Apostila de Direito das obrigações
A importância dos direitos das obrigações compreende as relações jurídicas que constituem as mais desenvoltas projeções da autonomia privada na esfera patrimonial. Dotado de grande influência na vida econômica, regula as relações da infra-estrutura social de relevância política, as de produção e as de troca. Também é nos direitos das obrigações que percebemos as limitações impostas à liberdade de ação dos particulares retratando a estrutura econômica da sociedade.
Dentro de nosso C.C. a palavra obrigação comporta vários sentidos. Podem designar-lhe o lado ativo, também chamado crédito, e o lado passivo, denominado débito.
Obrigação é o crédito considerado sob ponto de vista jurídico; crédito é a obrigação sob ponta de vista econômico. A mais antiga definição remonta das Institutas primando ser um vínculo jurídico que necessita adstringir o devedor a cumprir a prestação ao credor.
Destaca que a obrigação é uma relação jurídica entre o credor e o devedor caracterizada pelo vínculo jurídico, destacando o conteúdo como uma prestação e externar-lhe também a sua peculiar coercibilidade. Há uma ressalva exagerada do devedor e, certo ostracismo do credor. Segundo Clóvis não faz a distinção entre obrigação e qualquer dever juridicamente exigível.
Já a definição de Paulo não chega a definir obrigação, mas evidencia os seus elementos: sujeitos prestação e vínculo jurídico. É através de tal definição que podemos abalisadamente estabelecer a contraprestação entre direitos reais e direitos obrigacionais; descreve com maior exatidão o conteúdo e o objeto do vínculo; revela a essência ou substância da obrigação (vínculo entre duas pessoas).
O vocábulo obligatio é recente tanto que não foi utilizado na Lei das XII Tábuas, o vocábulo primitivo empregado para externar o vínculo obrigacional, era nexum (advindo do verbo nectere significando atar, unir, vincular).
A obligatio caracterizava-se como direito de garantia sobre a pessoa física do obrigado, tal submissão do devedor ao credor só veio a cessar com a Lex Poetelia Papiria que no século IV a.C., substituiu o vínculo corporal pela responsabilidade patrimonial onde os bens e, não o corpo do devedor deveriam responder pelas suas dívidas.
Alguns Códigos definiram obrigação como o Código de Obrigações da Polônia (art. 2 º § 1º), já o Código Civil (BGB) Alemão prefere conceituar a obrigação pelo lado oposto, ou seja, do credor em relação ao devedor (art. 241).
O Código Civil Brasileiro escudou-se da tarefa definitória assim como o Código Civil Francês.
Apreciemos algumas das definições sobre obrigações fornecidas pelos nossos melhores doutrinadores:
Clóvis: Obrigação é a relação transitória de direito, que nos constrange a dar, a fazer ou não fazer alguma coisa economicamente apreciável em proveito de alguém, que, por ato nosso ou de alguém conosco juridicamente relacionado, ou em virtude de lei, adquiriu o direito de exigir de nós essa ação ou omissão.
Não alude tal definição ao elemento responsabilidade Washington de Barros Monteiro assim definiu: obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecido entre devedor e credor e, cujo objeto consiste numa prestação pessoal econômica, positiva ou negativa, devida pelo 1 º ao 2 º, garantindo-lhe adimplemento através de seu patrimônio.
Apesar de impecável, tal definição exagera pleonasticamente ao caracterizar a prestação tendo em vista que deverá ser sempre economicamente apreciável ainda que tal fato só advenha da vontade das partes.
Como relação jurídica, o direito obrigacional sedia-se no campo jurídico e seu adimplemento é devido à espontaneidade do agente que não pode ser compelido a qualquer prestação.
O caráter provisório evidencia que uma vez cumprida e satisfeita a prestação, quer amigavelmente, quer pelos meios jurídicos disponíveis ao credor, exaure-se a obrigação, o devedor resta liberado e ao credor cabe a extinção de seu direito.
Não há obrigações perpétuas nem mesmo as de direito família puro que quando muito poderão perdurar enquanto vida tiver o alimentado.
Radbruch afirma que o direito do crédito traz em si o germe de sua morte. À obligatio sempre se contrapõe, a solutio( do verbo solvere, desatar, soltar), ou seja, a exoneração do devedor através do pagamento. A obligatio liga, ata e a solutio desata, libera.
