"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

Textos

Análise sobre a revelia e seus efeitos. (primeira parte)


O presente artigo tomou por base a obra intitulada “Revelia e seus efeitos” de autoria de Umberto Bara Bresolin, da coleção Atlas de Processo Civil, sob a coordenação de Carlos Alberto Carmona. Aliás, a quem rendo sinceras homenagens por seu trabalho.



A quem rendo sinceras homenagens principalmente por adentrar em tema tão pouco esclarecido tanto pela doutrina como pela jurisprudência.

Representa a revelia do réu a situação de inatividade total do demandado que, apesar de regularmente citado e chamado para o processo, desatende completamente o ônus de responder e não comparecer ao processo.

Analisaremos então de forma crítica e com ênfase publicista principalmente em face da instrumentalidade das formas, suas possíveis conseqüências da revelia, que são chamadas ordinariamente de efeitos da revelia.

A princípio temos a presunção relativa que reputa com verdadeira a alegação produzida pelo demandante (art. 319 do CPC) propiciando, portanto o julgamento antecipado da lide conforme aduz o art. 330, II do CPC e, ainda, o curso dos prazos contra o revel, independentemente de intimação (aliás, o art. 322 do CPC com a edição da Lei 11.380/2006 ganhou nova redação, in verbis: “Contra o revel que não tenha patrono nos autos, correrão os prazos independentemente de intimação, a partir da publicação de cada ato decisório.”  *

E, ainda seu parágrafo único, aduz: “O revel poderá intervir no processo em qualquer fase, recebendo-o no estado em que se encontrar.” Portanto, a revelia não opera a exclusão do réu e nem veda sua participação ulterior na relação jurídica processual.

Apesar de permitir a intervenção do réu em qualquer fase do procedimento, sem retroação da matéria preclusa. Recente ressalva no CPC pátrio restringe o efeito contra o revel sem patrono nos autos no que tange ao transcurso de prazos sem prévia comunicação.

Em alguns dos ordenamentos processuais estrangeiros modernos mais relevantes que influenciaram o ordenamento pátrio, como no caso do direito alemão, tido como paradigma do chamado sistema da ficta confessio refere-se à principal conseqüência da revelia, prevista no art. 319 do CPC, como no direito português e italiano que têm por base o sistema da ficta litiscontestatio presente no sistema argentino, uruguaio e o CPC Tipo para Íbero-América.

A doutrina ressalta que em face do caráter publicista do processo, deve-se enfatizar o incremento dos poderes instrutórios do juiz e defendido sua participação ativa na fase probatória, ainda que o direito material em discussão seja disponível, com o objetivo de buscar na medida do possível, a verdade real quanto aos fatos alegados pelas partes.*

Lembremos que o atual do CPC acolheu sistema fundado na discutível orientação de que aquele que deixa de defender-se provavelmente não tem razão e impôs conseqüências aparentemente drásticas para a revelia, conforme indica os termos do art. 319 e 322 do CPC, permitindo ainda o julgamento antecipado da lide (art. 330, inciso II do CPC).

Diante de severa disciplina legal, J. J. Calmon de Passos que ressalta que o revel deixou de ser ausente para se tornar um delinqüente... Portanto, m a revelia é tratada por vezes como se fosse grave delito ou pecado mortal.

O enfoque privatista pode conduzir a indesejáveis resultados principalmente por ameaçar a pacificação com justiça, não sendo só prejudicial ao revel, mas igualmente para toda a sociedade e a busca da verdade. Um processo injusto é um desserviço para toda a sociedade e motivo de intranqüilidade.

Mais atinente à realidade e aos reais escopos do processo no cenário contemporâneo tanto a jurisprudência como legislador (através das sucessivas ondas de reforma do CPC) têm abrandado proporcionalmente os rigores dos efeitos da revelia e combatido especialmente a idéia de que o magistrado deveria ater-se somente e automaticamente a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo demandado apenas porque não impugnados pelo réu, mesmo que sua consciência lhe apontasse justamente para o contrário.*

Infelizmente a doutrina processual civil não tem dedicado a devida atenção que o tema requer, embora que grande parte dos manuais encampe e encoraje a grande tendência jurisprudencial flexibililzadora dos efeitos da revelia.

É curial que logo de plano, distinguir revelia e contumácia. Primeiramente etimologicamente, pois rebellis é palavra do latim que significa rebelde, revoltado enquanto que contumax, com sentido de aquele que resiste. A contumácia era expressão utilizada pelo Direito Romano clássico e justinianeu, para designar aquele, que devidamente citado, não comparecia em juízo.

A doutrina pátria majoritária distingue a revelia da contumácia. A contumácia é o gênero que compreende, de modo mais amplo, a inatividade em qualquer processo. A expressão revelia deve ser reservada para designar tão-somente a modalidade restrita de inatividade caracterizada pela não-apresentação de resposta, aplicável somente ao réu nos processos de conhecimento e cautelar.

A revelia é, portanto para tal corrente, uma espécie do gênero contumácia. A doutrina de modo em geral, conceitua revelia como audiência de contestação, quando na verdade, a audiência de contestação relaciona-se com um dos efeitos da revelia, o principal deles, que é presunção de veracidade dos fatos articulados na inicial.

Outros doutrinadores, focados nos aspectos históricos e principalmente de direito estrangeiro, consideram contumácia e revelia como termos sinônimos, concluindo que tais expressões podem até ser empregadas indistintamente (é o entendimento de Calmon de Passos posto que entenda que ambas as expressões significam o fenômeno do desatendimento, pelas partes, do dever ou do ônus, tanto de atuar como comparecer).

Em tempo, é importante apontar que no procedimento sumário, aonde se requer no chamamento do processo, seu comparecimento a audiência de conciliação, ocorre primeiramente a contumácia e depois a revelia, pois desatende ao ônus de responder.

Merece destaque especial o entendimento de Rogério Lauria Tucci que esclarece ser a revelia, efeito da contumácia, e na atual fase da ciência processual com precisão se distingue a revelia da contumácia, como estado de fato, e de seus efeitos, tidos como conseqüências desse estado de fato.

Vistoriando a doutrina ligada a família jurídica romano-germânica evidenciamos que no ordenamento italiano a contumácia, no direito alemão é kontumaz, já na Espanha e demais países de origem ibérica, o fenômeno é indicado pela expressão rebeldia.

A preferência por uma ou outra expressão depende então da tradição legislativa e doutrinária. Então o CPC Brasileiro e o português mencionam apenas a revelia . Mas destacamos que a revelia é sempre do réu, ao passo que a contumácia pode ser tanto do réu como do autor.

A noção mais lato sensu da inatividade de qualquer das partes em qualquer processo, caracterizada pela não-realização de algum ato processual, mais precisamente de um ônus, a que a doutrina majoritária chamou contumácia, fosse designada simplesmente pelo termo inatividade.

Para se compreender de forma mais adequada o tema é mesmo indispensável um mergulho no Direito Romano e, percebemos que o processo civil romano é dividido em três grandes períodos: legis actiones (desde a fundação de Roma, em 754 a.C., até os fins da República); outro período é o per formulas (introduzido pela Lex Aebutia – art.149-126 a.C.) oficializado pela Lex Julia privatorum 17 a.C., vigorando até a época de Diocleciano – 282-305 d.C.), que em conjunto com o período anterior constitui a denominada ordo iudiciorum privatorum e, por fim, cognitio extra ordinem (desde o advento do principado – 27 a. C – até a queda do Império Romano do Ocidente).

Importante observar ainda que durante a fase do ordo iudiciorum privatorum a instância era bipartida: iniciava-se o processo perante o pretor (fase in iure), que posteriormente prosseguia o iudex ou arbiter (fase apud iudicem); tal bipartição desapareceu na cognitio extra ordinem.

