"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

Textos

Breve relato sobre direito autoral

A descoberta da imprensa veio dar maior importância jurídica ao direito autoral. Gisele Leite

O direito autoral, do autor ou propriedade literária, artística e científica não foi disciplinado pelo Novo Código Civil Brasileiro restando ser disciplinados por legislação especial, é aquele que cabe ao autor de um trabalho de vincular seu nome à sua produção, reproduzindo-o ou transmitindo-o com exclusividade.

Dotado de relevância jurídica recentemente, está intimamente vinculado ao progresso técnico e, em particular, à descoberta da imprensa e, do poder de divulgação das artes, literatura e ciência.

A partir do século XV surgem os primeiros privilégios concedidos aos autores e editores na Alemanha, na Inglaterra e na França coincidentemente com a atuação dos mecenas.

Na segunda fase, passa-se através das Ordenações de Nuremberg, no século XVII, punir a contratação ou reprodução de trabalho alheio, independentemente da existência de privilégio.

O art. 649 e art. 673 do CC/1916 foram implicitamente revogados pela Lei 5.988/73 e o art. 132 e, explicitamente pela Lei 9.610/98, em seu art. 115.

Após da entrada em vigor do CC. De 1916, diversas leis e decretos modificaram a regulamentação dos direitos autorais, a Lei 4.790/1924, Decreto Legislativo 5492/1928; Dec. 18.527/1928; Dec 21.111/1932 sobre radiodifusão; Dec 2415/55 sobre representações, execuções públicas e teletransmissões pelo rádio e televisão e a Lei 3.447/88 que modificou os prazos de vigência dos direitos autorais.

Atualmente, o diploma legal que regula os direitos autorais é a Lei 9.610/98. No Brasil, em 1827 com a criação dos cursos jurídicos surgiu o direito autoral dos professores das Faculdades de Direito e, por sua vez, o Código Criminal de 1830 reconheceu o direito exclusivo do autor e de seus herdeiros.

A primeira lei especial sobre a matéria autoral surgiu em 1/8/1898 a Lei 496 assegurando os direitos pelo prazo de 50(cinqüenta) anos a partir da publicação das obras.

Com a cessão dos direitos autorais a um editor e, este publica temos sobre a mesma obra três propriedades distintas: a propriedade material sobre o exemplar do livro; a propriedade imaterial impedindo a reprodução ou a publicação sem autorização sua, que pertence ao editor; o direito moral ou da personalidade, que é do autor, impedindo que a obra seja atribuída a terceiro, ou seja, modificada sem sua alteração.

A duplicidade dos elementos encontrados no direito autoral fez com que certos doutrinadores a classifique como propriedade sui generis.
O art. 5o, XXVII CF enquadrou o direito autoral no que se refere aos direito das coisas a fim assegurar de forma bem ampla, o que confirma a chamada democratização da propriedade.

O registro da propriedade imaterial é regulado pela Lei 9.610/98 estando em vigência apenas o art. 17 e seus parágrafos primeiro e segundo da Lei 5.988/73.

O autor poderá registra-la gratuitamente para assegurar-se de seus direitos, na Biblioteca Nacional, na Escola de Música, de Belas-Artes da UFRJ, no Instituto Nacional do Cinema, no Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia.

Inúmeras convenções internacionais se referiram a propriedade literária, notabilizando-se as Convenções de Berna e de Roma (aprovada pelo Dec. 23.270 de 24/10/33) e a Convenção Pan Americana de Buenos Aires de 1910 (aprovada pelo Decreto 11.588 de 1915) além dos acordos bilaterais com França, Portugal e outros países.

De natureza jurídica muito discutida, a doutrina divide-se restando para alguns, o aspecto do direito da personalidade; enquanto que outros jurisconsultos se referem a uma espécie de monopólio de exploração assegurado por lei, ao autor.

Dois aspectos básicos e complementares que incidem no titular é o fato de ser o direito de autor inalienável e pessoal, e, outro transmissível e de caráter meramente econômico.

Na primeira acepção o direito moral do autor de ter a obra como sua, sem modificação ou deturpação, é um direito perpétuo vinculado à própria personalidade do autor e protegido civil e penalmente pela lei. Visa, sobretudo coibir a prática do plágio.

