Derradeira
Dei um passo.
E um passe.
Energias projetadas.
Amanhã irei dormir.
Amanhã escreverei as últimas palavras.
Traçarei as rimas derradeiras.
Porque as lágrimas secaram.
Não me preocupo com o traje
E observo o vestido
ligeiramente sujo
Registros táteis
Mãos.. fagulhas e nódoas
E tudo isto é poesia.
Vestígios de passagem.
Geografias encontradiças.
A dança dos ventos
traz odores intensos
Perdidos pela ação dos homens.
As folhas de outono
registram o tempo
amarelado, amarronzado
e morto.
O fim do tempo
A ampulheta vazia.
E tudo isto é poesia.
O monograma do lenço.
Os presentes desperdiçados
A embalagem guardada
milagrosamente intacta
Que se referia
a um conteúdo vazio.
Caixas, gavetas e envelopes.
Lacres, cadeados e chaves
Segredos
Secretos
Misteriosos
Laboriosamente
produzidos por uma vida inteira.
Tudo isto é poesia
nua diante do espelho da realidade
Sem maquiagem.
Com rugas,
Riscos de expressão
Olhares e tristeza.
Afetos quebrados
Cristais quebrados
E os cacos revelam o mosaico
do lirismo contido.
Inscrito nas paredes da consciência.
Fecho a mala.
Coleto os vestígios
E fica a impressão
que a eternidade é velha.
Tudo isto é poesia.
Solerte.
Inadvertida.
Impune.
Somos culpados
da felicidade
que não temos.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 24/01/2016