Apostila de Teoria Geral do Direito - parte 1
Norma jurídica: conceito e estrutura
O artigo disseca a norma jurídica traçando-lhe conceito e estrutura, corresponde a um importante tema da Teoria Geral do Direito.
As doutrinas de Kelsen e Cossio e outros autores sobre a estrutura da proposição jurídica descrevem parcialmente as normas do Direito.
Ao lado das sanções punitivas, que acompanham o descumprimento da prestação, é necessário admitir a existência de conseqüências jurídicas positivas, decorrentes do cumprimento da prestação.
O primeiro problema que surge é terminológico, pois próprio Kelsen reconhece em sua segunda edição de sua Teoria Pura do Direito onde propõe a distinção entre norma jurídica e proposição jurídica. Estabelece a distinção entre a “a norma jurídica com uma função da autoridade criadora do Direito, e a proposição jurídica, como uma função da ciência jurídica, descritiva do direito”.
As normas são mandamentos e, como tais, comandos, imperativos (...) permissões atribuições de poder e competência.
As proposições jurídicas são os enunciados com os quais a ciência do Direito descreve esses comandos. Ou, nas palavras, de Kelsen, proposições jurídicas são juízos hipotéticos que enunciam ou traduzem que, de conformidade com o sentido de uma ordem jurídica. Sob certas condições com o sentido de uma ordem jurídica, devem intervir certas conseqüências determinadas pelo mesmo ordenamento.
Podemos vislumbrar a norma jurídica sob três aspectos:
• em si mesma, como fato ou imperativo social;
• a formulação dessa norma feita pelo legislador ou outra autoridade competente, mediante palavras,m proposições ou enunciados (ex: art. 121 CP);
• a descrição da norma ou referência à mesma, feito pelo estudioso ou por aqueles que lidam com o Direito.
Para Kelsen, as proposições jurídicas são, por exemplo, as seguintes: “Se alguém comete crime, deve ser-lhe aplicada uma pena; se alguém não paga sua dívida, deve-se proceder a uma execução forçada de seu patrimônio”.
A proposição jurídica liga entre si dois elementos:
* dados determinados pressupostos;
* deve efetuar-se um ato de coerção, sempre na forma estabelecida pela ordem jurídica.
Em si mesma, a norma é sempre uma disposição imperativa, proibitiva ou permissiva. E constitui como diz Carnelutti, um comando jurídico dirigido à conduta dos simples indivíduos, autoridades ou instituições da vida social.
A formulação da norma pelo legislador (ou outras autoridades) obedece às exigências da técnica legislativa, que têm objetivos práticos e não científicos. Muitas vezes, a mesma norma, como relativa ao homicídio, furto ou outro qualquer crime, receber formulações diferentes em legislações que se sucedem.
No pensamento kelseniano, a proposição jurídica1 é um juízo hipotético ou condicional em que o antecedente ou o pressupostos é o não-cumprimento de uma obrigação e o conseqüente é à disposição de que uma sanção deve ser aplicada. Ou, em termos simples: dada a não-prestação deve ser sanção.
Já a formulação de Cossio é mais ampla: “A norma jurídica completa (...) tem dois membros, aos quais propomos chamamos de endonorma (conceituação da prestação) e perinorma (conceituação da sanção), não só para terminar com o caos das designações das normas primária e secundária, que os diferentes autores utilizam com sentido oposto, mas também para salientar que se trata de uma norma única e não de duas normas, ponto indispensável para entender o conceito da norma jurídica como um juízo disjuntivo”.
No direito brasileiro atual o seguinte desdobramento: Se Kleber é eleitor, deve votar (endonorma) ou dado que Kleber é eleitor e não votou, deve ser-lhe aplicada uma multa (perinorma).
Para Kelsen, a norma jurídica propriamente dita é a que estabelece a sanção (a perinorma), que ele denomina norma primária.
A endonorma, que estabelece a prestação, é por ele denominada norma secundária, e considerada mero expediente técnico para fazer atuar a norma primária. Mas, de qualquer modo, Kelsen admite também a existência de duas proposições parciais – norma primária e secundária - na descrição da norma jurídica.
É na endonorma que encontramos o preceito.
Outros estudos sobre a estrutura lógica da norma ou proposição jurídica, dentre os autores que se têm ocupado do tema podem ser citados Kaufmann, Schreier, Kalinowski, Bobbio, García Máynez, Soler, Millas, Avelino Quintas, Calera, Mario Alberto Copello, Delia Echave, Maria Eugenia Urquijo e Ricardo Guibourg e, no Brasil, Machado Neto, Lourival Vilanova, Miguel Reale, Maria Helena Diniz, Paulo de Barros Carvalho, Marco Aurélio Greco e L. Fernando Coelho.
Apesar das diferenças acidentais, as teorias mencionadas de acordo num ponto fundamental: as normas jurídicas contêm em sua estrutura básica duas partes:
** uma endonorma, que estabelece a prestação;
** e uma perinorma, que estabelece a sanção.
Ambas admitem uma hipótese e um dever e podem ser descritas sob uma forma de uma proposição condicional.
A proposição descritiva, que enuncia um fato ou hipótese: Se Kleber é eleitor; e não votou (é o descritor);
Uma proposição normativa, que estabelece um dever. Kleber deve votar; Kleber deve ser multado (é prescritor).
Dada a hipótese, deve ser a prestação. Dada a não-prestação deve ser a sanção.
Tais hipóteses apenas se relacionam a parte sancionadora ou punitiva da norma, decorrente do não-cumprimento da prestação ou da obrigação devida.
Mas, se a obrigação for cumprida, haverá também efeitos jurídicos, assegurados pela norma. Ou seja, se o devedor pagar sua dívida, ele faz jus ao recibo regular de quitação e, sua conseqüente exoneração do vínculo obrigacional.
Daí, se classificar as sanções em negativas e positivas, sendo as positivas caracterizadoras do premio que tão bem descreveu Mario Copello, La sanción y el premio em el Derecho (Buenos Aires, Ed. Losada, 1945). Tanto a sanção como o prêmio é visto desde de sempre como tipos de meios de obter do homem o cumprimento de uma determinada conduta.
Luís Jiménez de Asúa tem mostrado que assim em paralelo ocorre com quase todas as antigas religiões, e o direito tem em suas formas sua primeira forma de expressão, entre os chineses, entre os assírios-babilônicos, entre os fenícios, os israelitas, os muçulmanos, os alemães etc. E hoje, basta recordar o cristianismo.
E no direito de nossa tradição greco-latina, também sempre o prêmio em alguma forma, há coexistido com a sanção. Grécia, Roma e o Direito Canônico, dentro dos mais variados exemplos de elos. E atualmente, fácil assinalar essa coexistência entre quase todas as legislações.
Para Llambrias de Azevedo (Eidética y aporética del Derecho) as retribuições das sanções se chamam penas para os castigos, quando consistem em prêmios ou recompensas quando consistem em benesses.
Seria uma deplorável mutilação apresentar o direito como implicando exclusivamente em modo de retribuição danosa, como a pena. A essência do direito implica na retribuição, mas esta não pode ser só no castigo como também não pode ser só na recompensa.
Para Montoro a descrição da norma jurídica deve incluir todos os seus efeitos, isto é, não apenas a sanção ou o castigo decorrente do não-cumprimento da obrigação, como também as conseqüências jurídicas positivas decorrentes do cumprimento da obrigação.
A descrição completa da norma jurídica pode ser resumida em três elementos básicos:
* a endonorma que estabelece a prestação;
* uma ou mais perninormas que estabelecem as conseqüências jurídicas negativas do não-cumprimento da prestação: a multa, o impedimento de retirar passaporte, a nulidade do ato;
* Uma ou mais perinormas que estabelecem as conseqüências jurídicas positivas do cumprimento da prestação.