Desta forma, a locação indefinida degenera em servidão, tanto assim que a lei fixa-lhe a duração máxima (art. 1.220 CC) mesmo o contrato de sociedade chega por alguns motivos legais de dissolução (art. 1.399). O usufruto instituído para pessoa jurídica, extingue-se com esta.
A obrigação corresponde a uma relação pessoal que induz a responsabilidade patrimonial, mas seria exagero concordar com Gaudemet e Polacco que vislumbraram na obrigação um vínculo entre dois patrimônios sob uma ótica despersonalizada do vínculo.
Trabucchi assinalava que nos últimos tempos, quanto a essa tutela judicial, é visível a aproximação entre os direitos reais e os direitos obrigacionais.
A patrimonialidade constitui assim o caráter específico da obrigação. Quanto ao objeto da prestação, pode ele ser positivo ou negativo que constitui a coisa ou o fato devido pelo obrigado ao credor.
Dentre as inúmeras evoluções sofridas pelo direito das obrigações podemos destacar em especial a que corresponde à viabilidade de indenização para o dano moral ainda que dele não advenham prejuízos materiais em face da Constituição Federal de 1988.
A idéia da obrigação encerra três elementos conceituais o vínculo jurídico; as partes na relação obrigatória, isto é, credor e devedor, um objeto da prestação que é devido por uma parte à outra.
Vínculo é qualificado como jurídico por ser disciplinado por lei e acompanhado de sanção.
No direito moderno destacam-se dois elementos: a dívida e a responsabilidade. O elemento dívida (Schuld) consiste no dever que incumbe ao sujeito passivo de presta aquilo que se compromete. O elemento responsabilidade (haftung) é representado pela prerrogativa conferida ao credor ocorrendo inadimplência, de proceder à execução do patrimônio do devedor, para obter a satisfação de seu crédito. Da maneira que o devedor se obriga, seu patrimônio responde.
Processualistas como Alfredo Buzaid fundados nesta diferença, sustentam que o elemento dívida (schuld) é de direito privado e o elemento responsabilidade (haftung) é instituto do direito processual.
A prestação consiste em dar, fazer ou não fazer. Ou seja, entrega de um bem, numa prestação de serviço ou numa omissão ou abstenção.
Silvio Rodrigues ensaia uma definição de obrigação é o vínculo de direito pelo qual um sujeito passivo fica adstrito a dar, fazer ou não fazer alguma coisa em favor de um sujeito ativo, sob pena de se não o fizer, espontaneamente, seu patrimônio responder pelo equivalente.
Quanto à distinção entre os reais e pessoais podemos dizer que os primeiros incidem diretamente sobre a coisa; e a segue em poder de quem quer que a detenha (seqüela); é erga omnes; é perpétua enquanto que os segundos dependem de uma prestação de um devedor.
Emilio Betti aduz que o direito real propõe um problema de atribuição, o direito pessoal propõe um problema de cooperação (ou de reparação se advier obrigação de ato ilícito).
Fontes das obrigações são atos ou fatos nos quais estas encontram nascedouro. Gaio, no direito romano diz que a obrigação vem do delito ou surge do contrato e, ainda, recorrem as possíveis causas genéricas das obrigações. Justiniano enumera fontes, a saber: contrato, o delito (atos ilícitos), o quase-contrato (atos lícitos tais como gestão de negócios) e o quase-delito.
A formula das Institutas vai ser acolhida por Pothier que adiciona a lei às demais fontes.O CC Brasileiro declaradamente nomeia três fontes de obrigações; o contrato, a declaração unilateral da vontade e o ato ilícito.
As obrigações sempre derivam da lei, sendo que nalguns casos, embora esta apareça como fonte mediata, outros elementos despontam como causa imediata dos vínculos, como por exemplo, a vontade humana ou o ato ilícito. Silvio Rodrigues classifica as obrigações como as que têm fonte imediata à vontade humana; obrigações que têm fonte imediata o ato ilícito e as obrigações que têm fonte direta à lei.
A etimologia da obrigação advém do latim ob + ligatio contém uma idéia de vinculação, de liame, de cerceamento de liberdade de ação, em benefício de pessoa determinada ou determinável.
