Juntarei os cacos,
as peças,
as farpas,
os caleidoscópios
para concertar-me.
Para montar o mosaico.
Entender o todo,
ainda sendo apenas parte.
Entender a parte encaixado no todo,
ainda que solitária
ainda que transgressiva
ainda que triste
Por saber da finitude.
Saber do tempo pesando nas costas.
Atrasando pernas.
Apagando caminhos e memórias.
E deixando-nos com a contemplação
da alma na janela do espírito...
Juntarei os cacos
selecionados com a pinça,
com a paciência,
com a esperança...
Algumas sobreviverão
Alguns pedaços
terão definitivamente desaparecidos.
Pulverizados
Espalhados no infinito
e escapado da morte.
Juntarei as peças
Sob a miopia intrínseca
E sem formar todo
quebra-cabeça...
Manter o pensamento íntegro.
Hígido e hirto.
Não posso me dobrar
sobre as estranhezas humanas
Não posso me curvar
para todas as majestades
Não tenho reino
Não tenho feudo
Não tenho masmorra.
As torturas que sofro
são de minha consciência
algemada à realidade pungente,
sangrenta e cruel.
Que saem das manchetes de jornais.
Que saem das alcovas malidicentes
Tenho ouvido enxovalhos
em silêncio, como se
sorvesse o veneno das palavras
e morresse por seu significado.
Juntei todas as peças
sobre o tabuleiro improvável
a trama me pareceu completa
Mas, há o imponderável.
Há o hiato entre o
signo e significante.
Sentimentos fractais
refletem de forma múltipla
uma parte da
estória.
Contam a narrativa
O vestígio do que houve.
A prova do que há.
Há poesia estonteante
De descobrir-se
aos pedaços.
Inteiramente.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 30/08/2016