Miro na vítima e acerto o algoz.
E o sangue dadaísta
tinge o humor de negro.
Cores são roupas
que trocamos na vida.
Miro novamente.
Como um snipper.
Calculo o vento e a trajetória do projétil.
Avalio o ângulo delicado.
E alicerçada na aresta,
deflagro mais um tiro.
Acerto novamente outra vítima.
Afinal, ela não pode trair o papel.
A dor adormecida
parece ser de uma anestesia pretérita.
A dor habitual vira
uma espécie de ritual masoquista.
Traça as dimensões da carne.
A estreiteza da respiração curta e fugidia.
O diafragma comprimido
no peito repleto
de emoções jactantes.
De expectativas afônicas.
Apesar de me livrar do algoz.
Depois do combate,
a liberdade parece um deserto.
A areia movediça faz afundar sentimentos
Que morrem acenando
em cores apagadiças.
Fonemas sufocados.
Sílabas interrompidas pela dialética.
A semântica nos enreda de todo jeito.
Miro na sintaxe.
E a métrica me trai com outro.
A sedução compulsiva de rimas.
Suaves, brandas e musicais.
Capazes de fazer esquecer
a tragédia diária ou
o paradoxo inescapável.
A arena com leões e gladiadores.
A luta só cessa com a morte.
Saímos da arena.
Vencedores ou não.
Aprendizes ou não.
Cada ferida é uma medalha.
Cada cicatriz uma comenda.
E, toda a experiência adquirida
e amassada, quando amalgamada
se recolhe em réquiem
dentro do esquife.
Guardemo-la.
Depois vem a lápide.
A corrosão do tempo,
apagam as datas.
Deteriora nomes.
E o esquecimento vem,
assim como o próximo
vento de outono.
A lembrança é mera brisa.
E seu rosto se desfaz aleatoriamente
com o bailar das folhas em
inverno.
Que crepitam como no baile das paixões.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 15/08/2019
Alterado em 15/08/2019