A causa genitrix da obligatio tanto pode ser autodeterminada como pode provir de uma heterodeterminação. Toda obrigação há um liame, um laço entre os sujeitos, vínculo que o Professor Serpa Lopes assinalava que não é de subordinação e, sim de coordenação porque respeita a essência da liberdade humana.
Savigny: A obrigação consiste na dominação sobre uma pessoa estranha, não sobre toda pessoa (pois que importaria em absorção da personalidade).
Caio Mário sucinto definiu a obrigação como o vínculo jurídico em virtude do qual uma pessoa pode exigir de outra a prestação economicamente apreciável. Nela está caracterizado o requisito objetivo (a prestação) que deverá ser dotada de patrimonialidade, e ainda é de vislumbrar a dualidade de aspectos, o débito e a responsabilidade.
Nela está caracterizado o requisito objetivo (prestação) que deverá ser dotada de patrimonialidade, e ainda é de vislumbrar a dualidade de aspectos, o débito e a responsabilidade.
Dentro do quadro evolutivo histórico da obrigação ela ocorreu primeiramente com caráter coletivo, ocorrendo o vínculo e a sanção comprometendo o grupo inteiro. Bem mais tarde, ela se individualiza e surge o nexo obrigacional e sobrevive a punição do infrator dirigida ao seu próprio corpo.
Na passagem da obrigação coletiva para individual conservou-se ainda o sentido criminal, ou seja, delitual de responsabilidade.
O nexum e o manus iniectio em razão da pessoalidade do vínculo estabelecia o poder do credor sobre o devedor, compatível com a redução do obrigado à escravidão.
O direito obrigacional romano é de extremado formalismo, recheado de cerimônias e rituais que prevaleciam completamente sobre a manifestação de vontade. A sacramentalidade jamais abandonou o direito romano.
A Lex Poetelia Papiria 428 a.C. aboliu a execução sobre a pessoa do devedor, projetando-se a responsabilidade sobre seus bens – e constitui uma autêntica revolução no conceito obrigacional.
O Direito medieval dotado de maior espiritualidade via mesmo a falta de execução de obrigação como se fosse peccatum equiparada à mentira, e condenada toda quebra de fé jurada. Por amor à palavra empenhada que os canonistas e os teólogos instituíram o pacta sunt servanda o respeito aos compromissos assumidos.
No direito moderno atribui-se a vontade plena como força geradora do vínculo e também a impessoalidade da obrigação. A relação obrigacional é entre pessoas e, não entre pessoa e bens. Somente na execução da obrigação que se atinge o patrimônio do devedor, como garantia geral do cumprimento.
Barassi salienta que a atividade pessoal ocupa o centro ativo do patrimônio mesmo.
O direito obrigacional moderno já inova as concepções dominantes e registra a predominância do princípio de ordem pública.
A obrigações decompõem-se em três elementos distintos: sujeitos, objeto e vínculo jurídico.
Quanto ao elemento subjetivo este há de ser duplo e distinto (não-coincidente). É relevante a questão da determinação subjetiva, sendo mesmo a determinabilidade indisponível, nem que seja no momento da solutio (do pagamento) como é o caso do título ao portador ou título à ordem.
Toda obrigação há de ter um objeto que é a prestação do devedor. Não confundi-la com a coisa em que a prestação se especializa.
A prestação é sempre um fato humano, uma atividade do homem, se é um facere consistirá numa prestação de serviço, se for um non-facere será uma omissão, uma abstenção e se, for um dare será de efetuar a entrega daquele bem (tradição).
O objeto da obrigação poderá variar, será positivo quando for um dare ou um facere e, será negativo quando se fala que há obrigação negativa implica num não-fazer.
Exige-se da prestação que tenha possibilidade, liceidade, determinabilidade e a patrimonialidade que são características essenciais à própria integração jurídica da obligatio.
Finalmente, o objeto há de ter caráter patrimonial, revestida de cunho patrimonial, seja por conter em si mesmo um dado valor, seja por estipularem as partes uma pena convencional para o caso do descumprimento que é antecipação estimativa das perdas e danos.
Desta forma, a patrimonialidade se inscreve como qualidade essencial para Savigny, Dernburg, Kohler, Brinz, Endemann, Oser, Giorgi, Ruggiero, Salvat, Mazeaud, Bevilácqua, Orozimbo Nonato.
Já na trincheira oposta encontram-se Windscheid, von Ihering, Demogue, Ferrara, Alfredo Colmo, Barassi, Saleilles e Eduardo Espínola.
