"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

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Apontamentos acerca do direito de superfície no direito civil brasileiro
Veio o Código Civil brasileiro, ou seja, da Lei 10.406, de 10/01/2002 a reintroduzir o direito de superfície, outrora previsto na legislação do Reino de Portugal e aplicada no direito pré-codificado, porém não contemplado pelo Código Civil de 1916.

Não há nada de novo, eis que os jurisconsultos romanos já o haviam concebido séculos atrás. Trata-se de direito real de fruição ou gozo sobre coisa alheia, de origem romana. Deve-se sua origem a necessidade prática de se permitir edificação sobre bens públicos, permanecendo o solo em poder do Estado.

No direito romano o Estado arrendava suas terras a particulares, que se obrigavam ao pagamento dos vectigali , com o objetivo precípuo de manter a posse das largas terras conquistadas.

É o direito real pelo qual o proprietário do imóvel atribui a outrem o poder de construir ou de plantar em seu terreno urbano ou rural.

O superficiário não é o dono, mas tem sobre a coisa alheia o direito de construir ou plantar.

Ad comparandum com a enfiteuse como direito real de duração indeterminada, somente poderia ter por objeto terras não cultivadas ou terrenos que se destinassem à edificação.

A razão histórica de sua existência assentava-se na necessidade de povoamento e colonização do vasto Império Romano, eis o porquê nosso legislador, extremamente influenciado pela concepção romanista , imprimiu caráter especial fundiário a tal direito.

Podemos definir o direito de superfície como o direito de construir e plantar em imóvel alheio, conferido pelo fundieiro (proprietário do solo) em benefício do superficiário(titular do direito), que passaraá a exercer a posse direta da coisa, dentro de prazo determinado.

Diante da concepção constante no art. 1.369 do Código Civil, logo se pode destacar as seguintes características:

a) o direito real de superfície concede ao seu titular o direito de construir ou plantar em terreno alheio, sem descaracterizar ou prejudicar a substância da coisa principal;
b) é sempre pactuado em caráter temporário, diferentemente da enfiteuse, que era perpétua;
c) a sua constituição somente se dará por escritura pública, devidamente registrada no Cartório de Registro de imóveis;
d) não se admite a realização de obra no subsolo, ressalvada a hipótese de haver previsão contratual expressa neste sentido.

No direito atual, o aludido instituto é regulado, entre outros, no direito italiano ( arts. 952 a 956 do CC), no direito português ( arts. 1.524 ao 1.542 CC), no direito alemão ( arts. 1.012 ao 1.017), no direito austríaco ( arts. 1.125, 1.147 e 1.150), no direio suíço ( arts. 675 e 779), no direito holandês ( arts. 758 e 766) e no direito belga (Lei 10/01/1984). Confere este, em essência, a uma ou várias pessoas o direito de construir ou plantar em terreno alheio.

A Lei 10.257/2001 denominada de “Estatuto da Cidade” que regulamentou os arts. 182 e 183 da Constituição Federal Brasileiro, antecipou-se ao atual Código Civil, disciplinando o direito superfície limitado, porém, a imóvel urbano, enquanto este cuida do urbano e também do rural. Com a entrada em vigor, porém, esse último diplima sofreu derrogação do aludido Estatuto, passando o instituto em apreço a ser regulado inteiramente pelos arts. 1.369 ao 1.377 do CC.

Há de se lembrar que não se aplica in casu, o princípio da especialidade, segundo o qual a lex specialis derrogat a legi generali quando disciplinar, de forma diversa, o mesmo tema. É a opinião de Carlos Roberto Gonçalves

Ocorre a revogação tácita quando a lei nova, de caráter amplo e geral, passa a regular totalmente a matéria versada na lei anterior, vindo a lei revogadora, neste caso, substituir inteiramente a antiga.

Desse modo, se toda uma matéria é submetida a nova regulamentação, desaparece totalmente a lei anterior que disciplinava do mesmo assunto.

Não há que se confundir, ainda, o direito de superfície com o arrendamento. A diferença é manifesta, na medida em que a superfície tem natureza real, podendo constituir-se gratuitamente; enquanto o arrendamento, por sua vez, é figura eminentemente contratual, geradora de efeitos obrigacionais.

