Eu tenho medo
Medo em intensidade e variedade.
Tenho dores
Dores explícitas e implícitas.
Dor de dente.
Parece incrível mas ainda tenho dentes.
Talvez minha alma esteja desdentada.
Não morda mais.
Não abocanhe mais.
Minha boca engole palavras e semânticas.
E arrota filosofias.
Tenho ideias mal digeridas.
Salgadas.
Ardidas.
Irreconhecivelmente palatáveis.
Não sou heroína de nada.
Não tenho capa.
Não tenho espada.
Tenho armadura e convicções
Não venho da Capadócia
Mas conheço dragões pelas entranhas.
Não sou da guerra.
Mas, infelizmente, aprendi a lutar.
A arrancar do leito dos rios a água,
o peixe e a vontade de construir pontes.
Não insistam.
O que sou, é apenas mais um sobrevivente.
Sou atrevida,
sou ousada e gananciosa.
Quero toda a vida que há...
na flor, no vento, nas pedras,
nos animais racionais ou não.
Quero a docilidade dos selvagens...
E a selvageria dos dóceis...
Quero paradoxos
para brincar de puzzle.
Quero invadir pensamentos alheios,
passear nas almas estrangeiras
e, torná-las velhas conhecidas.
E, tomar o chá preto
que é castanho
no enrubecer das tardes.
Quero noites iluminadas de auras.
E os segredos explícitos do tempo.
Quero as cores que não estão na paleta.
Quero os pincéis que ainda não existem.
Quero o traço imediato da vertigem.
E pular no abismo à procura de essências.
Não me venham endeusar...
Não me venham cogitar em superioridades...
Porque como Pessoa
fugi da possibilidade do soco...
fugi muitas vezes
quando estava frágil.
Sobretudo cansada.
Não tenho a força.
Não sou nem He-man
e nem She-ra.
Meus deuses estão dispersos
e em todos os lugares.
Passeiam em mim
como se fossem entidades em turismo.
E me deixa lições
como a inscrição do oráculo de Delfos...
Lições enigmáticas.
Complexas..
Prenúncios de tragédias
incontornáveis....
A moça que se prostitui.
O rapaz que se vilaniza.
O oportunista que se acha muito esperto.
O belo que negocia avidamente sua estética.
E, o burguês que compra a todos
e brinca de lego nas horas ocupadas.
Mas nem sempre tudo encaixa.
Há uma justiça poética
conspirando nas frestas do acaso.
Não me venham
com a insandice de eternidades
Meu tempo é o instante que já foi.
É o registro esmagado
entre letras e sentidos.
Entre fonemas e gritos...
Minha voz é gritante.
Afinal, estou ficando surda...
E tenho a impressão errônea
que todo mundo está...
um pouco surdo,
um pouco indiferente,
um pouco curdo e terrorista,
um pouco demente e romântico.
Um pouco de algo
que irá se extinguir em breve
ou todo instante.
O que sou,
o que faço
é ocasional, proposital
e o pior,
é indesculpável...
Passei a vida inteira querendo
conter-me...
Quis educar-me, sinceramente.
E, em resumo,
só conseguir ser o anti-herói
de mim mesma.
Vamos salvar o Golden
na city...
E a city do golden.
Salvar o que há.
O possível e o indecentemente óbvio.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 21/06/2015
Alterado em 21/06/2015