Em prol da patrimonialidade erguemos dois fortes argumentos; o primeiro por que a lei o admite implícito tanto assim que o converte em equivalente pecuniário, o devedor que culposamente falta a cumprir a prestação.
Como argumento em contrário, invoca-se que a reparação do dano moral. Como fato voluntário gera obrigações da prestação patrimonial, também o delito cria o dever de prestar pecuniariamente (sem que se possa tecnicamente definir obrigação) de objeto patrimonial, senão preexistia o dever negativo de respeitar a integridade jurídica alheia (o principio de não lesar a ninguém).
Para alguns doutrinadores italianos como Pacchioni a patrimonialidade pode não significar o valor de troca ou economicamente intrínseco. Porém subsiste o valor de afeição (o pretium affectionis) e, nem por isso inábil a configuração da obrigação.
Apesar de se admitir que o interesse do credor possa ser apatrimonial, a prestação deve ser suscetível de avaliação em dinheiro.
O débito (schuld) é o dever de prestar e que não deve ser confundido com o objetivo da obrigação. O schuld é o dever que tem o sujeito passivo na relação obrigacional poderá ser um facere ou um dare ou um non facere.
Haftung há um princípio de responsabilidade e que permite ao credor carrear uma sanção sobre o devedor, sanção sobre o devedor, sanção que outrora ameaçava a sua pessoa e, hoje tem sentido puramente patrimonial.
Betti ensina que a responsabilidade é um estado potencial de dupla função: preventiva visto que cria uma situação de coerção, e a outra é de garantia, para assegurar a efetiva satisfação do credor.
Haftung é o fiador; debitum é o afiançado.
A obrigação natural e’um débito sem responsabilidade, isto é, é um dever sem garantia. Diferentemente da obrigação civil, pois temos de um lado o sujeito ativo, ou credor, e, de outro lado o sujeito passivo, o devedor, como objeto à prestação e o estabelecimento de um liame entre os sujeitos que contém uma garantia, o vínculo jurídico, que faculta aos reus credendi a mobilizar o aparelho do Estado para perseguir a prestação, com a projeção no patrimônio do reus debendi.
A obrigação natural é um tertium genus, uma entidade intermediária entre o mero dever de consci6encia e a obrigação juridicamente exigível, por isto, no meio do caminho entre moral e o direito.
É mais que um dever moral e menos que uma obrigação civil. Falta-lhe o poder de exigibilidade. O traço de distinção mais visível entre a civilis e a naturalis era a actio, presente na primeira e, ausente na segunda, e isto lhe retirava a qualidade de vínculo jurídico.
É uma obrigação civil degenerada. Era uma obrigação civil que perdia a actio e se convertia em natural. Mas em compensação, o direito lhe conferia a soluti retentio, cujo principal efeito era a retenção do pagamento não credenciando o devedor requerer a restituição.
O débito está contraído, mas não existe o haftung, porém, se o sujeito voluntariamente solve, reconhecendo-lhe, portanto a responsabilidade, o outro (credor) é protegido pela soluti retentio que não dá origem à obrigação, porém, consolida o seu efeito.
As obrigações propriamente ditas chamadas indevidamente de pessoais.É intruncada a questão quanto a categorias de direitos para uns como Demogue (que negam uma diferenciação fundamental entre os direitos de crédito e os direitos reais, afirmando ser uma só natureza de todos os direitos, só distintos entre si, pela intensidade (direitos fracos e direitos fortes). E outros, como Thon e Scholossman que entendem que a diversificação é artificial).
Outros, no entanto, filiados à corrente clássica (Vittorio Polacco) enxergam nos direitos uma relação de subordinação da coisa mesma ao seu titular, traduzindo um assenhoreamento ou dominação direta.
Alguns como Windscheid e Planiol situam a diferença respectiva da noção de relatividade dos direitos de créditos e absolutismo dos direitos reais.
Já a teoria personalista situa a diferença na caracterização do sujeito passivo – o devedor: o direito de crédito implica numa relação que se estabelece entre o sujeito ativo e passivo criando uma faculdade para aquele de exigir uma prestação positiva ou negativa.
Ao revés, o direito real, com o sujeito ativo determinado tem por sujeito passivo uma generalidade anônima de pessoas (pois é erga omnes).
