Vertentes do constitucionalismo
O debate sobre o constitucionalismo inclui a abordagem das diferenças existentes entre o modelo de neoconstitucionalismo e as posições existentes de positivismo (exclusivo e o inclusivo).
Os juristas norte-americanos não cogitam de neoconstitucionalismo posto que a concepção constitucional adotasse forma diferente. Não houve ruptura, nem mesmo mais de uma constituição, pois a única é a de 1787 que até hoje existe com poucas emendas e as crises posteriores foram solucionadas através de soluções institucionais.
Nos EUA o debate se concentra na amplitude e de competências da federação e dos métodos e interpretações da Constituição. Algumas análises sobre o neoconstitucionalismo e sobre o a constitucionalização do direito começaram a surgir, com os autores norte-americanos interessados nos sistemas jurídicos brasileiros, e traduzem a judicialização da política e defendem a tese do procedimentalismo .
Na história constitucional do último século dos EUA é possível encontrar várias vertentes de interpretação constitucional, inclusive a tendência da Suprema Corte ao modelo de Norberto Bobbio e de muitos jusfilósofos europeus.
As correntes liberais e republicanas divergem sobre a relevância e correção das decisões da Suprema Corte. Atualmente com uma composição mais conservadora, a Suprema Corte não constrói o direito (política de autocontenção) e se nega adentrar nos aspectos políticos do Estado, a doutrina com preocupações mas democráticas reage e faz severas críticas ao modelo adotado.
Mark Tushnet em sua obra “New constitucional order” apontou que houve época em que a Suprema Corte desempenhou relevante papel, inclusive na promoção de políticas sociais, tendo sido protagonista de questões sociais como o combate as práticas racistas até culminar com a autorização do aborto desde que cumpridos determinados requisitos.
Esse período caracterizado como ativismo judicial quando as forças conservadoras severamente criticaram ao modelo constitucional dos EUA, ao ponto de a Suprema Corte poder se negar a decidir um caso concreto por implicar consequências, na esfera política, inadequadas para o momento vivido. O que resulta num poder discricionário impensável.
Os juristas e os constitucionalistas dos EUA não cogitam em neoconstitucionalismo porque a concepção constitucional se desenvolveu de forma diferente.
Um dos motivos é que não houve ruptura no sistema constitucional sequer uma Constituição (a de 1787) que sofrera poucas emendas (apenas vinte e sente em duzentos e vinte anos) fixadas ao final do texto promulgado e as crises que se sucederam tiveram soluções institucionais regulares, desde a independência dos EUA.
O debate sobre a amplitude e de competências da federação e dos métodos e posturas da interpretação da Constituição (método originalista e método decisionista ) postura conservadora propensa a um ativismo judicial.
O debate sobre a interpretação constitucional no sistema common law apesar da grande força dos precedentes, toda a discussão europeia sobre o positivismo, como teoria de direito adequada ao constitucionalismo e suas classificações nem entrou em pauta.
A situação vivenciada nos EUA é oposta àquela realizada pelo ativismo judicial que por sua vez obteve relevantes mudanças sociais nas décadas de cinquenta, sessenta e setenta e, por todas essas razões a crítica constitucional dos juristas norte-americanos sofrera reflexão histórica, social e interpretativa.
As ponderações sobre o positivismo em transformação indo até a inovação e a aceitação do neoconstitucionalismo são, portanto, um debate interno da doutrina ganha força no cenário europeu e já começa refletir no Brasil.
Concluímos que a defesa do modelo neoconstitucionalista passa pela superação dos modelos anteriores e pelas críticas trazidas. A positivação dos direitos é incontestável e são raríssimas as teses contemporâneas adeptas do jusnaturalismo.
Todavia, entre o positivismo e o neoconstitucionalismo apareceram nuances teóricas que trazem elementos diferentes entre si.
Os trabalhos de Ronald Dworkin trouxeram radicais modificações não somente na compreensão de regras e dos princípios, esquadrinhando um modelo diferenciado do que havia então, mas também pela resposta de Herbert Hart que alterou a defesa do positivismo jurídico.
Devemos recordar que após vorazes críticas pelo positivismo empregado na obra intitulada “O conceito do direito”, o autor realizou pós-escrito em defesa de sua teoria que fora publicada postumamente e, ainda de forma inacabada, vindo a comparar com as versões originais.
A primeira parte é dedicada a rebater as críticas de Dworkin e, ao se defender, Hart assumiu posição menos radical e abriu espaço ao que foi chamado como modelos qualitativos de positivismo jurídico.
Passou-se apostar no positivismo duro e um positivismo moderado, que, por considerar a ótica do sujeito envolvido com o direito, passou a chamar positivismo exclusivo (duro, inflexível) e positivismo inclusivo (moderado, abrandado).
Por positivismo exclusivo é a opção de entender o direito de acordo com os pressupostos clássicos de Hans Kelsen, Alf Ross e Norberto Bobbio, em especial pela separação completa entre o direito e a moral e a neutralidade do observador.
O modelo de direito do positivismo exclusivo é válido sem ser determinado por qualquer argumento valorativo. Os princípios jurídicos não são destacados individualmente e, a autoridade competente garante validade ao direito, porque é reconhecida e aceita como tal. A sanção é o principal elemento do direito.