Cada endonorma ou perinorma tem a estrutura de uma proposição condicional constituída de duas proposições simples; uma antecedente, simplesmente enunciativa, que descreve a hipótese (descritor): Kleber é eleitor; outra conseqüente, normativa, que prescreve um dever jurídico (prescritor): Ele deve votar.
Entre a endonorma e as perinormas há uma relação de conseqüência, expressa numa proposição condicional, mais ampla, em que o antecedente é a endonorma e o conseqüente é uma proposição composta de diversas perinormas. Exemplos: Se Kleber é eleitor, deve votar, em conseqüência, se ele não votou, não poderá prestar concurso público, ou se Kleber votou poderá prestar concurso, obter passaporte, etc.
A proposição constituída pelas perinormas é uma disjuntiva em que uma das alternativas é a proposição relativa ao não-cumprimento da prestação e suas conseqüências punitivas e outra alternativa é a proposição relativa ao cumprimento da prestação e suas conseqüências positivas.
Questionando sobre a estrutura lógica da disposição das normas fundamentais, particularmente, as constitucionais, podemos observar as mais diversas posições doutrinárias, sendo insuperável a superioridade do comando jurídico inserido na norma fundamental com relação ao poder dispositivo das demais normas.
Para Kelsen, a estrutura da norma jurídica constitucional se reduziria exclusivamente à seguinte proposição hipotética ou condicional: se os princípios constitucionais não forem respeitados, a norma deve ser considerada inconstitucional e não válida. Só ela teria caráter jurídico propriamente dito. Só ela esgotaria toda a realidade jurídica. É exacerbada tal visão doutrinária.
Para Carlos Cossio, a estrutura da norma fundamental se traduziria na seguinte proposição: Ocorrendo a elaboração de qualquer norma jurídica, ela deve respeitar os princípios constitucionais (endonorma).
Se tais princípios não forem respeitados, a norma deve ser considerada inconstitucional e não válida (perinorma = uma sanção, aliás, em direito civil a nulidade ou a invalidação dos atos é uma sanção bem típica).
Dada a elaboração de qualquer norma jurídica, ela deve respeitar os princípios constitucionais (endonorma), em conseqüência se estes forem desrespeitados, a norma deve ser considerada inconstitucional e não válida (perinorma relativa às conseqüências negativas) ou, se tais princípios forem respeitados, a norma deve ser considerada constitucional e válida (perinorma relativa às conseqüências positivas).
Tal formulação ampla corresponde integralmente à diversidade de situações jurídicas reais, cobertas por essa norma constitucional. É diante dessas diversas alternativas jurídicas que se encontrará, por exemplo, o Supremo Tribunal Federal para decidir sobre a constitucionalidade de qualquer lei ou outra norma jurídica, impugnada por desrespeitar os princípios constitucionais.
Não podemos reduzir a guisa do que pretende Kelsen a norma constitucional a declaração da inconstitucionalidade. Existe o caráter estritamente jurídico da endonorma, que é o fundamento da decisão do tribunal no caso. E, da mesma forma, é inadmissível que se negue caráter e efeito jurídico relevante à proposição que reconheça a constitucionalidade da norma, por respeitar os princípios constitucionais (perinorma referente às conseqüências positivas do cumprimento da prestação).
A posição de Cossio, embora mais abrangente que a de Kelsen, parece-nos também insuficiente. Nada nos autoriza, a excluir da estrutura da norma jurídica a proposição relativa às conseqüências positivas decorrentes do cumprimento da prestação.
Na vida real do Direito, é presente a alternativa que se oferece aos indivíduos e às instituições é o cumprimento ou não das prestações ou obrigações devidas. A disjunção se dá ente essas duas hipóteses simétricas, e não entre a norma e algumas de suas conseqüências.
A questão da estrutura da norma jurídica relaciona-se com a função do direito não se limita a aplicar sanções repressivas. O fim do Direito é ordenar a vida da sociedade, orientando a conduta de seus membros e a atividade de suas instituições. Para esse objetivo, ele estabelece normas e procura garantir a eficácia das mesmas, atribuindo conseqüências positivas a seu cumprimento e negativas ou punitivas à sua violação. Ver no Direito um mero aplicador de sanções punitivas é diminuí-lo.
Kelsen reconhece que as normas de uma ordem jurídica regulam a conduta humana, onde a autoridade jurídica prescreve uma determinada conduta apenas porque a considera valiosa para comunidade jurídica dos indivíduos. As modernas ordens jurídicas também contêm, para determinados serviços, como títulos e condecorações.
Estas, porém (...), desempenham apenas um papel inteiramente subalterno dentro destes sistemas, que funcionam como ordens de coação, conduta proibida, contrária ao direito e que, por isso, deve ser impedida devendo a conduta oposta – socialmente útil, desejada, conforme o direito – ser fomentada.
Até mesmo o sentido amplo de sanção, aplicado às penas e aos prêmios, pode ser encontrado em Kelsen “O sentido de ordenamento traduz-se pela afirmação de que, na hipótese de determinada conduta (...) deve ser aplicada uma sanção (no sentido amplo de prêmio ou de pena)”.
Ademais inúmeras ciências tais como a pedagogia, a psicologia e as ciências sociais sublinham a importância primordial dos estímulos positivos, mais do que a dos aspectos punitivos, na obra da educação ou da orientação do comportamento humano.
O Direito não se limita a punir2. Pelo contrário, sua tendência maior, mais moderna e científica é no sentido de incentivar, premiar e assegurar a execução espontânea de seus preceitos.
Como observa Bobbio, no estado contemporâneo torna-se cada vez mais freqüente o uso de técnicas de encorajamento.
O Direito não tem apenas a função repressiva que lhe atribui a concepção do estado-Polícia. A tarefa do direito é mais ampla e pode ser resumida na fórmula clássica suum cuique tribuere.
Visa cada vez mais o Estado assegurar a justiça social, distributiva e comutativa na vida coletiva, o Direito é o grande instrumento de promoção do bem comum. Sua função é fundamentalmente promocional. Por isso, estabelece sanções repressivas para a violação de suas normas e conseqüências positivas para estimular o cumprimento das mesmas.
Bobbio analisa detidamente a função promocional do Direito e as sanções positivas, temas que considera fundamentais para adequar a Teoria Geral do Direito às transformações da sociedade contemporânea e ao desenvolvimento do Estado Social ou Estado do Bem-Estar.
Adendos
1. A teoria da norma-base foi formulada e defendida por Kelsen. É todo conhecimento conduz à unidade. Partindo desta afirmação, ele construiu a teoria da pirâmide ou dos degraus. A validez de uma norma depende da que lhe é imediatamente superior. No vértice da pirâmide estaria situada a norma fundamental. Para Kelsen, a norma fundamental é uma hipótese que não necessita de prova. Mais tarde Kelsen rejeitou a teoria da pacta sunt servanda.
2. Nem mesmo o Direito Penal se limita a punir, embora seja um tanto nebuloso enfocar o seu objeto próprio de estudo.
Bibliografia indicada para complementar à compreensão
Ferraz Júnior, Tércio Sampaio, Introdução ao estudo de direito: técnica, decisão, dominação, Editora Atlas, SP, 1994.
Bergel, Jean-Louis, Teoria geral do direito, Martins Fontes, SP, 2001.
Bobbio, Norberto, Teoria de la norma giuridica, Torino, Giappichelli, 1958.
Montoro, André Franco, Estudos de filosofia do direito, Saraiva, SP, 1999.
Complementação do direito natural ao direito positivo
1. Introdução
O presente trabalho pretende analisar os conceitos e a finalidades do direito natural e do direito positivo, traçando um histórico em torno das definições e conceitos de renomados pensadores. Acolhe igualmente pontos apresentados pelo diferentes Códigos evidenciando a evolução destes conceitos e sua influ6encia notadamente no direito atual.
2. Histórico
Duas correntes importantes permearam a história do direito, o naturalismo e o positivismo. Entre nós, vimos o positivismo até na bandeira nacional principalmente no lema “Ordem e Progresso”, por Augusto Comte.