Com vigor, ressalta a diferença Rogério Derbly:
“Esclarece José Teixeira que “ a natureza jurídica desses dois institutos – arrendamento e superfície – é diversa, bastando-nos mencionar que se a superfície tem caráter real e confere ao superficiário a propriedade da construção ou plantação, o arrendamento tem caráter estritamente obrigacional, não podendo jamais conduzir o arrendatário a tornar-se dono da coisa arrendada.”

“Entendemos a diferença maior entre os dois institutos é o fato de que no arrendamento o pagamento é requisito necessário para sua configuração, diferentemente do que ocorre no direito de superfície onde não é necessário para a sua caracterização.”

Através desse direito real, o proprietário do solo confere a outrem (superficiário), gratuita ou onerosamente, a prerrogativa de realizar obras e explorar o imóvel, desenvolvendo-o, com os seus acréscimos, ao final do prazo pactuado.

Sendo temporário, portanto, é útil as duas partes. A concessão da superfície pode ser gratuita ou onerosa. Se for onerosa, estipularão as partes se o pagamento será feito de uma só vez, ou parceladamente (art. 1.370 CC).
A instituição da superfície é por escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis  ( art. 1.369 CC) devendo ser instituída por tempo determinado.

Em contrapartida, o art. 21 da Lei 10.257/2001 (Estatuto da Cidade) admite a instituição por tempo determinado ou indeterminado. Reparem que o art. 1.377 do CC dispõe que o direito de superfície, constituído por pessoa jurídica de direito público interno, rege-se por este Código, no que não for diversamente disciplinado em lei especial.

Portanto, o direito de superfície instituído por particular ou pessoa jurídica de direito privado rege-se pelo Código Civil de 2002, devendo ser estipulado expressamente o tempo de duração. Porém, se instituído por pessoa jurídica de direito público pode ser tanto por tempo determinado como por tempo indeterminado , aplicando-se a Lei 10.257/2001, bem como as Leris 4.504/1964(Estatuto da terra), 9.636/1998, 4.947/1966 e 8.629/1993.

Esta lei sofreu redução de seu campo de incidência, aplicando-se apenas ao direito de superfície instituído por pessoa jurídica de direito público interno.

A questão da revogação ou não do Estatuto da Cidade pelo atual Código Civil é polêmica. Uns doutrinadores proclama a revogação integral, pois lei posterior revoga a anterior. No entanto, outros doutrinadores apregoam a manutenção do Estatuto da Cidade, pois a lei geral não revoga a especial.

A I Jornada de Direito Civil promovida pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça Federal editou Enunciado 93 dispondo que: “ as normas previstas no Código Civil, regulando direito de superfície, não revogam as normas relativas ao direito de superfície constante do Estatuto da Cidade, por ser instrumento de política de desenvolvimento urbano.

Cumpre advertir que o Projeto de Reforma do Código Civil (Projeto de Lei 6.960/2002) se aprovado irá alterar o art. 1.639, conferindo maior extensão ao direito de superfície, admitindo inclusive a possibilidade, já apontada pela doutrina, de se conferir ao superficiário o direito de realizar benfeitorias nas edificações do imóvel, sempre respeitada a legislação urbanística.

Apesar da vigente regra não ser tão abrangente não há óbice ao superficiário realize benfeitorias nas edificações já existentes, ou que se constitua o direito em imóvel em construção.

O Código Civil de 2022 aboliu a enfiteuse, subsituindo-a pelo direito de superfície gratuito ou oneroso.

Consideramos vantajosa tal substituição  pois permite melhor e mais ampla utilização da coisa. Se o proprietário de uma área de terras não tiver os recursos necessários para explorá-las, poderá cedê-la a alguém em superfície para, na referida gleba, por exemplo, construir e explorar um hotel.

Alguns países, todavia, mantêm em seus códigos o direito de superfície ao lado da enfiteuse, distinguindo-lhes as finalidades, conforme o faz o Código Civil italiano, ou não as distinguindo, conforme o Código Civil português.