A ótica do positivismo exclusivo é externa e o observador é sujeito que está fora, apenas descrevendo o fenômeno jurídico. Seu objetivo é conhecer o direito em sua feição real, abstendo-se de tentativas de correção.
Esse positivismo exclusivo é impróprio para operar no Estado Constitucional do século presente. Mas se partirmos que todo neoconstitucionalista é antipositivista, pois sua análise teórica principia revendo algumas premissas positivistas ou quase todas (neoconstitucionalismo teórico ou total).
Mas ainda se encontraram os defensores do positivismo duro ou exclusivo atacando mesmo as teorias positivistas abrandadas ou inclusivas nomeando-as de forma equivocada.
O que temos agora vem em resposta a um regime totalitário vivido na década de setenta em que o positivismo duro dominava teórica e discursivamente.
A lei sem moral e sem legitimidade fora conduzida pela espada e pela força, traduzindo um positivismo autoritário, o que reforça a percepção de que cada vez mais a teoria e a prática do direito, em solo brasileiro, se afastam do positivismo jurídico exclusivo.
Já o positivismo inclusivo ou moderado atenua tais características incompatíveis com a prática do positivismo duro. Por Hart que fora seu primeiro adepto tem como principal distinção estabelecer que a moral exista, mas excepcionalmente, não havendo conexão necessária entre direito e a moral.
Eduardo Ribeiro Moreira defende que existem conexões contingenciais diferentes entre o direito e a moral, não havendo conexões conceituais necessárias entre o conteúdo do direito e o da moral, decorrendo daí a validade seja de regras ou princípios que tenham disposições moralmente iníquas. Um aspecto dessa forma de separação do direito e da moral é o que pode haver direitos e deveres jurídicos que não têm qualquer justificação ou eficácia moral.
O positivismo inclusivo trabalha, sobretudo, com as fontes sociais, de modo de tal relação entre fato social e norma é pressuposto dom modelo.
Apesar de considerados os princípios mas sua aplicação se dá de forma supletiva, sendo utilizável quando a lei for omissa e não houver solução normativa para o caso. A argumentação moral se dá de forma contingente, a depender da regra de reconhecimento.
A interação entre o direito normatizado e o fato social é o principal elemento do direito. O positivismo inclusivo defende a não-vinculação entre o direito e a moral. Para os positivistas jurídicos exclusivos os critérios morais da legalidade não pertencem ao sistema jurídico porque a regra de reconhecimento é determinada exclusivamente por fontes sociais. Diferentemente os positivistas jurídicos inclusivos sustentam que a moralidade é ou não é uma condição de legalidade em um sistema jurídico particular depende de uma regra social ou convencional, isto é, da regra de reconhecimento.
A ótica do positivismo inclusivo é interna e compreensiva, pois assume a possibilidade, mas não a necessidade, da moral, e omite que a aceitação do sistema jurídico por boa parte dos operadores é condição de sua existência, mas ele não supõe que o participante preste adesão moral ao direito que identifica como válido.
O juiz no positivismo tem ampla discricionariedade para resolver os casos não previstos pela lei e atesta, para os demais casos, a subsunção como regra principal da lógica jurídica.
Resta a dúvida: é possível um positivista inclusivo se adequar ao neoconstitucionalismo? Não há essa possibilidade, em razão do fundamento. Afinal, o positivismo inclusivo fora idealizado como arranjo para manter o modelo positivista depois das ruidosas críticas abalarem sua concepção. Corresponde a uma linha intermediária entre as críticas de Dworkin e Joseph Raz .
O neoconstitucionalista pretende ir além, pois adapta o futuro do constitucionalismo a uma teoria e a uma filosofia e, não se limita conforme o positivismo inclusivo distinguir o direito e a moral.
Preocupa-se em superar os modelos existentes, e os positivistas inclusivos que são defensores do modelo positivista com maior força atualmente.
A passagem, entretanto, não se deu diretamente do positivismo inclusivo para o neoconstitucionalismo e, isso é relevante frisar. Primeiramente surgiu a onde doutrinária que fora chamada de pós-positivistas trazendo novas percepções de teoria do direito.
No Brasil, a terminologia fora trabalhada por Albert Calsamiglia e obteve ampla recepção, sobretudo pela divulgação realizada por Paulo Bonavides.
Nos anos oitenta no Brasil ser positivista era importante para a defesa da Constituição já que conferia supremacia à norma fundamental que não tinha, naquela época, tal percepção de norma superior, na prática.
O pós-positivismo é a designação provisória e genérica de um ideário difuso, no qual se incluem a definição das relações entre valores e os princípios e regras, aspectos da nova hermenêutica e a teoria dos direitos fundamentais.
O pós-positivismo foi apenas uma nomenclatura de transição que não previa todos os avanços galgados, sobretudo com a teoria do direito.
A partir do início do século XXI o neoconstitucionalismo teórico passou a ser um dos sentidos para o movimento. Outro propõe maiores avanços no campo associativo com a filosofia do direito, onde o papel da moral e da democracia, de forma prática, que culminou no que chamamos de neoconstitucionalismo total.
Muitos foram os críticos , sobretudo ao último modelo, daí cogitar em neoconstitucionalismo formados pela pluralidade de pensamentos e por duas posições antipositivista que divergem entre si, sobretudo em gradação e expansão.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 26/05/2014