Quero a inércia do espírito.
Quero a ternura do desejo.
Quero a liberdade fonética
de gritos e ganidos.
Não quero o anjo.
Não quero a mulher
Não quero a criança.
Não quero nuances e nem perfumes.
A fragilidade frívola da dor.
A tortura subreptícia da censura
estampada nos olhos.
Quero o lar que é um átomo
ou elétron
e que pode transmitir paz.
Disseminar-se em qualquer lugar.
Sob qualquer condição.
Quero o duelo da sorte.
A roleta russa.
O castelo de cartas.
E a adivinhação lúdica da tabuada
Contando os esquemas manjados
da vida.
Quero o silêncio de preces.
Quero o ritual da fé.
A imantação milagrosa das mãos.
A submissão dos joelhos
e dos rosários.
Se não tenho movimento
Se não tenho desejo.
Se não tenho voz para gritar.
Se não tenho alma a libertar
E nem o anjo da guarda
a me valer ou salvar.
Nem a feminilidade mínima
necessária para ser
fraca e dócil.
Tudo o quero não está escrito.
Está apenas incrustado.
Esculpido.
Semeado e regado
pelas lágrimas que ao verter...
liberta-me para a saga
de simplesmente ser e
ainda resistir.
O ato heróico da sobrevivência banal.
O desejo brutal apossando-se do corpo.
E a falência múltipla de gestos
que acenam para o horizonte
que desapareceu.
Entardeceu-se.
A noite sem estrelas.
Navega sobre nós mistérios
indecifráveis.
Tudo o que não quero hoje.
Veio até aqui
ateando fogo as vestes.
E nu permanece,
despindo-se da poesia.
E cru abandona o
sabor das palavras.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 09/05/2014