No período mais antigo do Direito Romano, legis actiones para o processo pudesse ter início (fase in iure), deveria o autor promover a citação do réu, denominado in ius vocatio.  O processo só passava a existir se autor e réu comparecessem diante do pretor (a única exceção era a pignoris capio), que permitia que o credor se apoderasse de bens do devedor.

A Lei das XII Tábuas determinava que “se alguém é chamado a juízo, compareça; se não comparecer, aquele que o citou tome testemunhas e o agarre, se procurar enganar ou fugir, o que citou pode lançar mão sobre o citado” (1.1. e 2) e conduzi-lo oborto collo (pela gola da roupa) à presença do pretor. De qualquer modo, se o réu fosse idoso ou estivesse doente, deveria o autor fornecer-lhe um cavalo ou carro, não necessariamente coberto.

Em tal período romano, o processo guardava natureza eminentemente privada e a presença de ambos litigantes, era indispensável a presença tanto do demandante como do demandado para que pudessem celebrar a litiscontestatio, através da qual concordavam em participar da fase apud iudicem e ainda se submeterem ao resultado do julgamento então proferido. Como não se poderia conceber o processo na ausência de um dos litigantes, não havia que se falar de contumácia.

Na fase apud iudicem, após a celebração da litiscontestatio, a parte autora ou ré que abandonasse o processo e não comparecesse perante o iudex até o meio-dia perdia a causa em favor da parte presente: post merediem praesenti litis addicticito.

Na segunda etapa evolutiva do processo romano conhecemos a ordo iuduciorum privatorum, na fase in iure, embora a in ius vacatio, regra geral, ainda fosse necessária, poderia haver uso da força física para trazer o réu à presença do pretor, mas começou gradativamente ser substituída por outros meios de coerção, tais como multas e perdas de bens.

Para que o processo existisse faticamente, era imperiosa a presença de ambos litigantes diante do pretor, razão pela qual inexistia ainda a figura da contumácia. Logo o não comparecimento em juízo impedia que fosse o litigante considerado indefensus e sofresse graves sanções.

A indefensio que com a contumácia não se confunde, justificava a concessão de missio in bona, aliás, Buzaid observou que no antigo processo romano tanto no período das legis actiones como no formular (per formulas), era indispensável à presença das duas partes para constituição do juízo, a ocultação do devedor obstava a realização dos fins do processo e da justiça, foi para suprir essa lacuna, que o pretor concedeu a missio in bona contra devedor qui fraudatoris causa latitat.*

A concessão do missio in bona justificava a imissão do adversário na posse dos bens do litigante ausente, e, em alguns casos, permitia bonorum venditio (até o produto da venda).

Permanecia o mesmo tratamento na fase apud iudicem, bem como o período das legis actiones, julgando-se a causa em favor da parte presente. Naquela época a simples ausência do réu implicava automaticamente na procedência do pedido do demandante.

Somente com o fim da ordo iudiciorum, com a extinção da bipartição das instâncias, advindo o fortalecimento do Estado e, ipso facto, a publicização do processo, apenas no período extraordionaria cognitio é que cogita propriamente de contumácia.

Nessa fase em especial do antigo processo romano, a citação era chamado de evocatio, realizada com a intermediação do magistrado. Se o réu não fosse encontrado, expediam-se editais. Assim depois de três vezes chamados por edital num intervalo de dez dias, permanecendo o réu ausente, expedia-se, um derradeiro chamado, denominado edictum peremptorium, através do qual o magistrado advertia que procederia à cognitio mesmo na ausência do réu.

Não comparecendo o réu em juízo nessa primeira ocasião na qual sua presença era exigida, restava plenamente caracterizada a contumácia.

Diferentemente do que acontecia na ordo, na cognitio extraordinem o processo se iniciava mesmo sem a presença do réu e prosseguia. Mas seu julgamento não era, contudo determinado pela contumácia, desta forma era possível ao juiz decidir a causa mesmo que favoravelmente ao réu ausente. Embora fosse possível o réu ausente vencer a demanda, ante a contumácia, seria este necessariamente condenado à contumácia.

Se sucumbisse, não poderia apelar, restando-lhe apenas a restitutio integrum para tentar corrigir a eventual injustiça da sentença. Se fosse o autor a abandonar o processo, também seria declarado contumax e igualmente condenado a indenizar ao réu pelos prejuízos eventualmente causados.

Pelo direito justinianeu uma vez declarada a contumácia do réu, o juiz examinava a causa e acolhia ou rejeitava a actio, segundo os seus fundamentos, restando válida a regra de que o réu que tivesse razão, mesmo que revel, vencia a contenda.

Assim o contumaz era obrigatoriamente condenado nas custas e despesas do processo, e devia ainda indenizar os prejuízos causados ao seu adversário, condição inafastável para que pudesse, em determinadas hipóteses, purgar sua contumácia. Não podia o contumaz apelar, mas lhe mantinha assegurado o direito de se valer da restitutio integrum.

Analisando o direito germânico percebemos que se coloca em contraposição ao direito romano, e ao traçar ainda que superficialmente os lineamentos da contumácia e seus efeitos no direito germânico (principalmente a partir do século III – quando da invasão germânica do Império Romano).

A organização social germânica tinha como núcleo basilar a sippe (família germânica) e cuja convivência era baseada na idéia de Fridr (paz), a violação ao direito permitia a vingança do ofendido, a composição entre as partes e, renunciando-se a tais soluções, recorria-se ao processo perante o concelho.

O processo oral assemelhava-se a um combate. O antigo processo germânico se dividia em duas fases, onde a primeira seria essencialmente privada, realizada sem intervenção do magistrado, iniciava-se com mannitio (citação) do adversário para que comparecesse perante o mallum (tribunal); na segunda fase produziam-se as provas perante o tribunal e realizava-se o julgamento.

No processo germânico havia excessiva relevância das provas que não se destinavam a formar convencimento do julgador acerca da verdade das alegações de fato deduzidas no processo, ao revés, tinham finalidades em si mesmas e, seu resultado forçosamente conduzia à fixação da sentença, de maneira puramente formal.

Daí a doutrina considerar que existia nessa época um tipo peculiar de prova legal, que deveria observar rigorosas formalidades e conduzia aos resultados incontroversos. Acreditava-se na intervenção divina no resultado da prova, o que justificava a adoção das ordálias, dos Juízos de Deus e dos duelos judiciais.

Ao contrário da tradição jurídica romana, o processo germânico impunha severas conseqüências à contumácia, em desfavor do ausente. A contumácia tinha caráter de delito e impunha graves sanções ao contumaz, que perdia a demanda e ainda era condenado ao pagamento de multa em favor do adversário e das despesas processuais.

O rigor do tratamento dispensado ao réu contumaz se explica notadamente porque, no antigo processo germânico, o ônus da prova incumbia não a quem alegava (como ocorria em regra no Direito Romano) mas sim, a quem negava. Assim incumbia ao réu provar que o autor não tinha o direito que alegava.

Assim para que se alcançasse a fase probatória no processo era necessário que o réu negasse expressamente as alegações do autor, deveria o réu negar solenemente diante do Tribunal os fatos alegados pelo demandante, para que na segunda fase, pudesse ter a oportunidade de provar sua inocorrência.

Só poderia ocorrer se o réu atendesse à mannitio e atuasse de modo a impugnar as alegações feitas pelo autor. Sendo contumaz o réu seja por não comparecer, seja por não atuar no processo para negar as afirmações do autor, desnecessário seria que se produzisse qualquer prova.

Pois os fatos alegados pelo demandante eram formalmente tidos como verdadeiros e vinculavam o juiz e as partes. Em regra, o réu perdia a demanda, e cabia ao autor desde logo, acionar a via executiva para materializar sua pretensão.

Nas leis dos francos, além da perda da demanda, se o réu não comparecesse diante do tribunal na primeira fase do processo, poderia sofrer o banno que correspondia que o contumaz e seus bens seriam postos fora da lei.

