Minha avó era professora de música e de piano erudito. Era uma pessoa muito interessante, cheia de silêncios enigmáticos. E, criava galinhas no quintal, além de ter uma pequena horta, com alfaces, tomates e hortaliças como cheiro verde e hortelã. Eu, ainda menina ajudava cuidando das galinhas, e insistia de batizá-las com nomes exóticos e sonoros. Então, existia a Marluce, Checheia, Gabriela, Carolina Pançuda e, a mais antiga de todas, Dona Maricota. Era muito difícil lidar com o fato que as vezes, uma delas ia parar na panela e servir de almoço.
Lembro-me que recusava comê-las e rogava por misericórdia, por conta do pecado da gula. Sempre encarei a fome como um pecado... que é capaz de nos fazer matar, abater e cozinhar pequenos animais com quais travamos afetos. Contestando veemente, chorava porque não querer que sacrificassem as "amigas galinhas". E, minha avó com a candura mágica, me explicava que Deus em sua grandeza havia criado assim, para nós aprendermos a praticar desapego. Amar o quanto possível e seguir a regra da natureza que está escrita na eternidade das missões e nas almas. Aliás, os galos também tinham nome, tinha Lacerda, Negrão, Getúlio Vargas e, o mais agressivo de todos, o Honório. Era galo garnizé insuportável, bicava os pés da gente sem dó nem piedade. E, infelizmente, um vizinho o roubou.
Apesar da candura, confesso, até hoje quando como um frango, lembro das galinhas, dos pintinhos e dos galos como fossem ternos amigos da infância.