Na época clássica o direito natural não era considerado superior ao positivo, de fato, o direito natural era concebido como sendo um direito comum enquanto, o positivo como direito especial, assim sabido é que o particular prevalece sobre o geral. O direito positivo prevalecia sobre o natural sempre que ocorresse um conflito.
Na Idade Média, ocorreu a subversão quando então o direito natural sobrepujou ao direito positivo. Sendo que o direito natural tratado como norma fundada na vontade de Deus e, que deveria se aplicar à razão humana.
Desta forma, adquiriu o direito natural uma inspiração cristã que se fez presente no pensamento jusnaturalista e o projetou acima do direito positivo.
O direito natural é um código paralelo aos códigos positivos. Ao lado de cada norma positiva teríamos uma norma do direito natural. O Direito Natural é formado por um conjunto de princípios fundamentais do Direito positivo.
Entre os princípios que constituem o Direito natural temos entre outros: o bem deve ser feito, não lesar a outrem, dar a cada um o que é seu, respeitar a personalidade do próximo e as leis da natureza. Na verdade, o Direito natural é o princípio da razão do Direito positivo, o direito natural é, portanto, o fundamento da ciência jurídica.
Desta forma, os jusnaturalistas acreditavam ser o direito natural um direito permanente e eternamente válido, independente de legislação, convenção ou qualquer outro expediente imaginado pelo homem.
Heráclito acreditava que todas as leis humanas estavam subordinadas à lei divina do Cosmos. E assinalava que a Justiça era resultado permanente da tensão social, que jamais seria definitivo e sim sempre renovável. Quase no mesmo sentido se inclinou Aristóteles, que integrou a lei positiva ao Direito Natural.
Mas até aonde o direito identifica-se com o justo? Para a generalidade dos seguidores do positivismo, o direito se reduz a uma imposição da força social e a justiça como entendia Kelsen seus critérios são simplesmente emocionais e subjetivos e sua determinação é mais metafísica do que científica. Daí, concluímos que a justiça enquanto elemento e conceito da ciência jurídica pode ser meramente histórica ou política.
Seria a Justiça uma virtude fundamental, como acreditavam os naturalistas?
Seria a justiça dar ao outro o que lhe é devido seguindo uma igualdade.
A igualdade é elemento essencial e básico, já assinalava Aristóteles ser a Justiça uma igualdade e uma injustiça uma desigualdade.
A igualdade seria, pois uma equivalência de quantidades, é certo que não se trata de estabelecer identidade e uniformidade, pois que a absoluta igualdade e identidade é fruto de suprema utopia e não tem esteio na realidade. É a equivalência de ordem, de natureza no aspecto moral.
Os estoicistas colocavam o conceito de natureza no centro do sistema filosófico. Para eles, o Direito natural era idêntico a lei da razão, e os homens, enquanto parte da natureza, eram uma criação essencial racional. A base, portanto, é o direito natural é a razão que preside tudo que é universalmente válido em toda a natureza. Seus postulados são obrigatórios para todos os homens tementes ou não a Deus.
Tal doutrina mais tarde foi reestruturada por Cícero que veio a tornar o direito estóico prático dentro do contexto do direito romano.
Muitas formulações estóicas são encontradas entre os pensamentos de Platão e de Aristóteles. Contudo, a obscura doutrina dos estóicos fez com que a estrutura não se fundamentasse, o que para os dois filósofos gregos era algo indiscutível.
Cícero será o maior representante deste período clássico do Direito Natural. Que o interessa a Cícero é o direito e não a lei. Nasce o Direito da própria natureza e não do arbítrio ou esperteza humana.
O pensamento cristão primitivo é o herdeiro natural do Estoicismo e da Justiça Romana. Aliás, na idade medieval a distinção entre direito natural absoluto e relativo é completamente estóica. O absoluto era o ideal que imperava naturalmente na natureza, onde todos os homens eram iguais e possuíam todas as coisas em comum, não havia governo e nem a dominação do homem sobre o homem. Era o éden.
Já o relativo, ao contrário, eram princípios jurídicos adaptados à natureza humana após o pecado original.
Santo Agostinho reinterpretando vários textos clássicos juntamente com São Tomás de Aquino mostraram maior interesse na realidade ao esboçarem o conceito de direito natural relativo eivado de ideais cristãos.
É, pois o Direito natural à vontade divina e a partir da Escola de Grotius é à vontade da razão.
E mais, tarde, com Jean Jacques Rousseau, confirmando o direito natural como a vontade geral.
Na época do jusnaturalismo abstrato, a explicação de tudo é encontrada no próprio homem, na própria razão humana, nada de objetivo é levado em consideração, a realidade social, a História, a razão humana se tornam uma divindade absoluta.
Para Locke, a lei natural é uma regra eterna para todos, sendo evidente e exigível para todas as criaturas racionais. Portanto, a lei natural é a lei da razão.
Nos séculos XVIII e XIX tais ideais e razão sedimentaram uma nova ordem jurídica baseada em princípios de igualdade e liberdade como postulados da razão e justiça.
É certo que o ideal de justiça fez muitas cabeças rolarem coroadas ou revolucionárias, mas também é certo, que tais princípios evoluíram e fundamentaram certos direitos como unívocos e imutáveis e irrenunciáveis.
A teoria pura do Direito restringe-se a analisar a lei positiva baseada nas regras sociais que atualmente existem e existiram na história sob o nome de lei. A origem da lei dentro da estrutura criada pela direito se preocupa em adjetivá-la e classificá-la em justa ou injusta. A justiça e a lei são, no entanto dois conceitos diferentes.
O direito positivo teve apoio em especial em Hegel, e com o método experimental de Francis Bacon e ainda com o materialismo de Thomas Hobbes. O pensamento moderno notadamente o da segunda metade do século passado e a primeira do século atual sofreu considerável influência pelo positivismo jurídico onde a concepção de direito nasce como direito próprio, e onde há a exclusão do direito natural.
A concepção positivista primeiramente refere-se a um sistema de idéias filosóficas fundado pelas bases de Comte e propagado por seu fiel discípulo Emile Lettré.
Nenhum setor dos conhecimentos humanos ficou isento da influência do positivismo. E, foi definido por um atitude mental que visa dar à filosofia o método positivo das ciências e às ciências a idéia de conjunto da filosofia. Na verdade era a positivação da essência e ateorização do eminentemente prático.
Houve um grande repúdio a metafísica entendendo-se que esta era toda a proposição que excedesse ao domínio da experiência e da observação humana dos fatos sensíveis.
Baseia-se no fato de não conhecermos nem a essência e nem o modo de produção de nenhum fato, mas, somente conhecemos as relações de sucessão e semelhança de uns fatos com outros. E através da teoria cíclica observamos sua repetição sob determinadas circunstâncias.
Tais semelhanças ligam os fenômenos entre si, traçam-se sucessões invariáveis eis o que se dá o nome de leis.
Além da profunda crítica ao direito natural e a fim de alcançar sua dessacralização, importante papel teve o historicismo alemão.
Como consagrar a complementação do direito positivo provido pelo direito natural.
Considerações sobre personalidade, pessoa e os direitos da personalidade no Direito Civil Brasileiro
É um dos temais relevantes para a Teoria Geral do Direito a questão da personalidade jurídica, pois ao regular sua caracterização, obramos a premissa de todo e qualquer debate inserido no âmbito do direito privado.
É forçoso admitir que todo ser humano e destinatário final da norma, portando o estudo da personalidade jurídica é primafacie tanto da pessoa natural como da pessoa jurídica.
Em psicologia entende-se por personalidade, a estrutura ou a silhueta psíquica individual, ou mais amiúde, “o modo peculiar de ser eu”.
No Dicionário eletrônico de Psicologia está consignada a seguinte significação sobre personalidade, in verbis:
[De personal(i)- + -dade.]