Se o réu após comparecer a primeira fase processual, vier ulteriormente ausentar-se da segunda fase, além de perder a demanda, o credor poderia executar seus bens mediante garantia dos próprios. Se revel o autor, a ausência na primeira fase processual impunha multa e vedação de repropor a mesma ação pelo prazo de um ano; se ausente na segunda fase processual implicava a perda da demanda (desde que o réu tivesse negado as alegações do autor).

Enquanto que nas leis carolíngeas já se consignava algum progresso. Pois se o réu deixasse de comparecer a primeira fase, sofria seqüestro de todos seus bens pelo prazo de um ano (missio possessionis euis in bannum), período pelo qual podia o revel comparecer, apresentar defesa e recuperar os bens. Se, no entanto, permanecesse revel e ausente depois de tal prazo, tais bens seriam definitivamente atribuídos ao adversário.

Se ausente o autor na segunda fase do processo, não mais era automaticamente condenado: apenas atribuía-se ao réu o direito de produzir a prova e obter o julgamento do mérito da causa.

Adentremos mormente a traçar as formas que o Direito Canônico tratou a contumácia e a revelia.

O Direito Canônico apesar de ter absorvido a influência do processo germânico, notadamente a partir do século XI (quando se começa o período de estabilização do direito canônico), passou a contribuir fortemente para o resgate de principais princípios do Direito Romano principalmente no que concernem as provas, especialmente no tocante ao livre convencimento do juiz e o ônus da prova atribuído ao autor, o que contribui decisivamente para suprimir as ordálias e para a configuração moderna dos regramentos sobre as provas.

Nessa conhecida fase de estabilização do direito canônico, a contumácia se revela pela ausência da parte no processo, tinha a peculiaridade de ser considerada como pecado, por representar soberba, arrogância, desprezo à autoridade, punida por isso com excomunhão.

Já na época da consolidação do direito canônico (do século XIII ao XV) nas Decretais de Gregório IX (1234) veio instituído importante princípio acerca da contumácia, denominado accusatio contumaciae instituindo que: a contumácia não mais poderia ser decretada de ofício, mas tão-somente a pedido da parte contrária, além disso, previu-se a concessão de apelo ao contumaz.

Observe que os efeitos decorrentes da contumácia eram distintos se a ausência ocorresse antes ou depois da litiscontestatio. Pois antes, o autor, tal qual no direito carolíngio obtinha desde logo, após a cognição sumária com a imissão na posse dos bens do réu, se este não comparece e nem se defende dentro do prazo de um ano, o autor após promover a nova citação e após nova cognição pelo juiz, recebia definitivamente a posse dos bens do réu. Havendo diferenças entre ações reais (posse da coisa demandada) e pessoais (posse de bens garantisse o valor do crédito).

Se a contumácia do réu ocorresse após litiscontestatio, duas situações poderiam ocorrer: caso existissem elementos suficientes para o juiz proferir decisão favorável ao autor, assim se procedia, com julgamento definitivo; caso contrário (si non liquet), o autor era imitido apenas provisoriamente na posse dos bens do réu que poderia reavê-los.

Sendo contumaz o autor antes da litiscontestatio, podia o réu optar entre a absolvição da instância ou prosseguimento do processo; nesta última hipótese, se o réu conseguisse provar suas alegações, vencia a demanda; caso contrário, o processo se extinguia ad observatione iudicii (sem julgamento do mérito), não sendo proferida decisão em favor do ausente.

Se a contumácia do autor ocorresse depois da litiscontestatio, havendo elementos suficientes para tanto, o juiz devia julgar o mérito em favor de quem tivesse razão (mesmo que ausente); caso contrário, o processo se extinguia ab observatione iudicii.

Advém do Direito Canônico a distinção da contumácia propriamente dita e a contumácia in respondendo, na qual a parte comparecia ao processo, mas deixava de manifestar-se sobre as alegações da parte contrária, seja silenciando ou se manifestando de forma obscura.

Nesse caso, ocorria a ficta confessio, admitindo-se francamente como verdadeiros os fatos não impugnados pelo adversário. Merece destaque ainda a condenação obrigatória do contumaz nas despesas processuais, mesmo que vencesse a causa e, ainda a possibilidade do contumaz pleitear a concessão de restitutio in integrum, a qualquer tempo, desde que apresentasse prova de legítimo impedimento para o comparecimento no processo.

Convém destacar que as conseqüências da revelia e da contumácia foram deverasmente abrandadas. Com efeito, o cânone 1592, primeiro parágrafo do Código de Direito Canônico de 1983 (que é o vigente atualmente), prevê que a parte demandada que não comparece ao juízo, o juiz apenas declarará o fato, e determinará o prosseguimento do processo, sem imputar à contumácia qualquer relevância ao deslinde das questões submetidas ao julgamento.

Porém, ante o comparecimento tardio do réu no processo, desde que ocorra antes da definição da causa, poderá apresentar suas conclusões e produzir provas, todavia o juiz deverá cuidar para que o processo não se protraia propositadamente com longos e desnecessários atrasos.

Prevê o atual Código Canônico que o revel poderá fazer impugnações contra a sentença, e ainda se valer da querela de nulidade se não teve culpa em sua ausência em juízo (cânone 1593, segundo parágrafo), inovando em razão do código anterior de 1917 que previa ao contumaz apenas a restitutio integrum, silenciando quanto aos demais ordinários meios de impugnação de sentença.

A dominação romana sobre a península ibérica costuma ser dividida em duas fases: fase de conquista, que principia em 218 a. C., com a Segunda Guerra Púnica, e termina em 19 a.C., com o domínio dos territórios cantábricos e astures; e fase de romanização, com a lenta e gradual assimilação da cultura e do Direito Romano pelos povos locais, marcada especialmente pela concessão da latinidade aos habitantes da Península (Vespasiano – 73/74 d.C.) e pela concessão de cidadania a todos os súditos livres do Império (Caracala – 212 d.C.).

Inegavelmente das relevantes fontes jurídicas que contribuíram inegavelmente para a formação do direito lusitano, é: o Código Visigótico, ou Liber Iudiciorum, ou ainda, na denominação que os espanhóis deram Fuero Juzgo (que previa a aplicação de multa ao revel e até de chibatadas).

Sobre a revelia no direito visigótico, observa-se que iniciado o processo, o réu era convocado através da epístola ou sigillum encaminhado por meio de um oficial da autoridade judicial, a comparecer perante Tribunal dentro do prazo fixado, que variava em razão da distância entre o lugar onde vivia e a sede do juízo. Se o réu comparecesse, poderia incorrer nos efeitos da revelia: multa, açoites, jejum, conforme a condição do litigante convocado. Não se aplicava, contudo, a pena de infâmia.

Era tão relevante o dever comparecimento perante o Tribunal que a lei visigótica exigia empenho dos juízes e saiões neste sentido, conferindo-lhes poderes para, coercitivamente, fazer com que as partes se apresentassem no dia e local aprazados, dando-se, desde logo, cobro à demanda.

Além de tais efeitos, ausente o réu, a coisa litigiosa era desde logo atribuído ao autor. Poderia o réu tentar reaver a coisa, comparecendo tardiamente ao processo, pagasse a multa, justificasse sua ausência e apresentasse suas razões.

Tinha menos de sessenta anos de vigência tinha o Fuero Juzgo quando, em 711, após a batalha de Guadalete, foi o Reino visigótico invadido e conquistado pelos muçulmanos, que reduziram os vencidos às montanhas das Astúrias. E cerca de oito séculos duraram os embates até que finalmente em 1492, com a rendição do reino islâmico de Granada, lograram os cristãos reconquistar definitivamente a península.

Apesar das significativas influências que a ocupação moura trouxe nos campos científicos e artísticos, no entanto, não se fez sentir de maneira tão aguda, no campo jurídico.

