"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

Textos

Alguns conceitos basilares de Direito Processual Civil
JURISDIÇÃO


    

        O Estado estabelece a ordem jurídica, através do Poder Legislativo, fixando normas que indicarão sobre as situações ou relações que possivelmente virão a ocorrer entre os homens no convívio social.


          O objetivo da ordem jurídica é a paz social e o bem comum.



          Mas nem sempre é obedecida e respeitada a ordem jurídica, apesar das normas jurídicas serem de observância obrigatória, e cabe ao Estado adotar a coação para que seu ordenamento não se transforme em letra morta.



          Antigamente, o Estado era fraco e mal definia os direitos, assim cabia aos próprios titulares defender e realizar seus direitos através dos meios de que dispunham.



          Eram os tempos da justiça privada ou justiça pelas próprias mãos, e neste sentido, a lei de Talião promoveu uma inédita noção de proporcionalidade, antes completamente inexistente: olho por olho, dente por dente.



          Com o fortalecimento do Estado em reação ao Estado medievo, surgiu o aperfeiçoamento do Estado de Direito e, então a desvalida justiça privada fora substituída pela Justiça Pública ou Justiça Oficial.



          Assumiu assim o Estado o relevante encargo e monopólio de definir o direito concretamente aplicável diante de situações litigiosas, bem como aplicar coação a parte renitente que se recusava a cumprir espontaneamente o comando concreto da lei.



          A lei em suma, é a verdade do Estado que deve tutelar a proteção e os interesses sociais.



          Casos emergenciais devidamente ressalvados em lei, é que substituíram alguns resquícios da justiça privada capazes de legitimar, ainda hoje, a defesa direta dos direitos subjetivos pela parte, como se dá, por exemplo, na legítima defesa(art.160 I CC.), com a apreensão do objeto a penhor legal(art.776-780 CC.) e com o desforço imediato no embrulho possessório(art.502, idem).



          A prestação estatal de justiça começou por definir os direitos ante o litígio, e acabou por executá-los quando injustamente resistidos.



          A Jurisdição é o poder que emanado Estado, que entre às suas atividades soberanas de formular a regra jurídica, disciplina determinada situação jurídica.



          A função jurisdicional só atua diante de casos concretos de conflitos de interesse(lide ou litígio) e, sempre na dependência da evocação dos interessados, porque são deveres primários destes a obediência à ordem jurídica e a aplicação voluntária de suas normas.



          A atividade de dirimir conflitos e decidir controvérsia é um dos fins primários do Estado a partir da extinção da justiça privada, a ordem jurídica teve assim que criar para os particulares um direito `a tutela jurídica do Estado. Este passou então a Ter o poder jurisdicional e também o dever jurisdicional.



          Jurisdição é segundo Humberto Theodoro Junior, é a função do Estado de declarar e realizar de forma prática, a vontade da lei diante de uma situação jurídica controvertida.

Característica da Jurisdição


          É atividade secundária, pois através dela o Estado realiza coativamente uma atividade que deveria Ter sido originalmente exercida, de maneira pacífica e natural, pelos próprios sujeitos da relação jurídica submetida à decisão.



          O litígio segundo José Frederico Marques é anterior ao processo, mas sua existência é a conditio sine qua non do processo. Assim litígio ou lide corresponde ao conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida conforme a clássica lição de Carnelutti. Interesse é a posição favorável a uma satisfação de uma necessidade, assumida por uma das partes; e pretensão, a exigência de uma parte de subordinação de um interesse alheio a um interesse próprio.



          É ainda a jurisdição instrumental porque, não tendo outro objetivo principal senão o de dar atuação prática as regras do direito, nada mais é a jurisdição que um instrumento que o próprio direito dispõe para impor-se `a obediência dos cidadãos.



          A jurisdição não é fonte de direito, pois não visa a formulação de norma abstrata de direito.



          O órgão jurisdicional é que convoca para remover incerteza ou reparar a transgressão, restabelecendo o império da lei e do direito, declarando qual seja a regra do caso concreto e ainda aplicando as sanções previstas pelo direito.



          A jurisdição exercita a vontade concreta da lei feita pela parte no processo, revertida de caráter declaratório e executivo, tão somente.



          O fim do processo é a entrega da prestação jurisdicional, que satisfaz à tutela jurídica.



          Arruda Alvim ressalta que o objetivo da jurisdição é o desdobrar da causa do processo, dividindo-a em: (a) causa final – a atuação da vontade da lei, como instrumento de segurança e manutenção da ordem jurídica; (b) causa material – corresponde ao conflito de interesses, qualificado pela pretensão resistida, revelado ao juiz através da invocação da tutela jurisdicional; (c) causa imediata ou eficiente – isto é a provocação da parte, ou seja, a ação.



          Dando ao direito do caso concreto, a certeza da verdadeira justiça, realizando a justa composição do litígio, promove a jurisdição, o restabelecimento da ordem jurídica mediante eliminação do conflito de interesse que ameaça à paz social.