S. f. Psicologia. Organização constituída por todas as características cognitivas, afetivas, volitivas e físicas de um indivíduo. Personalidade de base: Sociologia. Configuração psicológica própria dos membros de uma determinada sociedade, e que se manifesta por um certo estilo de vida. Personalidade psicopática: Psicol.1. Personalidade caracterizada por tendência constitucional ao desenvolvimento de uma psicose.
É certo que a personalidade para Teoria Geral do Direito não é um direito, é, de fato, o que apóia os direitos e deveres que dela irradiam, é objeto de direito, o primeiro bem da pessoa, para que a pessoa seja o que exatamente é.
San Tiago Dantas doutrinador arguto preleciona que personalidade jurídica é “uma ossatura destinada a ser revestida de direitos” Sem dúvida, a personalidade é parte integrante da pessoa permitindo que o titular venha adquirir, exercitar, modificar, substituir, extinguir ou defender interesses.
Francisco Amaral consagra a personalidade jurídica como valor jurídico que se reconhece nos indivíduos e em grupos legalmente constituídos materializando-se na capacidade jurídica.
A preleção de Clóvis Beviláqua adiantava: “a personalidade jurídica tem por base a personalidade psíquica (...)” Mas obtempera que não se confundem o conceito jurídico e o conceito psicológico de personalidade.
É óbvio que se enxerga na personalidade jurídica a projeção de personalidade psíquica, ou outro campo onde esta se afirma, dilatando-se e adquirindo novas qualidades.
Há na personalidade jurídica intervenção de um elemento a ordem jurídica, do qual depende essencialmente, e do qual recebe a existência, forma, extensão e força ativa operante. A personalidade jurídica além de psíquica, é, pois uma criação social posta em movimento pelo aparelho jurídico, é portanto moldada pela ordem jurídica.
Para Teoria Geral do Direito traduz-s a personalidade por ser aptidão genérica para titularizar direitos e contrair obrigações, é atributo necessário para ser sujeito de direito.
Esclarece Ulhoa que sujeito de direito é gênero e pessoa é espécie, isto é, nem todo sujeito de direito é pessoa, embora toda pessoa seja sujeito de direito. Sujeito de direito é o titular dos interesses em sua forma jurídica, é o centro de imputação de direitos e obrigações, se referindo as normas jurídicas com a finalidade de orientar a superação de conflitos de interesses que envolvem, direta ou indiretamente, homens e mulheres.
Os conflitos de interesses ainda que mediados por titulares não humanos, dão-se sempre entre humanos. A complexidade das relações econômicas e sociais, contudo, exige do direito a construção de conceitos abstratos, destinados a dar forma jurídica para a titularidade dos interesses. Nem todo sujeito de direito é pessoa e nem todas as pessoas, para o direito, são seres humanos.
Quando, por exemplo, o condomínio edilício é sujeito de direito, está tratando de modo racional a convergência de interesses dos homens e mulheres que moram num mesmo edifício. São sujeitos entre outros as pessoas naturais (homens e mulheres nascidos com vida), as pessoas jurídicas (sociedades empresárias, cooperativas, fundações etc.), o condomínio edilício, a massa falida e outros. Todos esses aptos a titularizar direitos e obrigações em variadas medidas e se cumpridas diferentes formalidades.
Os sujeitos de direito podem ser pessoas (personificados) ou não (despersonificados). A pessoa pode fazer tudo o que não está proibido. Já os sujeitos não personificados podem praticar somente os atos inerentes à sua finalidade (se possuírem uma) ou para os quais estejam especificamente autorizados.
A nova tábua axiológica preconizada pela Constituição Federal Brasileira vigente baseada na afirmação da cidadania e dignidade da pessoa humana, como valores supremos, dá um contorno mais amplo a personalidade que não se esgota na possibilidade de o titular ser sujeito de direitos, mas por igual, relaciona-se com o próprio ser humano.
Não é apenas um novo reduto de poder do indivíduo, nem apenas o valor máximo modelador da autonomia privada, sobretudo é capaz de submeter toda atividade econômica a novos critérios de validade.
A personalidade jurídica é também valor ético de origem constitucional especialmente relacionada com a dignidade da pessoa humana inserida num contexto social. O reconhecimento da personalidade jurídica imposta no reconhecimento dos direitos que tocam ao ser humano desde sua existência.
Conexo ao conceito de personalidade esclarecer o autor que escreve sempre com clareza solar, Cristiano Chaves de Farias, porém, sem com este conceito se confunda , surge a idéia de capacidade.
Enquanto a personalidade é generalizante, reconhecida como valor jurídico atribuído a todos os seres humanos (e também aos grupos) exprimindo a idéia de aptidão genérica, a capacidade jurídica concerne à possibilidade daqueles que são dotados de personalidade a praticarem pessoalmente os atos da vida civil.
É possível se reconhecer a personalidade jurídica sem capacidade, é o caso do recém-nascido. No que tange à pessoa natural ou física, o Código Civil Brasileiro de 2002 substitui a expressão “homem” por “pessoa”, entrando na vertente da linguagem politicamente correta, e compatível coma nova ordem constitucional paritária (art. 1º., do C.C./2002).
Daí se infere que a personalidade é atributo de toda e qualquer pessoa (seja natural ou jurídica) vez que a norma substantiva não faz tal distinção. Consideram-se, assim, direitos da personalidade aqueles direitos subjetivos reconhecidos à pessoa, tomada em si mesma e em suas necessárias projeções sociais.
As pessoas são, a priori, capazes e podem, assim, praticar os atos e negócios por si mesmas. Como ensina Caio Mário a capacidade é a regra e a incapacidade a exceção.
A incapacidade é situação excepcional prevista expressamente em lei com objetivo de proteger determinadas pessoas. Os incapazes são considerados, por lei, não inteiramente preparados para dispor e administrar seus bens e interesses sem a mediação de outra pessoa (representante ou assistente).
Com relação aos direitos fundamentais ou direitos da personalidade é pontual frisar que não há eficácia direta e imediata das normas constitucionais de direito privado, mas sim uma complementação do preceito geral por um mais específico.
Ex positis, os direitos fundamentais são diretrizes gerais, garantias de todo o povo – como sociedade em se ver livre do poder excessivo do Estado, enquanto os direitos da personalidade que são frutos da captação desses valores fundamentais regulados no interior da disciplina civilística.
Os direitos fundamentais desempenham as funções normais, como proibições e imperativos da tutela. O desprestigio da dignidade da pessoa humana somado a inúmeros atentados contra a personalidade por particulares em razão dos progressos técnicos da era moderna, os tribunais da Alemanha do pós-guerra passaram a agir em proteção da pessoa humana utilizando-se de artigos da Constituição Federal, numa forma de dever geral de personalidade.
Alguns direitos da personalidade tratados no relacionamento entre Estado e cidadão recebem o nome de liberdades públicas, sendo os direitos de personalidade do ponto de vista da tipificação, mas analisados em planos distintos; As liberdades públicas são acrescidas de outros direitos econômicos, sociais e políticos.
Assevera Tepedino que as regras constitucionais condicionam o intérprete e o legislador ordinário, modelando o tecido normativo infraconstitucional com a tábua axiológica eleita pelo constituinte, dando uma releitura aos direitos da personalidade e afirmando a presença de uma autêntica cláusula geral de personalidade ( a dignidade da pessoa humana).
Os direitos de personalidade ultrapassam a clássica distinção dicotômica de público e privado. Assim, consagra Cristiano Chaves de Farias que os direitos da personalidade são atinentes à tutela da pessoa humana, considerados essenciais à sua dignidade e integridade.
Caracterizam-se tais direitos pro serem absolutos, indisponíveis, relativamente imprescritíveis e extrapatrimoniais.
São absolutos posto que sua eficácia erga omnes, oponível a todos impondo a coletividade o dever de respeitá-los. È um dever geral de abstenção dirigido a todos. Sua relativa disponibilidade impede que o titular possa deles dispor em caráter permanente ou total, preservando a sua própria estrutura física, psíquica e intelectual.