A respeito da usucapião do direito de superfície, desenvolveram-se duas correntes. A primeira sustentada por Maria Helena Diniz, nega o direito de usucapir, baseando-se no art. 1.369 do CC, segundo o qual a superfície deve ser instituída mediante escritura pública. O CC é omisso sobre a possibilidade de instituí-la por usucapião ou testamento, impondo-se a negativa, diante do princípio da legalidade dos registros públicos, isto é, só se registra aquilo que a lei autoriza.

Ademais, o CC impõe limite temporal ao direito de superfície, que deve ser instituído por tempo determinado, ao passo que na usucapião haveria uma superfície por tempo indeterminado, contrariando o previsto no CC.

Uma segunda corrente que é defendida por Joel Dias Figueiredo admite a possibilidade de usucapir o direito de superfície. Cita, como exemplo, a hipótese de celebração de uma concessão de direito de construir por instrumento particular em que, após o decurso do prazo e comprovados os demais requisitos, o interessado postule a usucapião do direito de superfície.

É relevante observar a disjuntiva ou ( construir ou plantar) não foi usada no art. 1.369 do CC com sentido restritivo. Nada impede que o proprietário concedente e o superficiário convencionem que a concessão terá por objeto o direito de construir e plantar. Igualmente nada impede que mais de uma pessoa seja titular do direito de superfície ou que o superficiário construa para alugar, ou ainda institua hipoteca sobre o imóvel a fim de obter recurso para neste construir.

Como tem por objeto a construção de uma obra, o direito de usperfície pode abranger parte do solo não necessária à sua implantação, desde que esta tenha utilidade para o uso da obra, conforme prescreve o art. 1.525 do CC português.

Observamos a restrução prevista no art. 1.369 do CC no tocantre ao subsolo, embora tal dispositivo seja omisso quanto ao espaço aéreo, nada impede a sua utilização pelo superficiário, vez que constitui este parte integrante do solo, conforme enunciava o art.43, I do Código Civil Brasileiro do 1916.

A rigor, não se pode ter propriedade ou direitos diversos entre o solo e os bens que lhe são acessórios, salvo expressa disposição legal, como sucede no caso do direito de superfície, que opera a dissociação entre o titular de poderes inerentes ao domínio do solo e do subsolo do titular das acessões industriais, ou seja, das construções e plantações.

De fato, o fenômeno da edificação e da plantação é dominado pelo princípio superficies solo cedit, por força do qual tudo que se planta ou constrói em solo alheio é de propriedade do dono do solo  (dominus soli).

Conforme assinala Ricardo Pereira Lira, a suspensão dos efeitos da acessão, quando se terá a superfície temporânea, ou a interrupção dos efeitos da acessão, quando se consubstanciará caso de superfície perpétua.

Não incindirá, nessas hipóteses, o aludido princípio superficies solo cedit , pois a propriedade da construção ou plantação é de quem a realizou, continuandoo terreno no domínio do dono do solo. Essa suspensão ou interrupção resulta do direito de superfície.

Todavia, podem as partes, de comum acordo, estabelecer limites no contrato, submetendo a utilização do espaço aéreo ao necessário para as cosntruções ou plantações, desta forma, sintonizando-a com o objeto da concessão.

De acordo com sistema vigente e adotado pelo CC de 202, se o imóvel já possuir construção ou plantação não poderá ser objeto de direito de superfície, porque somente o terreno se presta a essa finalidade, salvo se for convencionada a demolição da construão existente para reconstrução ou construção de outra, ou a erradicação da plantação existente para fins de utilização do terreno para os mesmos fins.

Também não foi contemplada a possibilidade de sobrelevação ou da superfície em segundo grau, autorizada nos direitos português, francês e suíço e que consiste na concessão feita a terceiro, pelo superficiário, do direito de construir sobre a sua propriedade superficiária, ou seja, sobre a sua laje.

Durante o período de vigência do contrato que instituiu o direito de superfiície, o proprietário confere ao superficiário a propriedade útil de seu imóvel para neste construa ou planta como titular de direito real oponível erga omnes, e com prerrogativa de sequela, é natural que incumba a este o pagamento de encargos e tributos que venham recair no imóvel, bem como despesas de conservação e manutenção, conforme preceitura o art. 1.371 do CC.

A referida responsabilidade do superficiário se aplica a totalidade do imóvel, compreendendo tanto a área construída como os acréscimos que recaírem sobre a cosntrução ou sobre a plantação.