É bem evidenciado que o direito muçulmano tem natureza essencialmente confessional, sendo retirados da religião inúmeros critérios normativos. E, a religião e o direito islâmico não foram impostos aos antigos ocupantes do reino visigótico. Ao contrário, os mouros não desejavam maiores contatos com os cristãos, exceto no que tange à cobrança de juros e tributos.

Permanece o Fuero Juzgo entre os cristãos como principal fonte formal de direito positivo, vigorando até meados do século XII. Dadas as peculiaridades da época, contudo sua aplicação era bastante reduzida. Destacavam-se também as cartas de privilégio e os forais, contribuindo para a formação de um direito estratificado e de aplicação limitada às respectivas localidades.

Ensina Mário Julio de Almeida Costa Azevedo que o único direito capaz de se transmitir facilmente e oralmente (e ainda atender as exigências das classes menos favorecidas da população) era o direito costumeiro, caracterizado pelas velhas práticas germânicas. De forma que o processo ritualizava-se perante o concelho, instaurando-se cum rancura ou sine rancura. No primeiro tipo particularizado pela imediatidade do clamor do ofendido, dispensavam-se maiores provas, decidindo prontamente o concelho.

No primeiro caso, marcado pela imediatidade do clamor do ofendido, dispensavam-se maiores proveras, decidindo prontamente o concelho. Já no segundo caso (sine rancura) poderia se proceder per enquissa, buscando-se a descoberta da verdade através de testemunhas e documentos, com ônus da prova atribuído ao réu, ou se decidia pelo duelo judiciário ou juízos de Deus.

É bom frisar que os testemunhos só se tornaram freqüentes com o aumento da população, sendo vedado depor contra membro da mesma comunidade, num primeiro momento prevaleceram mesmo as ordálias e o duelo judiciário.

Também a revelia do réu possivelmente produzia as mesmas conseqüências observadas no processo germânico: o revel sofria sanções pecuniárias, o autor poderia imitir-se na posse dos bens do revel, os fatos alegados pelo demandante eram formalmente tidos por verdadeiros, de modo vinculante para o juiz e para as partes; em regra, o réu perdia a demanda e desde logo se abria para o autor a via executiva para satisfação de sua pretensão.

Na segunda metade do século XI ocorreu verdadeira revolução na sociedade européia ocidental: foi o chamando primeiro Renascimento, momento marcado pelo revivescimento econômico cultural, a grande verve cristã tratou de reviver seu próprio passado greco-romano, reaparecendo o interesse pelo estudo científico do direito.

A Igreja detinha vasto conhecimento sobre as normas romanas e por conta dos manuscritos conservados nas bibliotecas dos mosteiros e abadias, eram tantas fontes existentes que até então, preocupava-se em ordenar e sistematizar. Por outro lado, os legalistas laicos focalizaram sua atenção no Corpus Iuris Civilis, buscando sua interpretação e adaptação para solver os conflitos e interesses da emergente sociedade da época.

É curial ressaltar a relevante atuação da Universidade de Bolonha, com seu intenso perfil cristianizado do direito romano-justinianeu canônico e direitos locais e obrou o objeto único de toda a ciência jurídica européia, inclusive no que concerne ao estudo universitário comum, em toda Europa, fenômeno que foi facilitado pelo emprego de uma língua comum (o latim). Formou-se assim o Direito Comum, que influenciou fortemente os sistemas jurídicos contemporâneos .

É bom identificar que o direito comum era impregnado de caráter imperialista decorrente da influência do direito romano justinianeu, o que encaixou feito uma luva nos anseios dos governantes europeus da época interessados em fortalecer os recentes Estados recém-natos e consolidar centralizando o poder em suas mãos em detrimento dos senhores feudais.

O direito comum centrado na autoridade do soberano permitiu afastar as estratificações e privilégios marcantes e típicos dos sistemas medievais, substituindo-os por um novo regime jurídico, de aplicação comum e geral.

A litiscontestatio era processo característico do Direito Comum e era solene para fixação dos termos da controvérsia, a partir do qual o juiz era obrigado a decidir. Após a litiscontestatio e por influência direta do direito germânico, o procedimento seguia per peticiones, ou seja, cada parte formulava às outras indagações sobre toda a matéria discutida, convidando-a a responder.

O primordial objetivo era provocar a confissão do demandado, considerado o meio mais simples e seguro de descobrir a verdade, que seria revelada pelas declarações dos próprios litigantes. Ainda na crença que a confissão seria a regina probatorum (rainha das provas.

A revelia do direito comum não se afastava muito daquela bem característica do processo germânico com a absorção dos influxos do direito canônico. De forma que se ocorresse a revelia antes da litiscontestatio, o autor após promover a accusatio contumaciae (já era assim nos Decretais de Gregório IX, não poderia ser a contumácia decretada de ofício) obtinha o ex primo decreto para imissão de posse dos bens do réu (ex secundo decreto).

Igual na lei dos francos poderia ser aplicado ao revel a sanção do banno. Se acontecesse revelia após a litiscontestatio, duas situações eram possíveis: existindo elementos suficientes para o juiz proferir decisão favorável ao autor (si liquet), assim realizava o julgamento definitivo; caso contrário (si non liquet) o autor era apenas imitido provisoriamente na posse dos bens do réu, que poderia reavê-los.

A principal diferença em relação ao tratamento dispensado pelo direito canônico residia no fato de que somente o réu poderia pleitear o julgamento do mérito quando se aproximasse o prazo decadencial.

Igual como ocorria no direito canônico, o revel era obrigatoriamente condenado nas despesas processuais, mesmo que vencesse a causa. O verdadeiro revel não podia apelar, restando-lhe pleitear, se fosse o caso, a concessão da restitutio in integrum.

Voltando para a Península Ibérica, mais particularmente para Portugal que foi alçado à categoria de reino em 1140 como o reinado de Afonso Henriques. A individualização do direito português consistia na herança deixada pelo Estado Leonês que era consuetudinária e foraleira, caracterizada pelo empirismo jurídico.

Em tal fase que é anterior a recepção do direito comum, os primeiros passos do direito processual civil exibiam a nítida influência germânica traduzindo-se num processo público e oral e que se se desenvolvia perante a assembléia da comunidade.

O queixoso formulava a reclamação e chamava o réu, que se não comparecesse (revelia) sofria severas sanções, e o demandante deveria jurar que não litigava de má-fé (e mais tarde tal juramento deveria ser corroborado por testemunhos de homens bons que confirmassem os fatos alegados) e o demandado deveria jurar que a acusação não era verdadeira (posteriormente também se exigia a prova testemunhal para corroborar).

Então eram designados os alcaldes (julgadores), produzidas as provas (e predominava na esfera cível, as testemunhas e documentos, porém ainda não estavam de todo eliminadas as ordálias, especialmente os juízos de Deus e duelos judiciais, e somente, sobrevinha o julgamento.

Em tempo realizo uma remissão na origem etimológica: do português "ordálio", registrado a partir de 189,9, advém do latim tardio ordalium (plural ordalia), este do frâncico ordál ("julgamento", "juízo"), por meio do francês ordalie (1693).

Outras fontes apontam o inglês antigo ordel e o germânico urthel ("julgamento", "veredito") como a origem do francês ordalie, provenientes do proto-germânico significando uzdailjam ("aquilo que é atribuído").

Em Portugal, os ordálios utilizados foram de dois tipos: o ferro em brasa e o duelo judicial No primeiro caso, o juiz e um sacerdote aqueciam o ferro, que o acusado era obrigado a segurar. O juiz cobria-lhe a mão com cera, punha-lhe por cima linho ou estopa e enfaixava tudo com um pano.

Decorridos três dias, o estado da mão era analisado e se houvesse chaga o réu era considerado culpado e imediatamente condenado. O duelo judicial a cavalo ou a pé, segundo a classe social das partes, durava três dias. Após aquele período, o vencido perdia o processo. Se não houvesse vencido, perdia quem lançara o desafio.