Assim, é que o art. 11 do C.C.de 2002 dispõe que com exceção dos casos previstos em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis. No entanto, é permitido ao titular ceder o exercício e não a titularidade de alguns dos direitos da personalidade.
È o caso do direito de imagem que pode ser cedida à título oneroso ou gratuito durante certo lapso temporal. E nesse sentido o Enunciado 4 da Jornada de Direito Civil CFJ não aceita a limitação voluntária que seja permanente ou geral aos direitos da personalidade.
Admite-se, outrossim, a doação de órgãos humanos duplos, bem como a cessão dos direitos autorais o que bem denota a relativa indisponibilidade de tais direitos.
Cristiano Chaves de Farias relata evento curioso que se deu em França, num prosaico jogo de “arremesso de anões”, no qual as referidos seres humanos eram arremessados à distância por canhões de pressão.
A Casa Judicial francesa impôs uma vedação administrativa impondo proibição dessa diversão pública, contra tal ato, os anões em litisconsórcio com os promotores do jogo propugnaram requerendo a liberação do certame.
O que fez a Casa Judicial francesa reconhecer que o respeito à dignidade humana, é conceito absoluto e que não pode cercar-se de concessões e nem de apreciações subjetivas de cada um.
Por sua natureza intrínseca, a dignidade da pessoa humana está fora do comércio. Afora isto, garante o caráter de imprescritibilidade que a lesão ao direito da personalidade venha convalescer com decurso do tempo.
Curial é não confundir a imprescritibilidade da lesão do direito da personalidade, com prescritibilidade da pretensão indenizatória de eventual dano decorrente da violação do direito da personalidade e que ocorre normalmente em três anos (art. 206, § 3º, V C.C.).
É imprescritível o exercício do direito da personalidade, e sua respectiva pretensão garantidora desse exercício. Mas não é imprescindível a pretensão que busca indenização pecuniária por dano sofrido.
Outras duas características dos direitos da personalidade são assinaláveis, a saber: a essencialidade e a preeminência indicando expressamente a tutela preferencial em face da essencialidade de seu objeto.
Por derradeiro, classificamos também os direitos da personalidade como vitalícios extinguindo-se naturalmente com a morte de seu titular. Não obstante se reconhecer também os direitos de personalidade dos mortos conforme bem assinala o parágrafo único do art. 12 do C.C. de 2002, legitimando os chamados lesados indiretos a reclamar quer a tutela repressiva, quer a tutela inibitória.
Convém discernir os direitos da personalidade que são estudados na órbita do direito privado das chamadas liberdades públicas que são estudadas propriamente na órbita do direito público.
Enquanto que os direitos da personalidade são garantias mínimas da pessoa humana para suas atividades internas e respectivas projeções para a sociedade.
Por outro lado, as liberdades públicas são condutas individuais ou coletivas de forma autodeterminada mediante a autorização explícita ou implícita conferida pelo Estado, é a garantia mínima da cidadania.
Os direitos da personalidade são tendentes a assegurar a integral proteção da pessoa humana em múltiplos aspectos (corpo, alma e intelecto).
A classificação dos direitos da personalidade criteriza-se nos aspectos fundamentais da personalidade que são: a integridade física (direito à vida, ao corpo, à saúde, a inteireza corporal, direito ao cadáver); a integridade intelectual (direito à autoria, científica ou literária, a liberdade religiosa e de expressão), e demais manifestações do intelecto e, a integridade moral ou psíquica (direito à privacidade, ao nome, à imagem, etc.).
Considerando o alto estágio tecnológico da ciência, é mister afirmar um direito geral de personalidade, impedindo o exaurimento das espécies de direitos da personalidade que não podem ser esgotados e nem mesmo limitados. Frise-se que nenhum direito subjetivo sobrevive como completamente absoluto pelo imperativo da sociabilidade.
Trabucchi com sua notável sensibilidade reconhece um direito geral da personalidade reportando-se ao 2º, da Constituição Italiana in verbis: ”A República reconhece e garante os direitos invioláveis do homem, seja como sujeitos singulares ou considerados na formação social onde desenvolve sua personalidade, e, por isso, requer a observância dos deveres inderrogáveis de solidariedade política, econômica e social.”
O mesmo fez o art. 1º, inciso III da Lei Maior brasileira, permitindo a cláusula geral protetiva e seu reconhecimento em qualquer situação concreta.
O direito à vida, como direito da personalidade nos remete a um direito à vida digna. O art. 1º, III da CF/1988 é uma autêntica cláusula geral de proteção da personalidade que é também encontrada no ordenamento português e italiano.
O Direito Civil Contemporâneo é marcado pela despatrimonialização do direito privado e a necessária repersonalização do ser humano merecendo uma tutela privilegiada, multifacetada e abrangente.
É sempre bom lembrar que a defesa da vida com dignidade é objetivo constitucionalmente assegurado pelo Poder Público.
A necessária vinculação da noção de direitos da personalidade com a noção dos direitos humanos acaba por derrubar o muro de Berlim que antes separava inexoravelmente o direito público do direito privado.
Em face da multiplicidade de situações que se expõe a pessoa humana no mundo pós-moderno somente o reconhecimento de uma cláusula geral de proteção de forte conteúdo principiológico, a ser preenchido no caso concreto pela jurisprudência auxiliada pela doutrina, é capaz de garantir, eficazmente a tutela da pessoa humana.
O direito à integridade física refere-se à proteção jurídica do corpo humano (incluindo o corpo vivo e o corpo morto), além de tecidos, órgãos e partes sucessíveis de separação e individualização.
Tal proteção tem início desde a concepção até a morte. Porém, convém lembrar as disposições legais sobre o cadáver previstas na Lei 9.434/97 que exige a manifestação de vontade para haver doação de ser órgãos para depois da morte. Não a havendo em vida, tal direito transmite-se para os herdeiros ( vide ainda art. 14 C.C./2002).
As partes do corpo (seja vivo ou morto) integram a personalidade humana, caracterizando coisa extra commercium sendo vedado ato de disposição oneroso (art. 199, § 4º, CF, art. 1º, da Lei 9.434/97). Sendo admitida a disposição gratuita para fins terapêuticos e não causar prejuízo ao titular.
É perfeitamente possível perante o Direito de partes destacáveis do corpo humano renováveis (leite, medula, óssea, pele, óvulo, esperma, fígado) ou não, para salvar a vida ou preservar a saúde do interessado ou de terceiros, ou para fins científicos ou terapêutico, sempre a título gratuito conforme exige a lei.
É curial distinguir a doação em vida da doação post mortem. O art. 9º, da Lei 9.434/97 permite à pessoa maior e capaz dispor de pessoa de seu corpo, de forma gratuita para fins terapêuticos ou de transplantes e, se não importar em risco de vida ou a saúde do doador.
Somente as partes do corpo renováveis podem ser objeto de doação em vida. Deve tal doação preferencialmente ser feita por escrito.
No entanto, se o devedor for incapaz será necessária a autorização judicial com a prévia oitiva do MP de modo a preservar os interesses do incapaz.
Na doação em vida é possível a escolha do beneficiário, diferentemente da doação post mortem, onde o caráter altruístico é mais intenso e imposto pelo art. 2º, § único da Lei 9.434/97 e art. 24 § 1º, ao § 5º., do Dec. 2.268/97 que impõe fila de espera.
A morte que se refere à legislação atinente é encefálica que é detectada pela cessação definitiva da atividade cerebral. A nova dicção legal do art. 4º, da Lei 9.434/97 alterou a regra ab initio promulgada que permitia a chamada doação presumida, assim a Lei 10.211/2001 passou a exigir a autorização expressa do cônjuge, companheiro ou parente próximo, se não houve doação em vida pelo titular.
Ulhoa esclarece que se em vida o titular expressa vontade de não ser doador em hipótese nenhuma, não poderá seus familiares autorizá-la. A lei reconheceu a plena eficácia do ato apesar do sumário egoísmo.