A regra, no entanto, é supletiva, podendo as partes convencionarem de maneira diversa.

O descumprimento da obrigação poderá ser sancionado com a resolução do direito de superfície, uma vez constituído o superficiário em mora.

O direito de superfície importa em concessão temporária fixando no título instituidor seu tempo de duração. O solarium ou canon que é a importância a ser paga que pode ser de uma só vez, pelo concessionário ao concedente, na superfície remunerada.

Assim, surge uma propriedade resolúvel(art. 1.359 CC). No caso de efetuar o superficiário negócio jurídico que tenha por objeto o direito de superfície, ou no de sucessão mortis causa, o adquirente recebe-o subordinando à condição resolutiva.

Em doutrina é tema controvertido a possibilidade de constituição de direito de superfície através da usucapião. Em tese, tal  possibilidade existe vez que comprovados e preenchidos todos os requisitos desta, observando-se que nada impede a modificação do caráter originário da posse, quando, acompanhando a mudanção da vontande, sobrevém igualmente uma nova causa possessionis, ocorrendo então consigna o art. 1.528 que “o direito de superfície pode ser constituído por contrato, testamento ou usucapião, e pode resultar da alienação da obra ou árvores já existentes, separadamente da propriedade do solo.”

Identificamos que a maior dificuldade que tanto inviaviliza a usucapião extraordinária , uma vez que se certa pessoa exerce posse de certa edificação com animus rem sibi habendi, desde que satisfeitos os demais requisitos da usucapião adquirirá necessariamente o domínio do trato de terra sobre o qual assenta a referida edificação, tornando-se, desta maneira, proprietário do todo, não se caracterizando logicamente uma propriedade separada, superficiária, mantida sobre o solo de outrem.

Pode, no entanto, dar-se a aquisição do aludido direito pela usucapião ordinária, na hipótese, por exemplo, de sua concessão ter sido feita anteriormente a non domino.

Nesse caso, o concessionário adquire o direito de superfície contra o proprietário do solo, desde que haja conservado a posse na qualidade de superficiário pelo tempo necessário, demonstrando ser portador de boa-fé.

Configura-se também a possibilidade de usucapião  quando a concessão do direito de construir ocorrer por meio de instrumento particular, permanecendo a edificação ou plantação na posse do adquirente pelo prazo legal; e, ainda, no caso de uma edificação, relativamente à qual se tenham operado os efeitos da acessão, em que o possuidor da edificação com animus domini, passe a pagar, pelo prazo suficiente à consumação da prescrição aquisitiva, um salário, que implica evidente reconhecimento do domínio do trato de terra sobre o qual está a edificação, aperfeiçoando-se, assim, a aquisição pelo usucapiente, da edificação, pousada sobre o solo de outrem.

A natureza jurídica do direito de superfície corresponde a direito real de fruição de coisa alheia, dotado com as seguintes características: a) direito real imobiliário: só há superfície sobre bens imóveis. Sua natureza e finalidade são incompatíveis com coisas móveis; direito acessório, pois depende diretamente da existencia do direito de propriedade; direito alienável, com efeito, conforme dispõe o art. 1.372 CC.

No entanto, não poderá ser estipulado pelo superficiário a nenhum título, qualquer pagamento pela sua transferência(parágrafo único do art. 1.372 CC).

Em caso de alienação do imóvel, o superficiário tem direito de preferência, em igualdade de condições. No caso de alienação do direito de superfície, o proprietário igualmente tem direito de preferência em igualdade de condições( art. 1.373 do CC). E, nessa última situação, ocorrrerá a consolidação de propriedade, extinguindo-se o direito de superfície. Portanto, evidencia-se que o direito de preferência é recíproco.

A concessão do direito real de superfície em caráter oneroso é a forma mais comum de constituição. E ocorrerá quando o fundieiro fará jus a renda previamente estipulada, devida pelo titular da superfície, durante todo o tempo em que viger o contrato.

Note-se, outrossim que esta remuneração devida ao fundieiro não se confunde com o foro decorrente da enfiteuse. Este último, como é sabido, corresponde àquela renda fixa e invariável, paga anualmente pelo enfiteuta ao senhoria, sob pena de comisso (extinção da enfiteuse por falta de pagamento por três anos consecutivos).