A partir de meados do século XIII, notadamente através das influências de jurisconsultos, formados principalmente na Universidade de Bolonha, da difusão do Corpus Iuris Civilis e das respectivas glosas em território português, do ensino do direito romano nas universidades portuguesas, da legisçlação e prática jurídica de inspiração romanística e do emprego de obras castelhanas doutrinárias ( Flores de las leyes e Nueve tiempos de los pleitos) e legislativas  (Siete Partidas), penetrou intensamente o Direito Comum no sistema jurídico protuguês, marcando o denominado período de direito português de inspiração romano-canônica.

Os monarcas lusitanos precisavam cada vez mais ampliar os poderes da coroa, concentrando-os em seus mãos,  em oposição dos senhores locais. Valendo-se inicialmente de inquisições e confirmações régias, que permitiam os monarcas coibir abusos dos senhores feudais contra o povo e contra coroa, através do exame de legitimidade e da extensão dos poderes concedidos a tais senhores por intermédio dos forais.

Havia ainda a necessidade de estabelecer a as leis gerais para todo o reino português, cujo fundamento último repousasse na autoridade do soberano, por isso muito bem servia e era bem recepcionado o direito romano justinianeu, ressucitado pelo Direito comum.

As primeiras leis gerais do reino português foram decretadas por D. Afonso II em 1211, dentre estas, havia a que fixava juízes por todo reino e revelava o objetivo de concentrar a jurisdição na mão da coroa, o que por si só já trduz alguma influência do direito romano justinianeu.

Em seqüencia assumiu o trono D. Sancho II em 1245 que acabou destronado por seu irmão D. Afonso III ( conde de Bolonha) com apoio dado pelo Papa Inocêncio IV que o declarou rex inutilis ( rei inútil) por não saber administrar o reino e ser conveniente a grande nobreza e ao clero. Esse último soberano português ( denominou-se Rei de Portugal e Algarve) muito legislou sobre matéria processual, e prosseguindo, também seu filho, D. Diniz.

Só ad referendum, o Papa Inocêncio IV foi o mesmo que ordenou e criou os três primeiros tribunais da santa inquisição

No reinado de D.Diniz que as ciências jurídicas obtiveram grande impulso, principalmetne com a criação em 1290 da Universidade de Lisboa e pelos estudos por esta desenvolvidos, o direito romano justinianeu adquiriu a qualidade de fonte superior na formação do direito lusitano.

Tarefa nada fácil era a aplicação do direito romano justinianeu principalmente pela vastidão do Corpus Iuris Civilis e por seu difícil conteúdo e técnica da compilação leges e iura e por se encontrar versado em latim pouco acessível .

Diante de tantas dificuldades D. Diniz determinou que se utilizasse a língua portuguesa nas leis e nos usos do foro, em substituição ao latim, determinou também que se traduzisse para o português importante monumento legislativo promulgado por D. Afonso X, então rei de Castela e Leão:a lei das sete partidas, bem como a renomada obra doutrinária chamada Flores de las leyes de Jácome Ruiz ou Mestre Jacob das leis, que representa verdadeiro compêndio de direito processual civil escrito para o infante de D. Afonso, mais tarde D. Afonso X.

O processo civil português dessa época era marcado pelas características do direito romano da extraordinaria cognitio que iniciava-se pela citação, em comparecendo os litigantes em juízo, poderia o réu deduzir a exceção peremptória ou dilatória, negar o pedido, chamar o possuidor da coisa reivindicada ( ação real) ou confessar.

Somente se o réu não confessasse é que a demando propriamente dita se iniciava, com o autor formulando sua petição (libelo) e demandado opondo sua contestação, após o que se produziam provas ( especialmente testemunhal e documental) e, então, sobrevinha o julgamento.

As Flores de las Leys explicitam três maneiras pels quais pode ocorrer a revelia: a primeira modalidade é aquela que uma vez citado o réu (pessoalmente) e não comparece ao processo, que corresponde ao atual conceito do instituto.

Se fosse real a ação, seria então o demandante imitido provisioriamente na posse dos bens do demandado, e, se a revelia não fosse purgada em um ano, tornava-se o autor seu proprietário. E, se fosse ação pessoal o mesmo ocorreria com tantos bens quanto bastassem para satisfazer a pretensão do autor. Eis aí nítida tradição herdada do direito comum.

Mas por força da influência do direito romano é recomendado para que o julgador buscasse a verdade, mesmo ante a revelia. A Lei das Sete Partidas regulamente mais detalhadamente a revelia do réu e seus efeitos apesar de manter as principais peculiaridades observadas do bárbaro direito visigótico.

Assim a revelia era considerada desobediência à autoridade judicial e seus efeitos eram disciplinados na Lei VIII, Título VII, da Terceira Partida. Desta forma, após diversos chamado o réu não comparecesse ao processo, era apenado com multa que revertia em benefício da coroa, para o juiz e para o adversário, cujo valor variava de acordo com a condição do réu.

Também nesse caso imitia-se o autor na posse direta dos bens do revel, que poderia reavê-los caso apresentasse defesa em até um ano, mas não ficava  dispensado do pagamento da multa e das despesas processuais.

Excepcionalmente a defesa poderia ser extemporânea, ou seja, após o prazo de um ano, porém seus bens só lhe seriam restituídos por piedade do rei, o que poderia também acontecer se o revel viesse a falecer em tal período.

Portanto, durante o prazo de um ano deveria o autor conservar as rendas e frutos desses bens, inclusive o preço da venda daquilo que não pudesse ser guardado. Pois mesmo após o curso de um ano, o revel poderia ter relevados os efeitos da revelia, caso apresentasse embargos, nos quais comprovasse não ter culpa da caracterização da recelia, mas não se concedia, contudo, recurso a revel.

Sobre o período de recepção do direito romano-canônico em Portugal merece destaque como fonte jurídica o Livro das Leis e Posturas  que é a mais antiga coletânea do direito português, realizada ao final do século XIV ( ou princípio do século XV) que traz em seu conteúdo as leis promulgadas por D. Afonso II, D. Afonso III, D. Diniz e D. Afonso IV, além de uma lei acrescentada psoteriormente atribuída ao Infante D. Pedro.

Não é obra coordenada e harmônica e muito menos sistêmica, mas a compilação teve o mérito de reunir os diversas previsões sobre a revelia do réu, onde se constata que o tratamento em nada em difere das fontes antes examinadas, persistindo quando  for ação real, atribuia-se ab initio ao autor a coisa demandada; sendo pessoal a ação, recebia o autor tantos bens quanto bastassem para atender aos seus interesses, apesar de se admitir a purga da revelia e ainda a possibilidade de o réu reaver seus bens, desde que comparecesse ao processo em  menos de ano e dia, a contar da data em que se tornou revel, e, ainda pagando as custas processuais a que deu causa.

Observa Calmon de Passos que no velhusco direito português, “imitia-se  o autor na posse dos bens do réu revel, para forçá-lo ao comparecimento. Era a prevalência do direito barbárico, com a sua idéia da contumácia como falta susceptível de severa punição”.

As Ordenações Afonsinas surgiram da necessidade que tinha Portugal de ter uma coletãnea de leis que permitisse a harmonização do direito, e eliminar a confusão de normas e a fonte de inseguranças. Assim, D. João I, atendendo encarregou João Mendas da nobra tarefa.

Em termos de conteúdo tais ordenações não operaram grandes inovações mas sentia-se a nítica influência do direito romano e do direito canõnico e havia talbém alusão ao direito comum.

O estilo compilatório trazia a íntegra das fontes jurídicas anteriores, declarando depois em que termos tais preceitos eram confirmados, alterados ou afastados. Quanto sua estrtura, talvez por influência das Decretais de Gregório IV era dividida em cinco livros, sendo o processo civil disciplinado no Livro III, situação que se repetirá nas demais ordenações.

