempestades.
Outra heroína é Supergirl que tem os mesmos poderes do Superman. Apesar de que Clark Kent ser um pouco mais carismático do que ela, mas em questão de proporção e intensidade, todos os poderes são os mesmos, assim como suas boas intenções e valores.5
Temos também Batgirl, seu verdadeiro nome é Barbara Gordon. Sua vontade de ajudar o lado do bem e acabar com os vilões fez que a heróina fosse uma protegida do Batman. E, por muitos anos, assim permaneceu, até que após uma luta contra o Coringa, a Batgirl ficou paraplégica e se tornou Oráculo, um hacker digital que fornece as informações para que Batman estivesse sempre à frente de seus inimigos.
Jean Grey é uma das personagens femininas mais famosas e mais poderos do mundo dos mutantes. E, nem mesmo ela tem noção da capacidade de seus poderes e, justamente por isso, acaba dominada por sua própria mente por muito tempo. Possui um codinome, apesar de nem tão conhecido, Fênix Negra.
Por fim, a Viúva Negra que apesar de não possuir nenhum superpoder, o que a descaracteriza como super-heroína. Mas, as suas habilidades de luta e sua inteligência são tão incríveis que não a deixam em desvantagem em relação a nenhum poder sobrenatural. E, apesar de ter começado como vilã, decidiu mudar de lado e, passou a integrar o verdadeiro time dos Vingadores.7
Notas de Rodapé
1.Durante a década de trinta surgiu o gênero que se tornaria o símbolo dos comics: o dos super-heróis. Eram seres com poderes extraordinários que poderiam realizar feitos inimagináveis para o ser humano, usando a combinação ususal de elementos, tais como: uniforme, alter ego, um vilão a ser combatido. E, nasceu assim, o arquétipo do herói perfeito, um ser habilidades quase divinas, que além de possuir extraordinários poderes, era possuidor de um caráter incorruptível.
2. Para Umberto Eco, dentro do contexto da modernidade ocidental, os avanços da tecnologia permitiram o avanço da industrialização gerando maior nivelamento social. E, os problemas psicológicos e as frustrações ante o império da márquina faziam com que a força individual se tornasse pequena em face da força coletiva.
A necessidade de poder do indivíduo ficou cada vez menos satisfeita. Por isso, o herói moderno, belo, forte, bondoso, gentil, incapaz de mentir e, principalmente, invencível tornou-se o sonho recpetor desta cultura da modernidade.
3. Para Edgar Morin, a indústria cultural não significa tanto a racionalidade que informa essa cultura, mas o modelo peculiar em que se organizam os novos processos de produção cultural. E, analisou a cultura de massa em uma direção ao que denomina de "modos de inscrição no cotidiano", e defina a indústria cultural como um conjunto de dispositivos que proporcionam apoios imaginários à vida prática e pontos de apoi prático à vida imaginária.
4. Em sua obra "Mitologias", de Roland Barthes afirmou que o mito, antes de qualquer coisa, é uma fala. Para o escritor, o homem fala o mito através de sua linguagem, seus símbolos e projeções. E, Barthes divide o mito em três elementos básicos: significante, significado e signo, sendo este o terceiro o mito propriamente dito.
Isso caracteriza o mito como algo que vai além da simples imagem representada, uma vez que esta se reveste de conteúdos passíveis de
interpretação, de acordo com a cultura de indivíduos ou povos. Assim como a arte, os mitos nem sempre podem ter seus conteúdos explicados de forma racional.
5.No imaginário norte-americano a crença dos heróis salvadores tem relação com a ideia do Éden, do paraíso ideal, onde uma atmosfera alegre atravessa a população homogênea, e, os cidadãos são obedientes à lei e cooperativos, sem aqueles extremos que aparecem em projetos econômicos e políticos radicais, ou ainda, em desejos sexuais que poderiam provocar conflitos. Assim, a ação dos Americans Monomyth sempre começa como uma ameaça surgindo contra a calmaria do Éden. As histórias em quadrinhos demandavam um formato heróico com apelos tradicionais de aventura e redenção.
6. Os super-heróis são sobre-humanos e a melhor encarnação destes seres extraordinários é o Super-homem. Segundo esta concepção, um super-herói tem esta designação super quando ele tem que colocar em prática seus poderes.
Isto só pode ocorrer ocorrer havendo uma população de seres poderosos num mundo em que ele vive e combate o mal. Sempre defendedo a verdade e ajustiça do American Way of Life, tal figura também evidentemente atuava como um forte veículo de propaganda ideológica, principalmente nos períodos de guerra, quando tais personagens poderiam participar dos conflitos fazendo uso de seus dons.
7.O advento da Guerra Fria e o surgimento no mundo da bipolaridade entre os Estados Unidos e a União Soviética fizeram eclodir na sociedade americana um forte sentimento anticomunista. O marcartismo disseminou o medo de um ataque soviético, especialmente nuclear, e acabou por disseminar um estado que beirava a paranóia, na qual se procuravam culpados pelos problemas da sociedade norte-americana.
Referências:
Bettelheim, B. (1995). A psicanálise dos contos de fadas (10a ed.) (A. Caetano, trad.). São Paulo: Paz e Terra. (Trabalho original publicado em 1976).
Campbell, J. (2006) O Herói de Mil Faces (14a ed.) (A. U. Sobral, trad.). São Paulo: Pensamento. (Trabalho original publicado em 1949).
Corso, D. L. & Corso, M. (2006). Fadas no divã. Porto Alegre: Artmed.
Feijó, M. C. (1984). O que é herói. São Paulo: Brasiliense.
Houaiss, A. & Villar, M. S. (2001). Dicionário Houaiss de língua portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva.
Radino, G. (2003). Contos de fadas e realidade psíquica: a importância da fantasia no desenvolvimento. São Paulo: Casa do Psicólogo.