A transferência  do direito de superfície previsto no art. 1.372 do CC impõe a proibição imposta ao proprietário do solo de cobrar qualquer taxa ou retribuição pela transferência do direito de superfície incide ipso iure, independentemente de previsão no contrato.

Diversamente o que ocorre na enfiteuse, em que o proprietário ou senhorio recebe o laudêmio toda vez que se transfere, a título oneroso, o domínio útil da coisa, e que é representado por uma percentagem sobre o preço da venda, não se pode estipular, no caso da superfície, a qualquer título, nenhum pagamento pela transferência.

Tal previsão se adequa à tendência universal de se eliminar qualquer cobrança por parte dos proprietários de imóveis, quando da transferência a terceiros de direitos reais cosntituídos sobre os mesmos .

O Código Civil italiano e o português anteriores ( dos anos de 1865 e 1867, respectivamente) já haviam eliminado os laudêmios, vultosas prestações análogas, que, nas enfiteuses mais antigas, nas quais os resquícios do feudalismo se faziam mais evidentes, representavam uma espécie de homenagem ao senhor feudal pelo consentimento deste na transferência onerosa da enfiteuse que o vassalo fizesse a terceiro (laudemium) ou na transmissão de um feudo aos herdeiros do vassalo que falecera(lutuosa), pois, como assinala José Guilherme Braga Teixeira, com tal consentimento o senhor feudal, titular do domínio direto, abria mão do seu direito de prelação e da consolidação do domínio do imóvel na sua pessoa.

Embora várias legislações permitam que a superfície seja constituída por tempo indeterminado, nosso Código Civil de 2002 só a admite por tempo determinado, ex vi o art. 1.369. Desta forma, extingue-se com o advento do termo final estabelecido no contrato.

Dispõe, ainda o art. 1.374 do CC que, “antes do termo final, resolver-se-á a concessão se o superficiário der ao terreno destinação diversa daquela para que foi concedida”

Pactuado o direito de superfície, este integra o patrimônio do superficiário, de maneira que, com a sua morte, deverá ser transmitido, por força do princípio da saisine, aos seus herdeiros legítimos ou testamentários, respeitado seu prazo máximo do instituto. Qualquer cláusula contrária a esta norma deverá ser reputada nula de pleno direito.

Em verdade, a mantença do direito em face dos herdeiros é reflexo da socialização do contrato e da propriedade, na medida em que não interrompe a utilização socieconômica do bem, mesmo após a morte do titular do direito.

Na verdade, a propriedade é a pedra fundamental de todos os outros direitos reais. Portanto, a partir do destacamento de suas faculdades, que passam a ser conferidas a um terceiro, surgem os direitos reais de gozo ou fruição.

O usufrutuário é titular das faculdades de usar e fruir(gozar) a coisa principal, pertencente ao nu-proprietário, que se despoja desses poderes. Dessa forma, dois direitos coexistem lado a lado: o direito real de usufruto(derivado) e o direito de propriedade (matriz).

Pela sua natural característica da elasticidade, o nosso sistema jurídico tende a facilitar a reconciliação do direito de propriedade, na medida em que este, sem dúvida, é mais amplo e socialmente útil, enfim, um direito real reconhecido.

Por essa razão, o art. 1.373 do CC facilita a reunião de todas as faculdades inerentes ao direito de propriedade, na medida em que confere preferência a qualquer das partes ( fundieiro ou superficiário), quando da alienação do imóvel ou da cessão do direito real da superfície, evitando, assim, que o direito permaneça desmembrado.

A norma que estipula a recíproca preferência, nada expõe no caso de violação. Se preterido o direito de preferência, a parte prejudicada fará jus à adjudicação forçada do imóvel ou do direito, ou simplesmente, resolver-se-á com a outra em perdas e danos.

A nossa tradição jurídica e o CC de 2002 cuidou em fixar no art. 518 que o vendedor preterido poderá exigir perdas e danos, negando-lhe, pois o direito à reivindicação da coisa.

Em sede de contratos seja de compra e venda, de arrendamento, a violação do direito de preferência gera efeitos simplesmente obrigacionais.