A revelia do autor também foi tratada pelo diploma legal, e repetindo a lei de D. Afonso III, determinava que o autor que fizesse citar o réu, e,  posteriormente não comparecesso em juízo no prazo assinado, somente poderi propor novamente a demanda, depois de pagar completamente as despesas processuais do demandado. Se, no entanto, o autor, repetisse sua inércia e desinteresse por mais duas vezes, restaria perempta a ação.

Já a revelia do reu é tratada de modo a evitar o excessivo prolongamento do feito, se a revelia ocorresse em ação pessoal, o réu era desde logo condenado e, ato contínuo, iniciava-se a execução, limitada a condenação, contudo, àquilo que fosse provado pelo autor. Não podia o revel embargar a sentença, exceto se comprovasse pagamento ou quitação.

Por outro lado, repete-se que caso fosse ação real, o autor obtinha desde logo a imissão definitiva na posse da coisa litigiosa, revelando aqui nítida influência do direito germânico. Ressalte-se que também não pdoeria embargar a sentença, salvo se comprovasse por escritura pública ou testemunha, motivo relevante que o tivesse impedido de vir ou enviar procurador para defendê-lo tempestivamente. Admitia-se, nessas circunstâncias, a purga da revelia.

Realçando que caso o revel fosse menor de idade e tendo sido citado na pessoa de seu tutor ou curador, a execução recairia sobre os bens destes últimos e caso não possuíssem, a execução recairia sobre os bens do juiz que houvesse noemado o tutor ou curador, somente na hipótese de nenhum destes ter bens é que a execução recairia exatamente  sobre os bens do menor. Podendo posteriormente buscar ressarcimento pelos prejuízos causados.

Tiveram pouco tempo de vigência as Ordenações Afonsinas, até em razão do grande progresso econômmico decorrente do empreendorismo amtírtimo e as sucessivas alterações sociais, e nos setores científico e cultural.

Assim em 1505 de D. Manuel encarregou três juristas de peso na época para empreitada eram eles: Rui Boto, Rui da Grã e João Cotrim que então procederam a atualização das ordenações do reino.

Então as Ordenações Manoelinas representavam uma legislação revistada e atualizada e, ainda contava com ampla divulgação proporcionada pela imprensa indtoduzida em Portugal nos fins do século XV.

Finalmente sobrevio a edição definitiva das referidas ordenações em 1521, quando se determinou que as demais edições anteriores fossem banidas, destruídas sob pena de multa e degredo.

Também eram divididas em cinco livros, novamente sendo o terceiro livro dedicado ao processo. E adotou o estilo decretatório, impondo normas cogentes sem remissão às anteriores revogadas.

Com relação à revelia, não ocorreram grandes modificações em comparação com às Ordenações Afonsinas, e também quanto aos efeitos da revelia do autor.

Distinguia-se a ausência do autor anterior ao recebimento do libelo daquela que se desse posteriormente. No primo caso, poderia o réu requerer o prosseguimento do feito, para absolvição de “toda a causa” e ainda para condenação do demandante nas custas processuais.

Já no segundo caso, o juiz julgava o processo como se o autor estivesse presente, ( ficta litiscontestatio) e, em favor de quem tivesse razão, a não ser que faltassem elementos para formar sua convicção. Nessa hipótese, o juiz decretava a absolvição do réu da instância e condenava o autor nas custas, o que também se dava caso o réu optasse por não requerer o prosseguimento do feito.

Mas podemos assinalar que houve modificações quanto aos efeitos da revelia do réu revelando-se clara influência do direito romano da extraordinatia cognitio e justinianeu em oposição ao direito germânico.

Seja ação real, seja ação pessoal, o processo prosseguia normalmente, sem a condenação automática do réu revel, restando vedado ao autor imitir-se na posse dos bens do revel.

Mesmo diante da revelia do réu, cabia ao autor provar suas alegações para lograr recerber julgamento favorável à sua pretensão. Ademais,  poderia o revel ingressar no processo a qualquer tempo, desde que antes da sentença, recebendo-o, no entanto, no estado.

Via de regra, o revel não podia ser mais ouvido sobre o ato praticado à sua revelia, salvo por embargos. Mas persistia a vedação ao réu revel de apelar.

Depois do misterioso sumiço de D. Sebastião de Avis, também conhecido como “o Desejado” na batalha de Alcácer-Quibir, sem deixar descendentes diretos para a sucessão, foi então a coroa portuguesa anexada pelo rei D. Felipe II de Espanha que sentiu a necessidade de atualização da legislação principalmente em razão da evolução das relações sócio-jurídicas, quer para ordenar e sistematizar a grande legislação posterior ao Código Sebastiânico, quer para prover o afastamento das normas oriundas do Concílio de Trento e aceitas amplamente e sem restrições por Portugal.

Então D. Felipe nomeou comissão de juristas para realização da nova ordenação, pra prover a modernaização pretendida que deveria espelhar a modernização pretendida conforme a enorme tradição jurídica lusitana.

É bom lembrarmos que as Ordenações Filipinas embora muito alteradas, constituíram a base do direito português até a promulgação dos sucessivos códigos do século XIX, sendo que algumas disposições permaneceram vigentes no Brasil até o advento do Código Civil Brasileiro de 1916. Daí ser muito importante para a compreensão do direito pátrio o entendimento de tais ordenações.

As Ordenações Filipinas foram aprovadas pela Lei de 11 de janeiro de  1603 e foi de maior vigência no direito português vindo a ser revogadas somente em 1867.

Os efeitos da revelia do autor não sofreram alterações em comparação com as ordenações anteriores, acrecentando-se nas Filipinas tão-somente que o autor poderia opor-se a cada uma das absolvições da instância por meio de agravo, de instrumento ou de petição.Reza a lenda entre os juristas que remonta daí nossa intensa verve para os recursos...

Acerca dos efeitos da revelia do réu também não ocorreram grandes alterações em comparação às Ordenações Manuelinas. O processo seguia normalmente à revelia do reú, conforme os termos na Ordem dos Juízos.

O autor não poderia imitir-se na posse dos bens do revel e só recebeira julgamento favorável se provasse as suas alegações. O revel poderia constituir-se tardiamente no processo, recebendo-o no estado em que se encontra, poderia apresentar embargos, mas se fosse revel verdadeiro, não poderia pelar.

Prosseguindo na análise de nosso ordenamento processual civil pátrio que fora inicialmente disciplinado pelas Ordenações Filipinas, cabe destacar a importância do regulamento 737, de 25 de novembro de 1850.

Inicialmente fora destinado apenas para os processos comerciais porém teve sua incidência estendida aos processos cíveis por força do Decreto 763 de 19 de setembro de 1890, ressalvadas algumas exceções.

Quanto aos efeitos da revelia nota-se que não houve nenhuma modificação em face da legislação anterior. Porém a revelia do réu disciplinada no art. 57 que consignava que o processo prosseguia normalmente mesmo na ausência do réu, que poderia comparecer tardiamente, recebendo-o nos termos em que se encontrasse sem condenação automática do revel e sem franquear ao autor se imitir na posse dos bens do revel.

Diferentemente das Ordenações Filipinas, não se proibia a apelação do revel, mas esta deveria ser apresentada em dez dias a contar da publicação da sentença ( art. 648) e, ainda o revel poderia opor-se à execuição da sentença por meio de embargos infringentes ( art. 557, segundo parágrafo). E, se fosse menor o revel, pçoderia valer-se ainda de embargos de restituição ( art. 639 e ss.).

Promulgada a Constituição Brasileira de 1891 instituiu-se o princípio da dualidade legislativa permitindo-se aos Estados a competência de legislar sobre o direito processual, remanescendo para a União a regulamentação do processo  na Justiça Federal.

Só para citar as fontes jurídicas temos o Código Paulista ( Lei 2.421/1930, Código do DF  (Decreto 16.752/1924) e ainda o Código do Rio de Janeiro ( Lei 1.580, de 20 de janeiro de 1919, Código de Minas Gerais ( Lei 830, de 7 de setembro de 1922 e Código do Rio Grande do Sul ( Lei 65, de 16 janeiro de 1908). Ao passo que o Código da Bahia ( Lei 1.121/1915) não trouxe disposições sobre a revelia do réu.