Na segunda acepção que corresponde ao elemento econômico que é o direito de explorar comercialmente a obra, de representa-la, de reproduzi-la, de cede-la ou imprimi-la.

O registro no entendimento dominante não é indispensável para a proteção do direito autoral, pois tem função meramente probatória e não constitutiva do direito, ao revés do que ocorre no RGI.

A presunção prevista no art. 20 da Lei 5.988/73 é juris tantum admitindo, portanto prova em contrário. O ônus da prova é do contestador do referido direito de propriedade imaterial.

Já a lei 9.610/98 em seu art.18 determina que a proteção dos direitos autorais independe de registro. Por outro lado, o art. 13 da referida lei considera autor intelectual desde que não haja prova em contrário, aquele que usar sinais (nome civil, completo ou abreviado, pseudômino ou qualquer sinal convencional para identificar a sua obra) conforme o art. 13 c/c art. 12 da Lei 9.610/98.

O Brasil fixou prazo para proteção para a propriedade literária, artística e científica ao contrário de outras legislações tais como a portuguesa que consideram perpétuo tal direito.

É assegurado o direito do autor por toda sua vida sendo transmitido mortis causa a seus filhos, a seus pais, cônjuge que dele gozarão vitaliciamente e, na falta de sucessores, aos demais que terão o direito de como ele se beneficiar, pelo prazo de 60 anos a contar da data do falecimento do autor.

Inexistindo tais sucessores até segundo grau, colateral ou legatários, ou cessionários o direito autoral cairá em domínio público (DP).

A aplicação da lei observar-se-á a ordem sucessória cível perdurando com exclusividade em favor de seu titular conforme a Lei 9.610/98 e art. 41.

Como direito moral do autor é aquele exercido exclusivamente pelo autor e, como direito econômico pode ser exercido por ele, pelo cessionário dos direitos autorais.

A Lei de 98 regulamenta a cessão total ou parcial dos direitos do autor a terceiros, pelo próprio autor ou por seus sucessores desde que se realize por escrito e, presumindo-se sempre onerosa.

Havendo dois ou mais autores o direito está indivisivelmente presente e não poderá qualquer dos colaboradores publicá-la ou autorizar a publicação sem que os demais consintam, divergindo estes, deve ser adotada da decisão da maioria (art. 32, § 1o.) caso em que não terá direito a parte nos lucros bem como será isento das despesas de publicação.

Para a Lei 9.610/98 as coletâneas, compilações, antologias, enciclopédias, dicionários, bases de dados e outras obras intelectuais protegidas (art. 7o, III) o que não exclui os direitos autorais.

Mesmo nas obras coletivas, assegura-se o direito autoral individual (art. 17). No caso de traduções, adaptações, arranjos, orquestrações deve também existir a autorização do autor do original (que são dotados de direitos autorais próprios ex vi art. 7o, XI).

Se a colaboração for indivisível, haverá condomínio em relação ao direito autoral e, falecendo um dos autores sem sucessores, seus direitos acrescem aos dos sobreviventes (art. 42 § único).

No caso de colaboração de artistas diversos com funções diferentes cada, serão consideradas como obras isoladas, cada um conserva o direito exclusivo ao seu trabalho.

O problema técnico jurídico da colaboração apresenta grandes dificuldades no campo do cinema em que assistimos um autêntico trabalho de equipe.

Não havendo a contratação cabe aplicar o disposto doa rt. 16 da Lei de Direito de Autor de 1998 pelo qual são co-autores da obra audiovisual o autor do texto ou do argumento literário, musical ou litero-musical, e o diretor.

No caso de desenho animado são co-autores os criadores dos desenhos utilizados no trabalho cinematográfico.

O autor pode contratar uma edição de seu trabalho fixando número determinado de exemplares que poderão ser publicados, ou pode ceder definitivamente ao editor os seus direitos patrimoniais referentes à determinada obra.

É pacífico o entendimento sobre a inalienabilidade dos direitos do autor em seu aspecto moral e é evidente pelo art. 27 da Lei 9.610/98 acrescentando que também são irrenunciáveis.

Dúvidas cruéis surgem sobre a execução de músicas em bailes de clubes e associações que sendo reservado ao ingresso no clube para os sócios é gratuito (somente para estes).