Porém, esta não foi a solução dada pelo legislador no caso de contrato de locação, ex vi o art. 27 da Lei 8.245/91 (Lei de inquilinado) posto que garante a preferência do locatário. Que poderá gerar efeito real, conferindo ao locatário preterido o direito de reivindicar a coisa, desde que deposite o preço devido, obedecidas as condições fixadas em lei ( vide art. 33 do mesmo diploma legal).

Pela natureza da preferência, uma eventual eficácia real do descumprimento do direito de preferência deveria vir necessariamente prevista em lei, não se podendo presumi-lo.

À luz do princípio da legalidade, esta faculdade reivindicatória, conferida à parte preterida, deveria constar no corpo do texto legal que, inclusive, faria referência às condições para o exercício desta prerrogativa.

O art. 1.374 do CC confere elemento teleológico ou finalístico ao direito de superfície. Trata-se da característica da especificidade da destinação, que também está presente, ainda que implicitamente, no direito de usufruto, consoante se depreende da análise do art. 1.410, VII.

A extinção do direito de superfície em várias legislações, permitam seja a superfície constituída por tempo indeterminado, o CC brasileiro só admite a sua contratação por tempo determinado (art. 1.369). Portanto, a natural extinção ocorrerá por conta do termo final.

Se, por exemplo, foi concedido o direito de construir um edifício e o superficiário simplesmente o aluga para estacionamento, sem que haja sinais do início da obra, configura-se o desvio da finalidade contratual do direito de superfície o que ensejha a sua extinção.

Mas, é possível haver a demora por dificuldade na aprovação da planta ou por outro motivo imperioso. Não havendo, nesse caso, a retomada do imóvel.

De fato, a regulação prevista visa evitar a burla das finalidades e termos estabelecidos na avença, bem como a ofensa ao princípio da boa-fé objetiva,que deve ser observado e respeitado durante todo o período de execução do contrato.

É defesa, portanto, a alteração unilateral. Qualquer modificação posterior da destinação da utilização do solo deve ser feita em comum acordo por termo aditivo, observando-se as mesmas formalidades exigidas originariamente.

Prescreve ainda o art. 1.375 do CC, por sua vez, “extinta a concessão, o proprietário passará a ter a propriedade plena sobre o terreno, a construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário.”

O proprietário concedente tem, assim, a expectativa de receber a coisa com a obra ou a plantação. Extinta a concessão, a cosntrução ou plantação incoroiran-se ao solo em definitivo, retornando ao princípio superficies solo cedit .

Tendo em vista que a superficie importa em desmembramento da propriedade, a extinção desta implica o remembramento que opera em favor do dominus soli.

Podem os interessados a faculdade de ajustar o que melhor lhes convier, no caso de ficar extinta a superfície. Nada impede que se convencione o pagamento de indenização pelo dono do terreno ao superficiário, considerando-se que este devolve o terreno em regra valorizado.

O art. 1.376 do CCC prevê outro modo de extinção da concessão superficiária: a desapropriação. E, caberá indenização ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um.

O dono do terreno recebe o equivalente ao seu valor enquanto o superficiário é indenizado pela construção ou plantação.

Outros modos de extinção do direito de superfície são previstos nas legislações de outros países, como:
a) renúncia do superficiário; b) confusão, quandfo na mesma pessoa reúnem-se as condições de proprietário do solo e da superfície; c) resolução, em virtude do descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo superficiário; d) resilição bilateral; e) prescrição; f) perecimento do objeto; g) não-conclusão da construção ou da plantação, pelo superficiário, no prazo estabelecido; h) inviabilidade da construção ou plantação, ou destruição de uma ou outra; i) falta de pagamento das prestações periódicas, quando adotada esta modalidade de remuneração.

O descumprimento das obrigações e encargos impostos ao supercificário necessita ser comprovado em juízo que ocorra a resolução por culpa deste. Devem estes estar previstos e devidamente delimitados no contrato, para que possam regular as relações dele originadas.