Cabe anotar que quanto aos efeitos da revelia e quantos aos diversos Códigos estaduais permaneceram todos alinhados à tradição das Ordenações Filipinas e ao Regulamento 737, vindo por vezes até repetir integralmente seus dispositivos.( O Estado do Pará o primeiro a editar seu estatuto processual próprio, e, a partir daí, os demais
Estados da Federação passaram a também editá-los, exceção feita ao estado de Goiás. São Paulo, a propósito, segundo nos ensina Arruda Alvim , foi um dos últimos a promulgar sua legislação processual civil (1930).

O CPC de 1939 não definiu revelia e nem a apartou de seus efeitos, tratou apenas de forma esparsa e sem preocupação sistêmica, contribuindo definitivamente para o surgimento de acirradas divergência sobre o tema.

O art. 34 do CPC de 1939 dispunha que o revel é citado que não apresentasse defesa no prazo legal.  Embora não seja este o conceito de revelia, argutamente asseverou Calmon de Passos que apenas equiparou o revel ao omisso em defender-se, e complementa Jorge Americano que o revel era o ausente que ficou inativo em face da demanda.

Será considerado revel o citado que não apresenta defesa tempestiva, que ostenta a omissão em contestar, mesmo havendo comparecimento, o que equivale ao não comparecimento. Portanto, é possível ser revel apesar de não ser contumaz(posto que compareceu ao processo).

A revelia do réu ou a não contestação do pedido no prazo de dez dias produzirá a aceitação do pedido. Mas a revelia é mais que apenas não contestar, apesar da equiparação prevista no art. 34 do CPC.

Também é revel aquele que apesar de citado não se faz representar por advogado ( art. 106) frisando que revebeu pessoalmente as comunicações sobre o desenrolar do processo.Assim contra o revel assevera o art. 34 do CPC/1939 correm os prazos independentemente de intimação ou notificação, embora que em seu parágrafo único ressalve a faculdade do revel em intervir no processo assumindo-o no estado em que se encontre ( reproduzindo quase de forma análoga o previsto no art. 322 do vigente CPC).

Observe-se que ao revel citado por edital ou com hora certa destina-se a nomeação de curador à lide ou representante judicial de ausentes, conforme prevê o art. 80, primeiro parágrafo, b do CPC/1939 que é bem similar ao vigente art. 9º, II do CPC de Buzaid.

Divergência doutrinária atormentava a época sobe a possibilidade da aplicação do efeito da revelia, da admissão de veracidade dos fatos alegados pelo autor, disciplinada no art. 209 do CPC/1939, que expressamente previa também que o fato alegado por uma das partes, e não contestado pela outra, será admitido como verídico, a menos que o contrário resultar do conjunto probatório.

Porém, muitos doutrinadores como Liebman, Frederico Marques, Gabriel Rezende Filho, Pedro Batista Martins e, principalmente Calmon de Passos interepretavam o art. 209 do CPC/1939 e, ipso facto , a admissão de veracidade dos fatos articulados pelo autor, não se aplicava aos casos de revelia, mas sim é aplicável a todos os casos de defesa lacunosa, no qual o réu comparecia ao processo, mas, na resposta, deixava de impugnar um ou mais dos fatos alegados pelo demandante. Descaracterizando-se a presunção de veracidade como efeito típico da revelia.

Buzaid também compartilhava do mesmo entendimento doutrinário pois apontava que continuava o ordenamento a  seguir a tradição romana herdada do direitoe luso-brasileiro de exigir que, mesmo diante da revelia do réu, o autor fizesse prova dos fatos constitutivos de seu direito. Portanto, mesmo diante da revelia nãop se desincumbe o autor de provar seu direito.

Mais radicalmente se posicionou Amaral Santos que aponta na omissão de contestar só poderia conduzir à admissão de veracidade se o réu de alguma forma reconhecesse os fatos articulados pelo autor ( verbi gratia: se o réu não contestasse a existencia de crédito alegado peloa utor, mas discutisse apenas seu valor). O que jamais poderia decorrer  do total silêncio caracterizador da revelia.

Portanto, Amaral dos Santos , mesmo no caso de revelia do réu, remanescia para o autor o ônus de provar os fatos que alegou, além do fato constitutivo de seu direito.

Por outro lado, Estelita, Lopes da Costa e Rogéio Lauria Tucci sustentavam que a incidência do art. 208 do CPC/1939 e, consequentemente, da admissão da veracidade por este determinada, como seu principal efeito, e defendiam o mesmo efeito se dará mesmo ante o não comparecimetno do réu ao processo.

Sendo aplicável ou não à revelia a admissão de veracidade , comportava sempre a ressalva de que se o contrário não resultar do conjunto probatório trazida in fine do art. 209. Sendo admissível que o revel produzisse provas  tendentes a afastar tal veracidade, conforme entendimento previsto na súmula do STF 231: “ O réu revel, em processo cível, pode produzir provas desde que compareça em tempo oportuno.”

Atualmente isso não é possível, pois o art. 334, III e IV do CPC veda produção de fatos incontroversos, ou sobre os quais pesa presunção de veracidade. Há tese oposta que sustenta ser possível o revel produzir provas, pois no processo civil inexiste dispositivo que impeça produzir provas, independentemente de suas naturezas. Condicionando-se apesar que seja feita em tempo oportuno.

Assim amenizando o rigor da norma, assentado está na doutrina que a falta de verossimilhança da alegação não impugnada impedia que fosse admitida por verdadeira e não estava o julgador obrigado a aceitá-la, restando o seu livre convencimento motivado.

O CPC de 1939 não admitia o julgamento antecipado da lide, em caso de revelia, em razão de revelia, em razão de sua intensa oralidade, sendo obrigatória a realização de audiência de instrução e julagmento.

Registre-se que a ausência do autor em AIJ, se não representado por procurador, determinava que o réu fosse absolvido da instãncia ( art. 266,  VI). Finalmente, se o réu alegasse e provasse, mediante requerimento fundamentado e devidamente instruído, que sua ausência decorrera de força maior, pdoeria ainda pleitear com base no art. 38, a concessão da restitutio in integrum, sendo-lhe devolvido o prazo para a prática do ato  (a restitutio deveria ser requerida no tríduo em seguida do momento em que cessasse a força maior).

Divergia a doutrina se absolvição da instância do réu face a ausência do autor poderia ser pronunciada de ofício. Entendeu positivamente Pedro Batista Martins, mas em sentido contrário, posicionou-se Pontes de Miranda.

Na consagrada monografia de Rogério Lauria Tucci baseada em grande parte nos ensinamentos de Gionnozzi é fácil identificar de plano três grandes sistemas aos quais se filiavam as legislações modernas, a saber: sistema da decisão secundum praesentem, sistema da ficta litiscontestatio e o sistema da ficta confessio.

Pelo sistema da decisão secundum praesentem, fortemente inspirado na regra da Lei das XII Tábuas refernte à fase apud iudicem da ordo iudiciorum privatorum que preconizava justamente que a ausência em juízo determina automaticamente a perda da demanda. Fosse essa a solução adotada pelo CPC de Genebra de 1819. Embora, hoje tal sistema se encontre em desuso.

O sistema da ficta litiscontestatio reputa que no caso de revelia do réu, os fatos alegados pelo autor sejam tidos como impugnados pelo réu, o que exige certamente do demandante fazer prova dos fatos alegados, sob pena de não serem aceitos pelo juiz.

Inspirou-se o referido sistema, no direito romano extraordinaria cognitio e no justinianeu, posteriormente refletido claramente nas Ordenações Manuelinas e Filipinas, e no direito pátrio, no Regulamento 737 de 1850  e nos diversos códigos estaduais brasileiros. Modernamente, é adotado tal sistema por países como Itália, França e Espanha.