Já há decisões do STF no sentido de serem devidos os direitos autorais desde que remunerada a orquestra (Súmula 386) e que a apresentação seja feita em clube ou sociedade e, não em residência.

Idêntica orientação é a da Súmula 63 do STJ e, também a da Súmula 261 do STJ que estabelecem a cobrança dos direitos autorais pela retransmissão radiofônica das músicas, em hotéis, e deve ser apurada conforme a taxa média de utilização do equipamento verificada em liquidação.

A duvidosa aplicação da Lei 2.415/55 que estabeleceu competir exclusivamente ao próprio autor ou à sociedade legalmente constituída para a defesa dos direitos autorais à qual o autor for filiado, e que tenha sido registrada legalmente, a outorga no território nacional de licença autoral para realização de representações, execuções públicas e teletransmissões por rádio e por televisão.

O caráter de ordem pública suscitou dúvida quanto aos direitos dos cessionários da exploração econômica da obra.

A única interpretação plausível e coerente pertence a Eduardo Espínola e Prado Kelly que a cessão fornece a faculdade exclusiva a autorizar a representação da obra em quaisquer condições, pois o cedente perdeu a alienação, a possibilidade de interferência na matéria.

Do contrário, o direito econômico se tornaria igualmente inalienável e indisponível à guisa do direito moral do autor.

No caso das pinturas, discutiu-se a existência do direito do proprietário do quadro em reproduzi-lo sem autorização do artista. Salvo disposição em contrário, o autor da obra plástica, ao alienar o objeto em que ela se materializa, transmite ao adquirente o direito de reproduzi-la ou de expô-la em público.

A jurisprudência recente entendeu que deve prevalecer o direito do autor da obra em face do princípio constitucional que se constatava no art. 153, § 25, da Emenda n.1 que garantia assim ao autor o direito exclusivo de utilização das obras literárias, científicas e artísticas.

Na CF vigente é igualmente assegurado pelo art. 5o, XVII além da atual Lei 9.610/98 em seu art. 77 que estipula que o direito de reprodução não é transmitido com a alienação da obra artística, salvo se as partes assim estipularem, e, conforme, o art. 78, essa autorização para reprodução deve ser por escrito e se presume onerosa.

Sobre direito autoral há excelente obra de Antonio Chaves sobre a “Nova Lei Brasileira do Direito do Autor”, São Paulo, RT, de 1975, de Fábio Maria de Mattia, “Estudos de direito do autor”, SP, RT, 1976 e, ainda Dirceu de Oliveira e Silva, “O direito do autor”, RT, Ed. Nacional de Direitos, 1956. São essas as chamadas obras clássicas imprescindíveis a boa compreensão da amplitude jurídica do direito autoral no Brasil.

E, em relação a software, temos ainda Arnoldo Wald, “A proteção jurídica do software”, Rio de Janeiro, Editora Forense, 1985.

É importante frisar que a enorme pirataria de CD e de programas que ocorre no Brasil traduz um enorme prejuízo e desrespeitos aos direitos autorais e que carece de dispositivos legais e jurídicos adequados a coibi-la eficazmente e, dá margem a responsabilidade subsidiária do Poder Público em face de seu depauperado mecanismo de fiscalização e controle sobre a circulação de mercadorias que trazem embutidas o direito do autor.

Referências

WALD, Arnoldo. Direito das coisas. 11a. ed., ver. Atualizada com colaboração dos professores Álvaro Villaça Azevedo e Vera Fradera, São Paulo, Saraiva, 2002.

MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil, v.3: direito das coisas, 37a. Edição, ver. Atualizado por Carlos Alberto Dabus Maluf, São Paulo, Saraiva, 2003.

RODRIGUES, Silvio. Direito Civil, v.5. Direito das coisas, 27a. ed.ver. Atualizada de acordo o novo Código Civil, São Paulo, Saraiva, 2002.

DE MELO, Marco Aurélio Bezerra. Novo Código Civil Anotado. Direito das coisas volume V (arts. 1.196 a 1.510).Rio de Janeiro, Editora Lúmen Júris, 2002.
--------------------------------------------------------------------------------
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 01/03/2007
Copyright © 2007. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.


Comentários



Site do Escritor criado por Recanto das Letras
 
iDcionário Aulete