Em que pese outras ponderações são distintos os conceitos referentes a transplante que consiste na amputação ou ablação de órgão, com função própria, de organismo para ser instalado em outro, no qual cumprirá as mesmas funções. Temos como exemplos: os transplantes de córneas, de rim, de coração e, etc...
Enxerto, por sua vez, é a retirada de porção orgânica para ser instalada no mesmo organismo é exemplo clássico as “pontes de safena”. Implante se caracteriza pela integração de tecidos mortos ou conservados no corpo de alguém. A norma que disciplina a matéria, no entanto, não diferencia um procedimento de outro.
Importantíssimo lembrar que é indispensável para a retirada de órgãos humanos post mortem, que o falecido venha devidamente identificado pelos documentos listados pelos
§ 1º, ao 6º, do art. 14 do Dec. 2268/97 e, ainda, arts. 5º, e 6º, da Lei 9.434/97.
A realização de cirurgias em transexuais que pretende redefinição do estado sexual é reputada proibida conforme uma primeira leitura do art. 13 do Código Civil, embora represente tal dispositivo legal uma afronta a garantia da dignidade da pessoa humana. Pois o transexual possui direito da personalidade que é o direito à integridade física e psíquica.
O paciente transexual encontrará o equilíbrio emocional, e se livrará das tormentosas angústias quando finalmente redefinir o seu sexo. Recentemente, em 2002, o conselho Federal de Medicina (CFM) editou a Resolução 1.652 que autoriza as cirurgias de mudanças de sexo também chamadas de transgenitalização, em casos de transexualismo comprovado. Exigindo-se que o paciente tenha mais de 21(vinte e um) anos e deve ter diagnóstico comprovado clinicamente de seu transgenitalismo e, ainda não possuir o paciente características físicas inapropriadas para a cirurgia.
Além disso, deverá a cirurgia ser antecedida necessariamente de laudo de equipe médica composta de psiquiatra, cirurgião, endocrinologista e psicólogo e, ainda, assistente social que avaliará o paciente transexual pelo menos por dois anos contínuos.
A cirurgia do feminino para o masculino só poderá ocorrer em hospitais universitários ou públicos. Já a cirurgia do masculino para o feminino, no entanto, só poderá ocorrer em hospitais públicos ou privados, independente de atividade de pesquisa (arts. 5º, e 6º, da Resolução CFM 1652/2002) e, ambas as hipóteses cirúrgicas independem de autorização judicial.
Ultimada a cirurgia, tem-se obviamente que se adequar o estado sexual registral e o nome do paciente que se fará por meio de jurisdição voluntária perante o juízo de família (ação de estado) acobertada pelo segredo de justiça.
Há Projeto de Lei 70-B de autoria do deputado José Coimbra que pretende disciplinar a licitude da cirurgia de mudança de sexo, além de prever também a possibilidade de averbação do novo sexo, vedando a emissão de certidão com referências ao estado anterior ou mesmo a origem cirúrgica (sigilo de registro).
Só há no horizonte um delicado busilis se o transexual operado eventualmente tiver filhos (e, como ficarão seus respectivos registros civis). Por tal razão, as legislações alemãs e suecas vedam a redesignação sexual quando o operado é casado ou tem filhos.
Outro caso interessante é o referente aos adeptos e seguidores da Igreja Testemunhas de Jeová que, por sua crença, (lembremos cuja liberdade é assegurada constitucionalmente) não admitem o recebimento de transfusões de sangue, há de se reconhecer a possibilidade da recusa à terapia hematológica.
Configura-se, in casu, verdadeiro conflito de valores clamando pela aplicação do princípio da ponderação de valores para se encontrar melhor solução.
Também quanto ao tema o CFM editou a Resolução 1.021/1980 e, ainda, há a previsão dos arts. 45 e 56 do Código de Ética Médica autorizando os médicos a praticar a transfusão de sangue em seus pacientes, independentemente de consentimento, se houver iminente perigo de vida.
Nesse sentido, se posiciona a maioria esmagadora da jurisprudência pátria, principalmente se comprovado o efetivo perigo de vida do paciente. Sacrificar a liberdade de religião em detrimento da intangibilidade do direito à vida e ao corpo é desconsiderar um aspecto essencial e também indisponível da personalidade, seria reduzir a vida a uma dimensão física da pessoa.
Interessante e intrigante é a questão de “barriga de aluguel” que se dá quando a gestação se desenvolve em útero alheio. É procedimento que viabiliza a maternidade a certas pessoas com restrições sérias biológicas.
Sob contundentes objeções da Igreja Católica (instrução Donun vitae de 22.02.1987 aprovada pelo Papa João Paulo II) , o CFM editou a Resolução 1.358/92 autorizando o médico realizar a gestação em útero alheio respeitados certos requisitos:
a) realizar-se entre parentes até 2º grau; b) a cessão do útero será forçosamente gratuita; c) que tenha finalidade médica aplicada em face de pessoas que não podem gestar e, não por razões meramente estéticas ou egoísticas ( como a vaidade feminina).
Deve-se evitar o “comércio de órgãos humanos” atendidos os requisitos da resolução do CFM há de se conferir juridicidade à maternidade de substituição. É de relevância também a questão do registro civil com base na declaração fornecida pelo médico que inscreverá a declaração do nascido vivo (art. 46 da Lei 6.015/1973), o nome da mãe biológica ou social.
Problemático será, no entanto, se o médico parteiro não souber da gestação em útero alheio, somente prover a referida declaração em favor da mãe parturiente (ou seja, a mãe hospedeira). E, nesse caso, os interessados, a mãe biológica ou genética, o pai, o MP suscitarão o procedimento de dúvida (art. 296 c/c art. 198 a 204 da Lei 6.015/1973).
Deve a referida gestação em útero alheio ser fruto de consentimento informado e expresso, o que possibilitará a alteração pertinente do registro de nascimento junto à Vara de Registros Públicos.
A reprodução assistida pode ocorrer por inseminação artificial (em laboratório) ou no corpo da mulher. Ambas as modalidades podem se concretizar na forma homologa ou heteróloga.
Será homóloga se utilizado material genético do próprio cônjuge ou companheiro, com sua expressa anuência. Será heteróloga, se o sêmen é de terceiro, sempre a título gratuito (Resolução 1.358/1992 do CFM).
A autorização prévia e expressa do cônjuge funciona como adoção prévia suficiente para gerar a presunção de paternidade do art. 1.597 do C.C. de 2002. Devido ao princípio do anonimato ou do sigilo do doador de sêmen (Resolução CFM 1.358/2002) que o motivo da vedação ao uso da reprodução assistida heteróloga em mulheres não casadas ou em união estável foi evitar o movimento de filhos sem pai.
No entanto, novamente verificamos uma afronta ao direito da personalidade de se ter liberdade psíquica e de planejamento familiar, e, ainda por importar em discriminação injustificada em face de mulheres solteiras ou conviventes em união estável.
Portanto, a reprodução assistia heteróloga não servirá o que na gíria chamamos de “produção independente”, o que certamente excluiria os homossexuais.
O Projeto de Lei 90 acende polêmica pois contempla o direito da criança conhecer o doador do sêmen, só quando atingir a maioridade civil, ou quando da morte dos pais ou na hipóteses do pai contratante não promover o registro civil de nascimento. Também pretende obrigar a transferência de todo material genético preparado laboratorialmente para o corpo da mulher, impedindo os chamados embriões excedentários.
Uma pergunta sucinta Ulhoa, o embrião fecundado in vitro e não implantado no útero é sujeito ou objeto de direito? Não há ainda uma resposta consensual, na tecnologia jurídica, para essa complexa questão.
