"O conhecimento é o mais potente dos afetos: somente ele é capaz de induzir o ser humano a modificar sua realidade." Friedrich Nietzsche (1844?1900).
 

Professora Gisele Leite

Diálogos jurídicos & poéticos

Textos

Digressões filosóficas
A filosofia é a busca da sabedoria, é pensar, repensar e, enfim, é refletir. Como a ciência busca a causa última das coisas usando somente a razão, é graças à filosofia que as ideias dominam o mundo.

São disciplinas da filosofia: a metafísica, a epistemologia, a deontologia e a ontologia. A metafísica procura responder exatamente: O que posso saber?

A etimologia da palavra já indica que a disciplina é o que está além da física. Metafísica do grego antigo que significa depois de, além da natureza ou física. É uma das fundamentais disciplinas da filosofa.

Os sistemas metafísicos, em sua forma clássica, tratam de centrais problemas tais como as tentativas de descrever os fundamentos, as condições, as leis, a estrutura básica, as causas ou princípios primeiros, bem como o sentido e a finalidade da realidade como um todo ou dos seres em geral.

A metafísica clássica se ocupa das questões últimas da filosofia, tais como há um sentido último para a existência do mundo? Seriam possíveis outros mundos? Existe um Deus? E, se existe, como poderemos conhecê-los?

Existe o espírito? Qual a diferença fundamental entre mente e matéria, entre corpo e alma? Seriam as almas imortais? Somos mesmo dotados de livre-arbítrio? Tudo está em permanente mudança, ou há coisas e relações que, a despeito de todas as mudanças aparentes, permanecem exatamente idênticas e imutáveis?

Cada geração elabora sua leitura e fornece resposta sobre os problemas de Deus, do universo, do homem, da vida e da história. No Ocidente, até antes de Cristo seguiu uma longa caminhada natural a metafísica até o século XXI.
Momentos de crise aparecem como na obra “Morte de Deus”, Nietzshe e no Fim da Metafísica, de Comte, no século XIX; no positivismo lógico do Círculo de Viena , nos conflitos entre a ciência e fé da modernidade; simplificação banal de Engels, dividindo a filosofia em materialismo e idealismo.

O principal ponto de partida da filosofia ética é a distinção entre o bem e o mal. Por ter inteligência e livre-arbítrio, o homem pode optar entre praticar o bem ou mal. Sempre fazer o bem e sempre evitar o mal. E, sempre ressarcir o mal cometido.

Inspirado na obra de Nietzshe “Para além do bem e do mal”, o filósofo francês Gilles Deleuze tentou distinguir Ética e Moral.

Moral, segundo Nietzshe, seria todo discurso normativo e imperativo que resulta da oposição bem versus mal, considerados como valores absolutos ou transcendentais, reunindo em si nossos deveres.

A Moral responde, pois, ao velho brado de Kant: “Que devo fazer?”, tende, pois, à virtude, como disposição de querer fazer o bem. E, culmina na santidade (identificada com inteira conformidade com a lei moral).
Por outro lado, a filosofia política tenta responder: como devo viver? Embora reconheçamos que política e ética sejam extremamente ligadas. Platão diferenciava uma da outra do seguinte modo: a justiça que deve reger nossa vida deve também reger a polis, ou seja, a vida pública.

O Bem é finalidade tanto da Ética como também da Política; a Ética visa o indivíduo; e a Política: visa o bem comum. Evidentemente que os princípios da Ética não podem deixar de estarem presentes na Política.

Para Aristóteles que pregava a supremacia da Política (que fundamenta a Ética) bem como o Direito. Só assim a sociedade terá condições de trabalhar pelo bem comum, finalidade por excelência da Política.

A filosofia da arte procura responder: o que é belo? Platão contempla a arte como imitação imperfeita de alguma coisa, muitas vezes de forma enganosa. A imitação da natureza ou das paixões humanas não atende senão aos prazeres superficiais ou suspeitos.

Mas a arte não se restringe ser a minesis, uma imitação, posto que sobrepujar esta e criar alguma coisa original (poiesis). O prazer de criar revela então a verdadeira face do belo.

O belo possui várias definições: é a emanação do bem (Platão, Plotino); é um símbolo (Kant); um sinal de Deus (Santo Agostinho e Simone Weil); harmonia (Leibniz, Diderot); prazer do corpo (Epicuro); “prazer dos sentidos” (David Hume); prazer da alma (Montesquieu); manifestação sensível da verdade (Boileau); a unidade da ideia e a aparência individual (Hegel); a vontade de poder (Nietzshe); a colocação da verdade do ente (Heidegger).
O homem, esse mistério. Tanto a metafísica como a ética, a filosofia da religião como a estética deságuam num único estuário: o homem.

Sófocles, um notável dramaturgo grego, já afirmava vigorosamente: “Há muitas coisas maravilhosas neste mundo, mas a mais maravilhosa de todas é o homem”.

É de fato o ser vivo mais interessante entre trinta milhões de espécies de seres vivos conhecidos. A unicidade do homem se traduz pois ninguém é igual a outro homem, como nenhuma folha de uma árvore é igual a outra.