O direito real de superfície é extinto nas seguintes hipóteses, em resumo:
a) pela consolidação, ocorre quando o proprietário do solo adquire a propriedade superficiária, ou quando o proprietário superficiário adquire a propriedade do solo;

b) pelo fato de o superficiário dar ao terreno destinação diversa da convencionada( art. 1.374 CC) Nesse caso, a extinção opera-se antes do termo final;
c) pela renúncia do superficiário;
d) pelo distrato;
e) pelo perecimento do terreno gravado;
f) pelo advento do termo;
g) pelo inadimplemento das obrigações assumidas pelo superficiário;
h) pela desapropriação que incida sobre o solo ou sobre direito de superfície. Em tal situação, a indenização cabe ao proprietário e ao superficiário, no valor correspondente ao direito real de cada um  (art. 1.376 CC);
i) pelo falecimento do superficiário sem herdeiros.

Pela decadência a extinção do direito de superfície em algumas legislações prevêem o fim do direito de construir ou plantar, se a construção ou plantação não foi feita até o prazo fixado legal ou contratualmente. Em Portugal , salvo disposição contratual, o prazo é de dez anos. Na Itália é de vinte anos e, na Espanha é de cinco anos.

À exceção da extinção por desapropriação, nos demais casos, a extinção opera a consolidação da propriedade plena, sobre o terreno, construção ou plantação, independentemente de indenização, se as partes não houverem estipulado o contrário (art. 1.375 CC).

Deverá a extinção ser averbada na matrícula imobiliária no Registro de Imóveis, configurando assim a propriedade plena.

O descumprimento das obrigações e encargos impostos ao superficiário necessita ser comprovado em juízo, para que ocorra a resolução por culpa deste. Devem estes estar previstos e devidamente delimitados no contrato, para que possam regular as relações este originadas.

Segundo Konrad Hesse a releitura constitucionalizada do Código Civil requer que não mais se observe a positivação de um regime de exclusão social, mas sim de uma regulação social. Realmente no Estado Democrático de Direito, cujo objetivo é a radical efetivação de direitos fundamentais, o regime de titularidade alcança novos sentido e nuance.
A função social  não se aplica exclusivamente ao direito de propriedade, mas a qualquer regime de titularidade, capaz de instrumentalizar poderes dominiais. A despatrimonialização e a repersonalização do direito privado não encontram ressonância apenas na propriedade, mas em qualquer outra forma de apropriação de de bens regulada no ordenamento.

O direito subjetivo da propriedade não se exerce sobre a coisa, mas perante pessoas dentro de relações jurídicas complexas. Este raciocínio se aplica inteiramente ao usufruto, uso, servidão e demais direitos reais, que não recaem sobre bens, pois em qualquer direito real o que é exercido sobre o objeto são atributos dominiais do uso, fruição e disposição.

Equivale dizer, o direito real em coisa alheio é o domínio estático do titular sobre a coisa, a relação de subordinação do objeto do senhorio. Porém, a titularidade, no exercício dos direitos reais limitados, volta-se a relações intersubjetivas dinâmicas e repersonalizadas, nos quais os titulares desses direitos limitados têm a obrigação de coordenar a satisfação de seu interesse, com a do proprietário que lhe desdobrou parcelas do domínio, sem esquecer a conduta benéfica ao interesse coletivo.

Assim, no caso de plantação há de se preocupar com higidez do meio ambiente, e ainda, o respeito às regras do Código de Obras, e demais regramentos que visem a melhoria da qualidade de vida e ao desenvolvimento sustentável.

Referências
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MALTINI, Eliana Raposo. Direito civil – direito das coisas. Coleção Estudos Direcionados Perguntas e respostas. 3ª. Edição, São Paulo, Editora Saraiva. 2010.

DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. 17ª ed., São Paulo, Editora Saraiva, 2002.
LIRA, Ricardo Pereira. O direito de superfície e o novo Código Civil. São Paulo, Editora Revistra dos Tribunais, 2003.
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. 3ª ed. Rio de Janeiro, Editora Forense, 1977.
_________________________. Instituições de direito civil. 19ª ed., Rio de Janeiro, Editora Forense, 2001
VENOSA, Sílvio de Salvo. Código Civil comentado. Coord. De Álvaro Villaça Azevedo. São Paulo, Editora Atlas, 2003, vol. XII.
________________________________________ Direito civil. 4ª ed., São Paulo, Editora Atlas, volume V.
WALD, Arnoldo. Direitos das coisas. 11ª edição. São Paulo, Editora Dsaraiva, 2002.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 28/07/2011
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