Enquanto o embrião não é implantado num ambiente orgânico propício ao seu desenvolvimento como ser biologicamente independente, ele não pode ser considerado como tal. A decorrência lógica desse enfoque é a que embrião in vitro não é sujeito de direito, mas bem da propriedade comum dos fornecedores do espermatozóide e óvulo (alguns os chamam de “pais”, mas esta não parece ser a melhor designação; vou chamá-los de “genitores”).
Em França, cita Ulhoa, desde 1994, o Código de Saúde Pública limita o prazo de conservação dos embriões in vitro e reconhece aos genitores o direito de decidir o destino deles, o que importar atribuir-lhe natureza de objeto de direito, e não de sujeito.
Nesse sentido, no Brasil o embrião fertilizado in vitro e implantado no útero deve ser considerado como nascituro, quer dizer, sujeito de direito personificado. Enquanto não verificada a nidação uterina é incerta a natureza jurídica do embrião. A nidação é fato jurídico que define a natureza do embrião in vitro.
A eventual concepção após a morte do titular do sêmen, não gera direito sucessório, até porque a capacidade sucessória só é reconhecida a que tem personalidade jurídica no momento da abertura da sucessão (ou seja, no momento do óbito do autor da herança), muito embora seja reconhecido o direito a paternidade judicialmente reconhecida.
Outra polêmica envolve atos de disposição do corpo em vida, como é caso dos wannabes ou apotemnofia ou melotalista. Os wannabes ou apotemnófilos ou amelotalista são pessoas que têm incontrolável compulsão pela amputação de um membro específico de seu corpo, possuem um desejo intenso sem serem deficientes físicos. A apotemnofilia é atração sexual por partes do corpo humano de outro indivíduo, amputadas ou mutiladas, é distúrbio sexual.
Não entendemos como aceitar como válido o consentimento dos wannabes posto que viola frontalmente o direito a integridade física que constitui importante direito de personalidade, sem deixar de incluir o direito à vida. Tais pessoas clinicamente sofrem de parafilias e precisam de tratamento clínico adequado e, não sob a égide de seu próprio consentimento, obter permissão legal para se automutilarem.
É também o entendimento esposado por Konder, cf. “O consentimento no Biodireito: os casos dos transexuais e dos wannabes”.
O transexualismo é considerado uma entidade clínica autônoma onde há contradição entre sexo fisco aparente que é determinado geneticamente e o sexo psicológico. A Resolução 1.482/97 do CFM identifica o transexualismo como desvio patológico permanente da identidade sexual, com rejeição do fenótipo, tendências de mutilação e/ou auto-extermínio.
O homossexual difere do transexual uma vez que este se sente atraído pela pessoa do mesmo sexo, mas na tem o desejo ou intenção de mudar seu sexo. Também não se confunde o intersexualismo que se tipifica pela presença de anomalias físicas, hormonais ou genéticas que conduzem a um sexo falso.
Outro tema inquietante é sobre a esterilização e seus limites, que pode ser obtida pelo uso de técnicas específicas, em pessoa do sexo masculino ou feminino, para impedir a fecundação e a procriação.
Relata-se que os adolescentes que integravam o coro da Capela Sistina, na Itália, para que mantivessem o tom contralto de suas vozes eram castrados com propósito de não produzirem hormônios e não sofrerem modificações na voz. Na mitologia grega há o registro de que a Rainha Semíramis, de Nínive, determinou que doentes incuráveis de seu reino fossem castrados, impedindo a degeneração da espécie, é o que conta Antônio Chaves.
Entre nós, a esterilização cirúrgica como método contraceptivo através da laqueadura tubária, vasectomia ou outro método aceito cientificamente, vedada a histerectomia (retirada do útero) ou ooforectomia (retirada dos ovários), exceto por exigência médica, como reza a Lei 9.263/96 em seus arts. 10, § 4º e 15.
Com base no princípio constitucional de paternidade responsável admite-se a esterilização voluntária para fins de planejamento familiar tanto em homens como em mulheres com plena capacidade civil, desde que maiores de vinte e cinco anos de idade ou que tenham, pelo menos, dois filhos vivos, observado o prazo mínimo de sessenta dias entre a manifestação de vontade (por escrito) e o ato cirúrgico, durante o qual o interessado deverá ser conduzido ao serviço de controle de natalidade para desencorajar a esterilização, através da recomendação de outros métodos mecanismos contraceptivos.
Por atentar a dignidade humana, a esterilização de criminosos sexuais (de quem pratica estupro) ainda que a origem delitógena seja um desvio de sexualidade. Cabe responsabilidade civil por danos materiais e extrapatrimoniais, quem realizar esterilização não autorizada legalmente, bem como a empresa que obriga suas empregadas a submeterem-se à esterilização, evitando, assim, o gozo de licença-maternidade.
A experiência científica em pessoas humanas somente pode ocorrer com consentimento livre e informado, com finalidade terapêutica e caráter gratuito, além de não produzir qualquer potencialidade de prejuízo à pessoa, respeitando os princípios de beneficiência e não-maleficência, proclamados como diretrizes da Bioética.
É possível cogitar-se de direito subjetivo ao corpo de outrem á luz do art. 1.566 do Código Civil de 2002? É certo que é dever conjugal a coabitação, que devem viver a um só tempo viver sob o domicílio conjugal, sendo objetivo manter relações sexuais habituais, convivendo intimamente.
Embora parcela da doutrina defenda a idéia de um direito da personalidade sobre o corpo do cônjuge, a partir da reciprocidade da prestação do dever sexual no casamento ( Cláudia Haidamus Perri, Álvaro Villaça Azevedo e Rubens Limongi França, esta não é posição que deve prevalecer. É que a manifestação sexual (inclusive entre cônjuges ou companheiros) é pura expressão de afeta não podendo ser tratada pela ótica de obrigação jurídica imposta uma pessoa humana.
Não obstante a configuração do chamado débito conjugal, encará-lo como direito da personalidade é violar a dignidade humana, aviltando a sua liberdade afetiva e sexual. Ademais, se assim o fosse caberia a responsabilização civil do cônjuge-devedor que deveria repará-lo pecuniariamente ela falta de afeto e afeição.
Daí é de se repudiar o enquadramento do débito conjugal como direito da personalidade do cônjuge ao corpo do outro.
Ademais, o debitum conjugale como direito da personalidade, seria imperioso concluir que sua eventual violação implicaria em responsabilização civil do “cônjuge-devedor” que teria de reparar pecuniariamente, a falta de afeto e carinho. (http://conjur.estadao.com.br/static/text/41317,1), (http://conjur.estadao.com.br/stati,1),
( http://conjur.estadao.com.br/static/text/29074,1>.
Já o direito à integridade psíquica (moral) concerne a proteção dos atributos psicológicos relacionados à pessoa, tais como a sua honra, a liberdade, o recato, a imagem , a vida e o nome. A higidez psíquica se relaciona necessariamente com a dignidade humana.
A incolumidade moral preserva a estrutura humana, em particular as emanações da alma, essencialmente incorpóreas, distintas das projeções físicas do indivíduo. Talç tutela seja por ações diretas ou indiretas, por situações naturais ou não, impõe-se a cada pessoa e à coletividade como um todo, inclusive ao Poder Público.
Esclarece Bittar que são vedadas pelo ordenamento jurídico todas as práticas tendentes ao aprisionamento da mente ou a intimidação pelo medo, ou pela dor, enfim, obnubiladoras do discernimento psíquico.
Podem ser alinhados como direitos da personalidade no âmbito psíquico: a imagem, a privacidade; a honra; o nome civil e, etc.
É interessante encontrarmos a relativização do direito à imagem das pessoas públicas também chamadas de celebridades, em razão de interesses públicos ou de colisão com outros bens jurídicos.
O exemplo típico da mitigação da tutela da imagem em face da preponderância do interesse público é o uso de imagem decorrente de investigação criminal, com a divulgação de retrato de foragido em órgãos de imprensa e programas jornalísticos.