A situação jurídica-creditória é oponível a um devedor enquanto que a situação jurídica-real é oponível a todos (erga omnes).
O direito de crédito realiza-se mediante a exigibilidade de um fato, a que o devedor é obrigado: o direito real efetiva-se mediante a imposição de uma abstenção, a que todos se subordinam. Na relação creditória, o objeto é um fato. Na relação real, o objeto é uma coisa.
A obrigação ius in re é devida pelo labor dos juristas canonistas conforme assinala Rigaud que erige uma terceira categoria que corresponde à obrigação stricto sensu ou propter rem.
Situamos assim como uma obrigação acessória mista. Quando a um direito real acende uma faculdade de reclamar prestações certas de uma pessoa determinada. Há uma relação jurídico-real em que se insere, adjeto à faculdade de não ser molestado, o direito a uma prestação específica.
Tem caráter acessória e mista, pois dotada de prestação especifica incrustada em um direito real. São as chamadas obrigações híbridas (uma mistura de direito pessoal com direito real) podem ser incluídas as com ônus reais e as com eficácia real. É também denominada de obrigação ambulatorial.
As normas de direito de vizinhança, a de condomínio, o IPTU, a conservação de tapumes divisórios, os ônus reais são obrigações que limitam o uso e gozo da propriedade, constituindo direitos reais sobre coisas alheias, oponíveis erga omnes.
Já as de eficácia real transmitem-se e são oponíveis a terceiros que adquire o direito sobre determinado bem, é o caso do art. 1.197 CC.
Obrigação de dar consistem na tradição constitutiva de direito, ou seja, a efetiva entrega da coisa com a transferência de domínio.
É bom lembrar que em nosso direito só se efetiva a transferência inter vivos da propriedade com a tradição quando for coisa móvel, ou através da inscrição do imóvel (que é uma tradição solene) quando se tratar de imóvel.
Na restituição, ocorre em todos os casos em que o detentor deve recambiar ao dono coisa havida temporariamente em seu poder como se dá na locação ou no penhor.
A classificação das obrigações em divisíveis e indivisíveis não tem em vista o objeto, porém este em atenção aos sujeitos, ou um deles, já que seu interesse somente se manifesta quando ocorre pluralidade subjetiva (Clóvis Beviláqua, Hudelot et Metmann). Pode-se, em linhas gerais, dizer que são divisíveis as obrigações suscetíveis de cumprimento fracionado, e indivisíveis as que somente podem cumprir-se na sua integralidade. O que se fraciona é prestação.
O legislador francês destacou, no entanto apenas duas indivisibilidades.
A indivisibilidade material e a jurídica, contrariamente a opinião de Colmo para quem toda a indivisibilidade é material.
A divisibilidade jurídica corre em paralelo com o fracionamento que o objeto pode suportar. E quando as partes em que se fracione não percam as características essenciais do todo e nem sofrem depreciação acentuada, e indivisível, o justamente oposto.
Casos há em que o imóvel, a exemplo do módulo rural não pode suporte divisibilidade em razão de lei, onde exista a fixação de um mínimo, temos aí a indivisibilidade jurídica, não obstante a divisibilidade material, resultante da impropriedade da coisa ao preenchimento de sua finalidade natural e sua destinação econômica.
A obrigação de restituir é, em regra, indivisível já que o credor não pode ser compelido a receber pro parte a coisa que se achava na posse alheia, salvo se nisto consentir.
Também a obrigação de fazer poderá ser divisível ou indivisível, dependendo se a realização do trabalho é por si mesmo friccionável.
A obrigação de não fazer é, via de regra, indivisível, pois sendo o devedor obrigado a uma abstenção, deve-a por inteiro, não sendo cabível ser parcelada.
Mas é admissíveis a divisibilidade da prestação negativa, e conseguitnemente da obligatio non faciendi, quando o objeto consiste num conjunto de omissões que não guardem entre si relação orgânica.
É lícita a convenção no sentido de tornar a indivisibilidade juridicamente divisível. Ou vive-versa, é o que chamamos de indivisibilidade convencional (e Barassi denomina de teleológica).
A regra, segundo o Código Civil de 1916, é a indivisibilidade da prestação ex vi o art. 889CC. Se há, todavia, pluralidade de sujeitos, quer ativa ou passivamente, decompõem-se a obrigação em tantas outras iguais e distintas, quanto os credores ou os devedores, se a obrigação for divisível (o art. 890CC) o caso de não haver estipulação em contrário.