Por derradeiro, temos o chamado sistema da ficta confessio ( apesar de sua denominação não ter sentido técnico, pretendendo apenas designar a ficção de incontrovérsia sobre os fatos e, por isso mesmo, sua aceitação pelo réu) posto que no caso de ausência do réu, reputam-se como verdadeiros os fatos alegados pelo autor, que fica dispensado do ônus de prová-los ( presunção relativa de caráter punitivo remonta ao antigo direito germânico e à contumácia in respondendo do Direito Canônico).

O referido sistema é o adotado na Alemanha, Áustria, Inglaterra, Estados Unidos, Portugal e após 1973 indiscutivelmente pelo Brasil.

Os efeitos da revelia nos países da common law, nos quais, normalmente tanto a falta de comparecimento que chama de default of appearance como também a ausência de defesa apropriada chamada de default of defense conduzem à admissão dos fatos alegados pelo autor e ainad à prolação da sentença contumacial.

A doutrina alemã sobre os efeitos da contumácia é tida como paradigma moderno do sistema da ficta confessio que fora perfilada pelo nosso CPC de 1973 principalmente no que concerne ao seu art. 319 .

No direito alemão, a contumácia é revelada pela ausência de participação de uma ou ambas as partes no processo, decorrente do não comparecimento e da não atuação em audiência para debate oral obrigatório da causa.

Rosenberg adverte expressamente que dá causa à contumácia tanto a ausência como a não-atuação da parte em qualquer audiência designada para debate oral obrigatório, não apenas na primeira.

É de se notar possível influência do antigo direito alemão , no qual em razão do ônus da prova ser atribuído ao réu, o simples comparecimento do réu sem atuação, impossibilitava o prosseguimento do processo, e implicava na admissão dos fatos alegados pelo autor, abriando-se imediatamente a via executiva para a satisfação de sua pretensão.

É claro que a contumácia do autor acarreta a imediata extinção do processo sem julgamento do mérito(sem resolução do mérito), mas é fenômeno raro. Sendo mais usual e significativa a contumácia  do réu.

O rigor com que é tratada a contumácia pelo direito alemão deve-se a acentuada oralidade do processo civil germânico e, a imperiosa necessidade de reiterar verbalmente as alegações escritas, sob pena de não serem conhecidas pelo juiz. Preconizam Lent e Goldschmidt que somente o que for realizado de forma oral pode servir de fundamento à sentença.

Além do não-comparecimento da parte, exige-se para plena caracterização da contumácia também pela não atuação do litigante no processo. Se o réu foi regularmente intimado e não comparecer e nem atuar na primeira audiência obrigatória para debate da causa, aplica-se o procedimento contumacial.

Se a ausencia ou falta de autação do litigante ocorrer em audiência posterior, pode o autor optar seguir o procedimento contumacial ou  pelo julgamento conforme o estado dos autos.

No procedimento contumacial, requerendo o demandante o juiz declara a contumácia do réu através da sentença contumacial, quando então os fatos alegados pelo autor são tidos como verdadeiros conforme  expõe o ZPO § 331.

Portanto, no direito germânico a contumácia não está associada apenas ao descumprimento do ônus de responder, mas tamvém ao ônus de impugnar, ou seja, manifestar-se sobre os fatos articulados pelo adversário, contrapondo-os expressamente e especificamente sob pena de confesso e sempre que houver divergência.

Lent ainda destaca que esses fatos tidos como verdadeiros devem ser postos na base da sentença ( presume-se haver confissão plena, conforme § 331), não deve então o julgador examinar  sua corespondência com à realidade dos fatos e nem mesmo determinar que sobre estes seja realizada  instrução probatória.

Mas é equívocado pensar que a sentença contumacial deverá ser obrigatoriamente de procedência, pois para isso é indispensável que estejam todos os pressupostos processuais atendidos e a demanda deve ser concludente, com as alegações de fato justificando cabalmente o pedido, à luz do direito.

Caso contrário, a sentença de improcedência, julgando o mérito favoravelmente ao demandado, ou ainda meramente terminativa, se ausente algum pressuposto processual.

É curial sublinhar que o réu contumaz deve ser pessoalmente intimado da sentença e, pode num prazo que varia em geram de uma a duas semanas a contar dessa intimação, interpor recurso de oposição ( einsprush – ZPO § 338), pelo simples fato de sido proferida o provimento contumacial contra ele, sem precisar jsutificar motivos de sua ausência.

Mas, é vedado ao réu revel, vale-se dos comuns recursos para impugnar a sentença contumacial. Interposta a oposição, que deve ser dirigida ao mesmo julgador que prolatou a sentença contumacial, são examinados como únicos pressupostos de admissibilidade os reguisitos de forma e de tempo. Se admitia, retornar-se ao estado anterior a sentença contumacial ( § 342 do ZPO) que fica sem qualquer efeito, e o feito prossegue como se não houvesse sido proferida.

Se a contumácia ocorreu por falta de comaprecimento à primeira audiência, reabre-se desde o início o contraditório. Se o réu já havia participado do processo, todos os atos praticados podem ser refeitos, inclusive sentido permitida a instrução probatória.

Mas é bom relembrar que caso o réu volte a se ausentar do processo, não poderá valer-se novamente de nova oposição.

É peculiar o equilíbrio do sistema alemão ao disciplinar a contumácia, embora atribua severos efeitos extremamente graves, mas permite-se a adoção do procedimento ccontumacial com imediata prolação de sentença, por meio de simples interposição do recurso de oposição, que nem precisa ser justificada, a sentença fica privada de qualquer efeito, reabrindo-se normalmente o contraditório, e permitindo-se a instrução probatória e desconsiderando-se totalmente a contumácia.

Por causa da facilidade de sobrestamento da eficácia da sentença contumacial, o autor, ao se deparar com a contumácia do demandado, desde que não tenha decorrido da ausência da primeira audiência ( ou seja, que seja a contumácia posterior) poderá optar pelo julgamento conforme o estado dos autos.

Assim o processo é julgado com base nas alegações e provas existentes, não se reputando verdadeiros as alegações do autor, permanecendo tal litigante com o ônus de prová-los. Em compensação, o réu não poderá se valer do recurso de oposição para impugnar asentença, restando-lhe apenas as vias ordinárias de recursos que exigem motivação.

Esclarece Lent com objetivo de justificar o sistema da ficta confessio que antigamente optava-se pelo comparecimento forçado do réu ( havia o dever de responder). Mas recentemente, concebe-se a defesa mais propriamente como um ônus, ao invés de um dever e de se exigir coercitivamente.

Optou o ordenamento jurídico germânico por colocar o faltoso e desidioso em situação de desvantagem, em face do descumprimento do ônus. Lent aduz que existiriam então duas alternativas: ou se presumiria a contestação ( sendo necessário que o autor provasse os fatos alegados) ou, ao invés, se presumiria que os fatos foram admitidos com verdadeiros pelo réu representando a solução tradicional do direito franco-prussiano que representa o sistema a que denominamos de ficta confessio e que representa a opção feita pelo ZPO.

Sem dúvida essa é a melhor opção pois não é justo impor ao autor  provar todos os potnos narrados, quando esses poderia remanescer pacialmente incontroversos, se oa dversário participasse da causa, e a experiência consagra que na maioria das vezes o réu ausente não tem argumentos defensivos válidos.

Interessantes críticas de Edoardo Ricci ( tradutor italiano da obra de Lent) são feitas contra o sistema alemão ao disciplinar os efeitos da contumácia do réu. Primeiramente por ser admitido o recursos imotivado de oposição, o sistema alemão não se consagra como eficaz. E, sem segundo lugar, a ficção da confissão  com o condão vinculante do juiz merece as mesmas críticas dirigidas à confissão geral.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 23/02/2010
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