No mesmo sentido, a imagem das pessoas como artistas, esportistas, políticos, modelos, personagens históricos também sofre flexibilização, em face da projeção de sua personalidade extrapolando os seus limites individuais para projetar-se no interesse de toda coletividade. (http://conjur.estadao.com.br/static/text/47827,1 )
Mas, nada impede que as celebridades possam eventualmente, sofrer violação à imagem, como a utilização fora dos padrões sociais ou contratuais admitidos ou fora do contexto jornalístico ou noticioso. (vide o link: http://conjur.estadao.com.br/static/text/46770,1) Ou ainda: (http://conjur.estadao.com.br/static/text/45253,1). E, ainda recentemente http://conjur.estadao.com.br/static/text/34857,1.
É possível também a violação do direito à privacidade das pessoas públicas quando penetrar em seu refúgio íntimo, é o que ocorre com os papparazzi.
É bastante difícil a delimitação do âmbito do direito à vida privada, em razão das diferenças culturais, tradições, costumes entre os povos. A vida privada é um refúgio impenetrável pela coletividade, assim como o domicílio. É o direito de viver a sua própria vida em isolamento, não sendo exposto à publicidade que não provocou e nem desejou.
São aspectos amorosos, sexual, religioso, familiar, sentimental de uma pessoa. Gilberto Haddad Jabur preciosamente nos esclarece que “o direito à vida privada posiciona-se como gênero ao qual pertence o direito à intimidade e o direito ao segredo (...)”.
Elucidativo é artigo inserto no link: http://conjur.estadao.com.br/static/text/45369,1
Convém ainda apontar o direito à intimidade como aquele que consiste em resguardar dos sentimentos alheios as informações que dizem respeito apenas ao titular, ao passo que o direito ao segredo é fundado na não-divulgação de fatos da vida de alguém ((temos o sigilo bancário, sigilo fiscal, sigilo telefônico, sigilo médico, sigilo da correspondência e, etc...).
Todavia é possível haver vulneração da vida privada mesmo sem resvalo à imagem ou à honra (boa fama), em face da inviolabilidade da vida privada.
O direito À honra diz respeito ao prestígio social e ainda a própria idéia que a pessoa tem de si mesma, daí, haver a honra objetiva e a honra subjetiva. O direito à honra visa proteger o valor moral e íntimo do homem, como a estimação e consideração social, bom nome ou a boa fama.
É conveniente enfatizar que a honra pode ser atingida de forma direta e frontal como de forma indireta ou dissimulada, consistindo num abalo do conceito do titular na família, política, no trabalho, nas atividades estudantis e, etc. produzindo um dano extrapatrimonial reparável.
Em síntese, a honra objetiva encerra um conceito externo, é o que os outros pensam de uma pessoa, ao passo que a honra subjetiva é a sua estima pessoal, o que a pessoa pensa de si própria.
Já reconheceu a melhor jurisprudência que é possível concretizar-se dano à pessoa independentemente da conotação média da moral social, pois a honra subjetiva tem como termômetro próprio, inerente a cada indivíduo. É o decoro, o sentimento de auto-estima, da avaliação própria que possuem valoração individual, não se podendo negar esta dor de acordo com sentimentos alheios.
Todavia, não caracteriza violação à honra, a difusão de fato que diz respeito ao interesse público, como a apuração de fatos criminosos (Vide LINHA DIRETA programa da TV Globo), quando verdadeiros. Daí ser relevante a exceptio veritatis que constitui meio para que se prove a veracidade dos fatos alegados.
O Pacto de San José da Costa Rica (Convenção Interamericana de Direitos Humanos) que fora subscrito pelo Brasil reconhece também a proteção à honra em seu art. 11, que também existe a mesma tutela na esfera criminal ao capitular os crimes contra honra como calúnia, difamação e injúria.
O direito à integridade intelectual corresponde a proteção conferida ao elemento criativo, típico da inteligência humana. Daí também proteger-se a liberdade de pensamento e o direito ao invento, além do direito autoral regulamentado pela Lei 9.610/98.
É salutar mencionar que os direitos da personalidade no âmbito intelectual são incorpóreos, e, portanto, insusceptíveis de apreensão material. Descabe a utilização dos interditos possessórios para sua defesa, conforme entendimento cimentado na Súmula 228n do STJ.
A proteção de tais direitos se firmará por meio de tutela preventiva (tutela específica prevista no art. 461 C.P.C.) ou de ação de reparação de danos ( que é a tutela repressiva). Principalmente quando o dano estiver integrado a conduta lesiva (in re ipsa), é o que sustenta Carlos Alberto Bittar.
Até mesmo na internet percebe-se a importância do estudo do direito de autor, exigindo-se que a proteção jurídica das obras intelectuais esteja adequada ao avanço tecnológico dos meios de comunicação. Protegem-se as obras e a manifestação do intelectual do ser humano onde quer que se expresse (livro, CD, DVD, vídeos e internet). Enfim, é a tutela da criação intelectual.
È direito sui generis, por conta de sua natureza híbrida, mista. Nos termos do art. 22 da Lei 9.610/98 evidencia-se que o direito do autor é, ao só tempo, direito de personalidade e direito real sobre bem imaterial.
Por seu caráter patrimonial o exercício do direito autoral permite sua transmissão por ato inter vivos ou causa mortis. A cessão é presumidamente onerosa e reconhece ao autor o direito irrenunciável À percepção, no mínimo, cinco por cento sobre o preço de comercialização da obra (art. 38 da Lei de Direitos Autorais).
O direito autoral é transmitido pelo prazo de setenta anos, contados de primeiro de janeiro do ano subseqüente à morte do autor (art. 41 da Lei de Direitos Autorais). Findo o referido período, a obra cai em domínio público. É o caso da grande maioria das músicas clássicas, executadas nos cinemas.
A título ilustrativo convém ressaltar que o art. 4º, da Lei 9.609/98 a chamada Lei do Software confere proteção aos programas de computador dispondo pertencerem os direitos decorrentes dos programas desenvolvidos durante a vigência do contrato ou do vínculo estatutário ao empregador, contratante ou órgão público, salvo disposição em contrário.
A proteção e efeitos inclusive os patrimoniais do direito autoral independe de qualquer registro, basta a mera menção de sua autoria para identificar a titularidade. A defesa do direito autoral engloba até mesmo os direitos do tradutor, e os direitos sobre a criação de programas de informática (software).
A liberdade de imprensa é o direito de livre manifestação de pensamento pela imprensa, assegurada a informação pelos seus variados e diversos órgãos. Abrangendo os diferentes meios de comunicação e informação.
Todavia, o exercício da informação não pode ser admitido em caráter absoluto, ilimitado, sendo forçoso estabelecer limites ao direito de informar a partir da proteção dos direitos da personalidade (imagem, vida privada, honra, intelecto) com base fundamentalmente na tutela essencial da dignidade da pessoa humana que possui status constitucional (art. 1º, III CF).
No plano da responsabilidade civil é salutar mencionar a Súmula 221 do STJ que estabelece que cabível reparação do dano decorrente de publicação pela imprensa , tanto o autor do escrito, quanto do proprietário do veículo de divulgação.
Ademais, o valor de reparação civil por dano moral não pode estar adstrito a valores previamente tarifados em diplomas legais (como tentam em vão fazer a Lei de Imprensa e o Código Brasileiro de Telecomunicações), uma vez que constitucionalmente está prevista a indenização por dano moral de forma ampla e irrestrita.
A proteção dos direitos da personalidade prevista no art. 12 C.C. repete a regra do artigo 5º da Lex Fundamentalis E NO ART. 461 do CPC e reconhece a possibilidade de tutela repressiva e preventiva , autorizando a concessão de provimentos judiciais reparatórios.
São previstas sanções jurídicas que se dirigem aos que violam os direitos da personalidade, mediante a fixação de indenizações por danos não-patrimoniais, bem como pela adoção de providências de caráter inibitório (tutela específica), tendentes à obtenção do resultado equivalente, qual seja, o respeito aos direitos da personalidade.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 02/08/2007