A unicidade do homem é indivisível e bem expressa na palavra indivíduo (in + dividire). Tal ser único é dotado de espiritualidade, diferentemente de qualquer ser, o homem é dotado de alma imortal.
Além de ser próprio de sua natureza, a afetividade. É no amor e no afeto que o homem se descobre e se faz homem.

Em tom profético já advertira Aristóteles: “Um homem só ou é um louco ou é um deus”. Segundo Ricouer, no amor, através do poder ilimitado que superamos a nós mesmos, que atraímos energia que a felicidade não apenas invade nossa alma, mas também a vida de quem amamos e, retribui nosso amor.

Santo Agostinho reconheceu o inestimável valor da pessoa humana e, corroborou Blaise Pascal ao afirmar: “O homem supera sempre a si mesmo” (não estando nunca satisfeito com os fins já alcançados).

A consciência da não realização do homem é a dimensão do infinito escondido dentro de nós. Cumpre ainda distinguir a sabedoria teorética (sapientia).
E, nesse sentido concordamos com os gregos que informavam que não existe prática sem teoria. Enfim, pensar é filosofar. Agir e viver é sabedoria. Nunca, porém contra a própria consciência, ou a razão. A felicidade é um fim. Mas a verdade é o único caminho que nos leva à felicidade.

As premissas filosóficas da justiça possuem sentidos variados, ora como atributo de Deus, como expressão infalível da perfeição divina e de sua atuação em relação aos homens.

Ora como virtude ética tão prestigiada por Platão, indicativa de plenitude da bondade moral (justiça universal). É consistente no hábito da vontade do homem que o inclina a dar a cada um, o que é seu direito.

A justiça pode variar conforme a perspectiva de cada ciência. Em Filosofia do Direito há vários significados: as relações da justiça com o Direito; a distinção entre moral e ordem jurídica; o valor jurídico; a articulação de outros valores do Direito, como a segurança; o tema do justo natural (no jusnaturalismo); o critério de legitimidade jurídica; a questão das leis injustas; a problemática fundamental da determinação do justo.

Em Filosofia Política surge os seguintes debates: conexões entre a Justiça, a sociedade política e o bem comum; concepções do Estado de Direito e do chamado Estado de Justiça; Justiça como legitimação política na vida da democracia; questões básicas de relacionamentos entre as concepções politicas e as teorias da justiça.

Platão
Sua maior obra foi “A República”. Visão de justiça como virtude universal, a mais importante de todas justiças, dotada de dimensões psicológicas, éticas, políticas e jurídicas. A justiça exprime a sujeição das distintas partes da alma (concupiscível, sensível e racional) e das várias classes sociais e da pólis (produtores, guerreiros e guardiães) ao bem comum.

Aristóteles
Sua maior obra: “Ética a Nicômaco”. A teoria da justiça é tratada como virtude particular ou universal. Como virtude de natureza exclusivamente social, como repartição de bens entre os homens, tendo como objeto a atribuição a cada um do que é seu (o seu direito = to dikaion) segundo critério de igualdade.

O Direito Romano extraído do Código de Justiniano (na tradição aristotélica). A definição mais conhecida de justiça foi retirada do Digesto, de Ulpiano constante e perpétua vontade de dar a cada um o seu direito. Há também a visão de justiça como jurisprudência (ratio iuris) e como conhecimento das coisas divinas e humanas, a ciência do justo e injusto.

Santo Tomás de Aquino estabeleceu um tratado sistemático de justiça como virtude cardeal de índole social. A definição do Aquinate é clássica: “Hábito segundo o qual, com constante e perseverante vontade, se dá cada qual o seu direito”.

A justiça é superior à fortaleza e à temperança, pois se situa na parte mais nobre da alma, a espiritual; enquanto a fortaleza e a temperança residem no apetite sensível: além o bem do outro  (bonum alterius); ordena-se ao bem da razão de modo direto, ao passo que a temperança e a fortaleza visam apenas a preservar este bem mediante a moderação das paixões.

A justiça e a ordem jurídica

Existe uma relação imprescindível entre a ordem jurídica e a justiça. O direito é uma relação analógica com a justiça; Primeiro, com o direito objetivo, a lei; segundo com o direito subjetivo, como sujeito; terceiro, com o direito como norma, o direito normativo; quarto, com o direito como forma de saber, o direito epistemológico.

Há um direito natural, que faz parte do ser humano, e ao qual não tem como renunciar. A justiça faz parte do direito natural.

Complementarmente, há uma lei positiva estabelecida em código. Não é possível a lei positivo impor qualquer lei que infrinja a justiça. Mesmo se esta vier do tirano ou da ideologia, não precisaremos observá-la. É o que se chama de desobediência civil.

A jurisprudência tem a função que na prática determina o que é justo. A prudência dos juristas é a base da justiça. A equidade desempenha papel preponderante na ordem jurídica, pois dá ao juiz o equilíbrio necessário de saber aplicar devidamente a lei; as normas gerais e abstratas que são colocadas a serviço daquele caso específico, conforme suas circunstâncias. Cada caso é um caso!

