Bicho no canto
prostrado,
catando imagens,
recolhendo semântica,
peneirando sentidos.
Comia avidamente símbolos.
Arrotava sonhos.
Rejeitava tristezas.
Um vi um bicho esquisito.
Todo encolhido.
Só tinha olhos
E, uma alma branda
a pairar livre
nos ventos do acaso,
nos medos encontrados.
Levitava.
Em encruzilhadas inóspitas.
Há tantos desertos no mundo.
Dentro das pessoas.
Dentro dos olhos.
Dentro da poesia.
Um monte de areia se desfaz
Outro monte de areia se refaz
E migram milhões de vezes
De um lado para outro.
De um enigma para um paradoxo.
Sem cessar.
E o tempo sólido ou líquido
a passar.
Escoando.
Por canos,
Por frestas,
por células.
por questionamentos,
por ampulhetas.
A derramar o sal
onde há fome.
A derramar o mel,
onde há primaveras.
Abelhas,
borboletas,
ratos
e vermes.
A confabularem no cenário.
A povoar os desertos.
Intensos desertos
repletos de vazios
e afetos perdidos.
Cada qual com uma sina
Cada um ensina e aprende.
E aprende a ensinar.
Então, conclui que
o infinito não há.
Um vi um bicho esquisito.
A amar sem ser amado.
A esperar sem ser esperado.
A se dedicar sem ser dedicado.
E, cuidando de um bicho
curando animalidades próprias,
sorvemos o sumo
de humanidade profunda
a se infiltrar em almas,
paredes, objetos,
sentimentos,
quadros pintados a óleo,
cimentos rebuscados,
e, poesias jogadas a esmo
para encontrarem
a lógica vadia de existir.
De existir simplesmente
como um
bicho esquisito.