Um olhar indiferente a percorrer
silenciosamente o corpo
E as manchas de sangue
A imaginação transmutava o significado
das manchas.
Tal como faz com as nuvens
Então víamos o que
queriamos.
O carneiro, a borboleta
Ou a flor, ou pégasus
Nessa viagem de indiferença
e dor.
Nada importava.
Nem a situação.
Nem o atlas.
Nem a topografia.
E nem se existia oxigênio.
As vezes a falta de afeto
era isso asfixia
Lenta, gradual e cruel.
A nos mitigar as forças
A nos reduzir ao animal
que somos,
e do qual padecemos
Frutificado intensamente
Em outonos de perversidade.
A diversidade que nos atravessa
Os paradoxos indigestos
A queimar nosso estômago.
A palavra má grudada
em nossa boca.
O sentimento rancoroso
a escorrer pela garganta.
O ódio profundo
e a vontade homicida.
A morte do outro é um milagre.
Um lenitivo para a tragédia cotidiana.
Que por um dia, apenas um dia,
parou de sangrar.
Estancou-se, sem cicatrizar
Sem questionar o embrião.
Sem questionar o motivo.
E, o tambor da arma a girar
A fazer da morte incerta em imediata.
A fazer do giro mágico.
O eixo fatal.
O pequeno cano.
A pequena munição.
Tudo milimetricamente
perigoso.
Potencialmente prejudicial
Quero sentir essa
raiva.
A vontade de gritar sozinha
em meio ao deserto
E verter lágrimas secas e
exauridas
cansadas de tanto sofrer ou
imaginar
como poderia ser diferente.
Se o caminho fosse outro
Se a escolha fosse outra
Ou simplesmente a perversidade
fosse apenas diversa
e confessa de tanto
vínculo partido.
Depois, bem depois
que libertaram os escravos.
Depois, bem depois
que esqueceram os vassalos.
Depois, bem depois
que nos esqueceram no
baú de ossos quebrados.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 31/03/2018