          Jurisdição é, ainda atividade desinteressada do conflito, o juiz é eqüidistante dos interessantes e se submete a imparcialidade para a solução do conflito de interesses.



          A prestação jurisdicional é uma atividade invocada pelas partes e não espontânea do Estado, embora seja uma das expressões de sua soberania.

Princípios fundamentais


          Três princípios fundamentais pautam o poder jurisdicional e que informam a essência da jurisdição;



A saber:



O princípio do juiz natural – ou seja, só pode exercer a jurisdição aquele órgão a quem a constituição atribui o poder jurisdicional. Não é dado ao legislador ordinário fazê-lo.



          A jurisdição é improrrogável, os limites são igualmente trocados pela constituição. Não é permitido a legislação ordinária alterá-la ou reduzi-la.



          A jurisdição é indeclinável, ou seja, o órgão jurisdicional tem a obrigação de prestar a tutela e não a simples faculdade.



          Não pode eximir-se de julgar quando legitimamente provocado nem pode desejar a outros órgãos o seu exercícios.



          Jurisdição Civil – É poder ou função Estatal, é una e abrange todos os litígios.



          A diferença da matéria jurídica na composição dos litígios, conduz à necessidade de especialização não só dos julgadores, como também das próprias leis que regulam a atividade jurisdicional.



          O Direito Processual Civil é o que compreende as atividades desenvolvidas pelo Estado no exercício da jurisdição civil, contenciosa ou voluntária.



          A jurisdição civil e genérica(aquilo que não couber na jurisdição penal ou nas especiais) será a competência dela.



          Jurisdição contenciosa é a propriamente dita, ou seja, aquela em que o Estado pacifica ou compões os litígios. Pressupõe a controvérsia entre as partes(a lide) a ser solucionada pelo juiz.



          Algumas funções de cunho administrativo cabem ao Poder Jurisdição, é a chamada jurisdição voluntária onde o juiz realiza apenas a gestão pública dos interesses privados, como se dá por ex.: na nomeação de tutores, curadores, nas alienações de bens de incapazes, na extinção do usufruto ou fideicomisso e etc...



          Na jurisdição voluntária não há lide e nem partes, mas somente negócio jurídico processual, envolvendo o juiz e os interessados.



          O juiz confere apenas como um tabelião, eficácia ao negócio jurídico que prescinde da intervenção judicial.



          Entre nós, embora contestada a natureza da jurisdição voluntária, prevalece o entendimento de que ela é a forma de administração pública dos interesses privados.



          Em função preventiva e constitutiva.



          A terminologia do legislador considera que na jurisdição voluntária não há processos, e, sim, procedimentos e os sujeitos são os interessados.



          Sendo a jurisdição atividade provocada, e da qual a parte tem disponibilidade, assim, o nosso ordenamento jurídico conhece formas de autocomposição da lide e de solução por árbitros.



          A autocomposição da lide pode ocorrer através da transação ou da conciliação e da decisão da lide pelo juízo arbitral.



          A transação é negócio jurídico em que os sujeitos da lide fazem concessões recíprocas para afastar a controvérsia estabelecida entre eles. Neste caso a solução é homologada pelo juiz(art.269 III do CPC.).



          A conciliação é a transação obtida em juízo pela intervenção do juiz junto às partes. Efetivado o acordo, lavra-se o respectivo termo e o juiz profere sentença homologatório, que extingue o processo com solução de mérito(art.449 do CC.).



          O juízo arbitral(arts.1072 a 1102) importa na renúncia da via judiciária, confiando as partes na pessoa de árbitro que decidira a lide. O laudo arbitral uma vez homologado pelo juiz, confere força de sentença de mérito(art.1097 do CC.).



          Estas forma extrajudiciais de compor as lides só podem ocorrer entre pessoas maiores e plenamente capazes e quando a controvérsia visar sobre bens e direitos disponíveis.



          Jurisdição Þ Poder – dever do estado, exerce como uma das suas específicas prerrogativas, em substituição aos indivíduos na prescrição da justiça privada, e na preservação do bem público, para conhecer dos litígios entre eles e solucioná-los, em definitivo, para fazer cumprir o que, por força de lei, já estiver por esse modo solucionado; e, acessoriamente, para acautelar os processos em curso, a fim de assegurar os processos em curso, a fim de assegurar seu objetivo.



          Atividade precípua do Poder Judiciário, com a finalidade de dizer o direito, na solução dos conflitos de interesses pelo menos previstos em lei.



          Jurisdição civil – quando houver interesses da pessoa natural ou jurídica de natureza privada a, solucionar e por essa for provocada a tutela do Poder Judiciário.



          Jurisdição contenciosa – onde há litígio formado por partes adversas.



          Jurisdição voluntária – é jurisdição paralela à contenciosa, destinada a conhecer de ação na qual há litígio e cuja decisão não se reveste dos efeitos de coisa julgada, em termos teóricos.



