Tragédia suburbana
Estava no ar a tragédia
Antes o estampido
Um reles barulho seco e curto
Atravessou toda a rua
E acertou a cabeça do menino
Os olhos ainda arregalados
Espelhavam todo o sangue
Esparramado no chão
Olhares atônitos
Se entrecortavam
Caçando a secreta lógica
De tudo...
A bala perdida
A cápsula semi-rota
Jazia próximo ao corpo do menino
Que ainda se estremecia
Num último tremor de vida
Os olhos se recusavam as
lágrimas
As bocas se furtavam
ao grito de pavor
Os rostos se recusavam
as expressões, aos traços dizíveis
O corpo do menino
parava de estremecer
Mas o sangue intrépido
seguia seu curso
rente à calçada
em direção à
inexorável sarjeta
Menos uma vida
Menos um jovem no mundo
Menos um adulto a crescer
Mais uma morte anônima, mais uma bala perdida
que acha finalmente um definitivo alvo
antes de se perder
novamente
no emaranhado de notícias esquecidas ... e cotidianas
A mãe
foi a última chegar
A cena e o sangue
narravam tudo menos
a razão do acaso.
P.s. Eu reles como sou
Transformei a pequena tragédia
Em algumas letras
Como se pudesse diminuir-lhe
A gravidade e
Achar o poético num esbarrão
Gisele Leite
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 10/02/2007
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