Assim, o justo natural constitui critério fundamental de legitimidade jurídica e política. Desta forma, é o Estado de Direito constitui o verdadeiro o Estado de Justiça e a verdadeira democracia.

Ao revés, o Estado totalitário é onde impera apenas a vontade do tirano ou a hegemonia do partido, não tem como manter o Estado de Justiça, menos ainda a democracia.

E constatamos isso tanto no nazismo como no comunismo vigem os paradigmas da ditadura.

A ordem jurídica é tragada pela tirania, tornando-se o braço do chefe do partido. Sendo a sentença qual profecia anunciada, sendo lavrada antes mesmo que a audiência.

Atualmente, temos visto a obra “A Theory of Justice” (1971) de John Rawls  tentando salvaguardar o homem do moleque que sacrifica em favor da ditadura. Defendeu a inviolabilidade fundada na justiça de todo ser humano. E a prioridade do justo em relação ao bem.
Rawls estabeleceu dois princípios básicos:
a) cada pessoa tem igual direito a um sistema plenamente adequado de liberdade e de direitos fundamentais, iguais para todos, e compatível com um mesmo sistema para todos;

b) as desigualdades sociais e econômicas devem cumprir duas condições para serem admitidas: ligaram-se as funções abertas a todos em condições de justa igualdade e de oportunidade; e servirem para maior benefício dos menos favorecidos (princípio de diferença).

A sociedade “bem ordenada” segundo Rawls nos obriga a repensar em novos termos a justificação da Ética e a legitimação do Direito e da Política, provocando renovada atenção à problemática da “razão prática” já anunciada por Kant no século XVIII.

Podemos extrair da vasta produção acadêmica alguns aspectos relevantes de sua teoria de justiça: a teoria de justiça de Rawls visa pois:

a) atingir um equilíbrio refletido, não imposto pela força;
b) uma síntese real e eficaz das convicções sobre a justiça, de modo a estabelecer uma sociedade bem ordenada. Aquela que se identifica com a democracia contemporânea na qual o povo pode eleger, e ao mesmo tempo controlar o que fazem seus representantes.

Caso não sejam dignos, destituí-los de suas funções. Fichas-sujas não merecem participar da representatividade política.

A Filosofia do Direito do século XX, por Jürgen Habermas

Não silencia sobre os crimes horrendos do nazismo públicos, após o julgamento de Nuremberg em 1946. Devido ao seu interesse por politica e sociologia se aproximou da Escola de Frankfurt (que realizou estudos críticos sobre Hegel, Marx, Weber e Freud) e seus pioneiros eram Horkheimer, Adorno, Benjamin Marcuse e Fromm todos judeus.

A Escola fora fechada por Hitler. Emigrou para os Estados Unidos, só retornando à Alemanha em 1950. Habermas protesta contra o silêncio de Heidegger em relação aos crimes de Hitler.

É autoridade em discussão crítica sobre Kant, Hegel, Marx, Heidegger, Freud, Dilthey, Humboldt, Pierce, Chomsky, Austin, Searle, Wittengenstein.

Ao longo de sua vida acadêmica manteve polêmica com Rawls, Derrida, Foucault, Behabib e, principalmente Popper, Apel, Luotaard e Rorty.

Prática comunicativa marcada por absoluta liberdade de expressão pressupondo tempo infinito e agente competente. É uma situação idealizada de fala.

Habermas é considerado o principal herdeiro das discussões da Escola de Frankfurt, uma das principais correntes do marxismo cultural. E, procurou superar o pessimismo dos fundadores da Escola. Profundamente marcado pelo desastre da Segunda Guerra Mundial, Adorno e Horkheimer consideravam que houvesse um vínculo primordial entre conhecimento racional e dominação, o que teria determinado a falência dos ideais modernos de emancipação social.

Habermas defendeu uma ética universalista, deontológica, formalista e cognitivista. Para ele, os princípios éticos não devem ter conteúdo, mas garantir a participação dos interessados nas decisões públicas através de discussões (discursos) em que se avaliam os conteúdos normativos demandados naturalmente pelo mundo da vida.

Sua teoria discursiva é aplicável à filosofia jurídica, e pode ser considerada em prol da integração social e, como consequência da democracia e da cidadania. Defende que a melhor solução resulta do consenso de todos os concernidos.

No discurso ocorre o desempenho, a justificação de uma pretensão de validade problematizada. Sua finalidade consenso.

O mundo vivido ou da vida constituído por um saber pré-predicativo e pré-categorial, sendo uma certeza imediata, não falseável.

Razão comunicativa situa-se entre o discurso e o mundo vivido. É um discurso limitado, circunscrito pelas certezas do mundo vivido. Visa ao entendimento.

Comunicação distorcida.
É aquela cujos fundamentos que a determinam são externos à linguagem, como o poder e o dinheiro. São verdadeiras patologias segundo Habermas. Pode haver distorções causadas por fatores internos à comunicação, como as que ocorrem na retórica.
GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 08/02/2016
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.


Comentários



Site do Escritor criado por Recanto das Letras
 
iDcionário Aulete