          No direito brasileiro, e na jurisdição de espécie, o juiz pode decidir por eqüidade(art.1109), a sentença pode ser modificada(art.1111), e dela cabe apelação(art.1110).



          É a lei que determina quais as ações subordinadas a essa jurisdição(art.1112).


Natureza jurídica do processo


          No direito romano, em seu processo-formulário, as partes compareciam perante o magistrado, e um e outro formulavam suas pretensões.



          Aceita a fórmula por ambos os litigantes, formava-se a litis contestativo e o magistrado os remetia ao juiz, tal qual foi apresentado.



          Ressaltam as características contratuais, sobretudo pelo fato de as partes terem de acordar sobre a fórmula elaborada pelo magistrado.



          Tal teoria é combatida e não sustentou por muito tempo, pois que o conceito de contrato não se encontra realmente no processo e também não explica a atividade do juiz.



          Outra teoria, tentou identificar o processo como um quase-contrato, isto é, um fato lícito capaz de gerar obrigações de uma pessoa para outra.



          Também não foi hábil para explicar a natureza do processo.



          A teoria de Oskar Von Büllow, alemão, surgida nos meados do século passado chegou à conclusão de que o juiz ao julgar sempre se deparou com duas ordens de matérias, uma que tenta identificar o aspecto do processo verificando se está regular e devidamente estruturado para se prover uma solução final e outra, que é relativa a questão de fundo, ou seja, a relação de direito material.



          Essa teoria foi o marco inicial para a identificação científica do processo como ciência jurídica autônoma.



          Na teoria de Bullow, identifica-se que no processo, todos seus participantes tem direitos  e deveres; o autor, e o réu, tem direito à sentença e o juiz a obrigação de dá-la.



          Não se deve confundir dever com obrigações.



          A obrigação sempre se corresponde a um direito, enquanto o dever é norma de conduta desvinculada do direito de outrem e relacionado apenas com imposição explícita ou implícita da lei diante de determinada situação.



          Estabelecida a premissa, que sempre que houver processo há direitos e obrigações para seus sujeitos, logo trata-se de espécie de relação jurídica, ou seja, é o vínculo que une duas ou mais pessoas com direitos e obrigações recíprocas.



          A relação jurídica processual inclui ou não inclui o juiz. A princípio pretendeu-se que ao juiz cabia uma figuração neutra, porém tal concepção não vingou, pois que o juiz tem uma espécie de direito-dever, sua missão é fazer justiça.



          Outros caracterizam a relação processual, como angular, estabelecida exclusivamente entre autos e réu, e juiz.



          A doutrina dominante tem entendido que é possível a existência de direito sem afetiva obrigação correspectiva; a relação processual é triangular, é relação de direito público, pois o Estado nela está presente, com proeminência através do juiz.



          Outra teoria a de Goldschmidt, via o processo como uma situação jurídica



          Nega a existência de direitos e deveres dos sujeitos da relação processual, sob o fundamento de que o juiz não tem nenhuma obrigação de sentenciar em correspectividade com o direito das partes à sentença.



          O dever é imposto pelo Estado, e tem caráter extraprocessual.



          Para o réu, o que há é ônus(uma espécie de faculdade) de contestar a demanda.



          O direito subjetivo das partes existe e, é pré-processual.



          Não há direitos processuais, o que há são ônus processuais e tais faculdades uma vez não cumpridas e trazem conseqüências adversa à parte.



          Nesta teoria, a única relação jurídica existente é a de direito material que se faz presente no processo.



          A posição da parte diante da sentença judicial que se espera, definindo o direito, é situação e não relação jurídica.



          Também não logrou em prevalecer, pois que o juiz é peça essencial do processo, apesar de fora da situação jurídica.



          É porque situação jurídica é posição da parte diante da relação de direito material e não de processo.



          Além disto, a teoria da situação jurídica não explica o processo de execução onde a incerteza do direito não existe e, a relação processual só vai efetivar a citação cabível para realizar o direito do autor injustamente resistido pelo réu.



          A moderna teoria da relevância à situação jurídica, representada por Elio Fazzalari na Itália e Aroldo Plínio Gonçalves no Brasil, nega a existência da relação jurídica.



          A norma fornece ao credor o direito de receber do devedor e por outro lado revela a obrigação do devedor de pagar.



          Não há qualquer vínculo entre as partes, o juiz não estaria submetido a nenhum direito delas, ele julga, e decide a lide apenas porque a função lhe é própria e não obrigação.



          O processo revela várias situações jurídicas, com o fim de repará-lo para decisão final.



          Ao contrário da doutrina tradicional, defende que o procedimento não tem idéia de forma do processo, defende que o processo seria modalidade de procedimento.



          Processo seria, pois o procedimento em contraditório.



          A idéia do contraditório não afasta a de relação jurídica, pelo contrário a justiça.



          O processo como instituição, à semelhança do Estado não encontrou bom receptividade. O processo tem unidade com elementos objetivos e subjetivos, mas isto não expressa a sua característica finalística e instrumental.





GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 21/04/2007
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