Na unidade de devedor e de credor, a prestação é realizada na integralidade, a não ser que as partes tenham ajustados o contrário. Na pluralidade de sujeitos, a prestação reparte-se pro numero virorum, criando obrigações distintas, e recebendo cada credor do devedor comum, ou pagando cada devedor ao credor comum, a sua cota-parte – concursi partes fiunt.
Cada devedor se exonera pagando a sua parte. Porém, se ao contrário, a prestação é insuscetível de fracionamento, não tem qualquer devedor o direito de solver pro parte. Qualquer credor tem o poder de demandar o devedor pela totalidade da dívida (devedores solidários).
Para restabelecer o princípio de justiça que a solutio integral desequilibrou, o devedor solvente fica sub-rogado no direito do credor, em relação aos demais coobrigados. A fórmula de partilhar entre eles a responsabilidade é prescrita no título, e no silêncio deste mediante divisão em partes iguais. Consubstanciando que solidariedade não se presume, ou advém do contrato ou da lei.
Indivisibilidade e solidariedade substancialmente muito diferem, a par desta exteriorização comum, pois que numa e noutra a solutio pro parte não pode fazer-se, mas a prestação da dívida inteira; intimamente diversificam-se:
1º a causa da solidariedade é o título, e a da indivisibilidade é (normalmente) a natureza da prestação;
2º na solidariedade cada devedor pago por inteiro, porque deve por inteiro, enquanto que na indivisibilidade solve a totalidade, em razão da impossibilidade jurídica de repartir em cotas a coisa devida.
3ºa solidariedade é uma relação subjetiva, e indivisibilidade objetiva em razão de que, enquanto a indivisibilidade assegura a unidade da prestação, a solidariedade visa facilitar a exação do crédito e o pagamento do débito;
4º a indivisibilidade justifica-se, às vezes, com a própria natureza da prestação, quando o objeto é em si mesmo insuscetível de fracionamento, enquanto que a solidariedade é sempre de origem técnica, resultado ou da lei ou da vontade das partes, porém, nunca um dado real e concreto.
5º a solidariedade cessa com a morte dos devedores, mas a indivisibilidade subsiste enquanto a prestação suportar;
6º a indivisibilidade termina quando a obrigação se converte em perdas e danos enquanto que a solidariedade conserva este atributo.
A solidariedade para se vislumbrar é mister que haja concorrência de mais de um credor, ou de mais de um devedor, ou de vários credores e vários devedores simultaneamente. Aponta-se a unidade.
Não há solidariedade sempre que for incompatível com o fracionamento do objeto
Pluralidade subjetiva e unidade objetiva é a essência da solidariedade que numa obrigação em que concorram vários sujeitos ativos e passivos e haja uma unidade de prestação, ou seja, cada credor pode receber a dívida inteira e cada um dos devedores tem a obrigação de solvê-la integralmente.
A indivisibilidade que se opõe ao parcelamento da solutio, enquanto que a solidariedade não decorre ex re (da coisa), não provém da incindibilidade do objeto, mas possui origem puramente técnica, pode ser imposta pela lei ou pela vontade das partes.
O princípio consursu partes fiunt não se presume, a solidariedade convencional deve ser expressamente ajustada.
Alguns sistemas como o francês e o belga, admitem uma extensão da solidariedade afora legalmente previstos, a qual recebeu a denominação de solidariedade jurisprudencial ou costumeira, e não se acha acolhida pelo sistema pátrio.
Para nós, a obrigação solidária possui uma só natureza: uma obrigação com unidade objetiva. Na solidariedade existe unidade de prestação e unidade de vínculos. Mas há doutrinadores que entendem pela pluralidade de vínculos.
Não é a qualquer tempo que o pagamento feito ao credor solidário exonera o devedor, pois somente se ocorre antes da prevenção judicial.
A prevenção judicial tem sentido de exceção, sentida estritamente interpretada não pode ser ampliada para fora do âmbito literal do dispositivo.Merece a preferência àquele que tomou à iniciativa de perseguir a solutio. Perdura a prevenção judicial enquanto permanecem os efeitos jurídicos da demanda ajuizada.
Gisele Leite
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 06/09/2007